A mão pesada da polícia que investiu contra os professores no Centro Cívico, dia 29 de abril, causou não apenas duas centenas de feridos. A relação de danos ultrapassa qualquer limite. Atingiu a integridade física de manifestantes desarmados e também instituições que deveriam merecer admiração e respeito de toda a sociedade. Atingiu principalmente o estado democrático de direito.

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Infelizmente, as cenas dantescas que mereceram destaque e repúdio em 70 idiomas da imprensa mundial já estavam escritas nas estrelas. Voltemos, por exemplo, a 18 de janeiro, quando esta coluna reproduziu o pensamento de oficiais superiores reunidos dias antes na Associação de Defesa dos Policiais Militares do Paraná (Amai).

Naquele encontro, experientes e sensatos profissionais da corporação manifestavam preocupação com os primeiros sinais de que a PM seria contaminada por uma orientação incompatível com a doutrina e as normas mais modernas e civilizadas de segurança pública, pondo em risco a cidadania, o respeito e a integridade da própria tropa (lembre-se de que 20 policiais saíram também feridos e 17 foram detidos por se recusarem a participar da barbárie).

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Da reunião se concluiu que a responsabilidade pelos desvios seria do então recém-empossado secretário da Segurança, Fernando Francischini, cuja história de truculência já era de há muito conhecida, tanto durante sua curta passagem como soldado da PM nos anos 90 quanto já como agente da Polícia Federal, no Espírito Santo, no início da década passada. Sobram documentos oficiais que desabonam sua carreira.

“O governador Beto Richa ainda vai se arrepender de ter nomeado Francischini”, advertiam os oficiais da PM. Esclareça-se: o governador não ficou sabendo desta opinião apenas pelo jornal, mas foi pessoalmente alertado para o perigo de a escolha do temível assessor manchar seu governo.

As únicas reações conhecidas de Francischini para se contrapor à opinião dos setores lúcidos da PM foram, num primeiro momento, difundir ofensas ao jornalista e, logo em seguida, enquadrar o presidente da Amai, coronel Elizeo Furquim, numa kafkiana sindicância da Corregedoria.

Desconhecendo todas as evidências e as mais abalizadas opiniões, teimosamente Richa mantém a crença de que tudo não passou de uma obra de arruaceiros e que, portanto, a ação policial foi um ato “natural” de legítima defesa naquele 29 de abril – data que já se inscreveu como vergonhosa na história do Paraná. Não dá sinais de que precisa se desculpar pelos excessos e de demonstrar arrependimento pela escolha do secretário. Demiti-lo seria o gesto mínimo que se esperaria de um político preocupado em deixar pelo menos o nariz fora do lodaçal. Supõe-se que deva ter suas razões para mantê-lo no cargo – assim como mantém o comandante-geral da PM, coronel Kogut, que também considerou “proporcional” e “normal” a ação da tropa.

As perdas e danos são mais abundantes do que o sangue, as lágrimas, As balas de borracha, as bombas e as mordidas de pitbulls que deixaram o Centro Cívico marcado para sempre. A primeira das perdas devasta o resquício de respeito de que ainda gozava o governador, levando com ele o já ralo conceito do deputado Ademar Traiano – condutor medíocre e insensível da sessão que, a despeito da tragédia que se dava lá fora – e que àquela altura parecia ser ainda maior – aprovou as mudanças na Paranaprevidência.

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Protestos surgiram de todos os setores. Da OAB à Igreja, do Ministério Público à Anistia Internacional, de comissões de direitos humanos a associações de imprensa e inúmeras outras organizações nacionais e internacionais. Sobre esta onda de protestos surfaram estudantes, sindicatos e até mesmo os oportunistas de plantão, da oposição e da situação. Surfaram sobretudo os partidecos da esquerda radical que literalmente usaram os professores para cometer sandices e provocar policiais que, ainda que a contragosto, cumpriam ordens.

Surfar não foi exatamente o caso dos senadores Roberto Requião (PMDB), Gleisi Hoffmann (PT) e Alvaro Dias (tão tucano quanto Richa) que, cumprindo o papel de representantes do estado, condenaram a violência. Mas não há dúvida de que se beneficiaram politicamente da cena.

Quem também quebrou o silêncio foi o ex-senador Osmar Dias, ao lembrar que na campanha eleitoral de 2010 em que foi vencido por Beto dizia que o adversário não estava preparado para o cargo. O prefeito Gustavo Fruet, que transformou o prédio da prefeitura em hospital de guerra para atender feridos, foi outro beneficiário. Aplaudido pelo gesto, assiste agora ao esfarelamento político dos mais fortes adversários que teria em 2016.

Se os objetivos do governador eram estes, conseguiu.