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Nada como uma temporada em Buenos Aires, ainda que de apenas poucos dias, para aliviar as tensões que a prefeitura lhe causa. Ele, o prefeito Rafael Greca (PMN), deu a viagem à esposa Margarita em comemoração a mais um aniversário. E deixou para trás:

• uma conflagração de contornos bélicos na secretaria municipal de Saúde;

• um “plano de ajuste fiscal” em votação acelerada na Câmara de Vereadores;

• a insatisfação generalizada do funcionalismo;

• uma cidade sofrida pelas inundações que atingiram várias ruas e bairros devido às chuvas torrenciais da semana.

Quem manda na Saúde?

A mais urgente das questões a merecer resposta e decisão rápida de Greca situava-se na saúde pública. Fruto de um acordo político entre ele e o ex-prefeito Luciano Ducci (PSB), o comando da secretaria foi dividido em duas partes – o título oficial ficou com o médico João Carlos Baracho, amigo e aliado de Greca de longa data; já a parte executiva interna foi dada à enfermeira Marcia Huçulak, cota-parte de Ducci, que ocupa o posto de superintendente da secretaria.

Não tinha como dar certo. Os conflitos intestinos, decorrentes de visões diferentes quanto à gestão e também pela ansiedade de Huçulak em atender ao mando político de seu padrinho Ducci, levaram o secretário Baracho a sofrer ameaçadoras crises de hipertensão. Diante do próprio quadro de saúde, preferiu se licenciar do cargo – mas informações de pessoas próximas, não confirmadas pelo próprio Baracho, dão conta de que ele não estaria disposto a reassumir. E até já teria encaminhado ao prefeito uma carta de exoneração.

Compreende-se a angústia de Baracho: conceituado gestor de saúde pública e com reconhecida liderança nos meios médicos (é presidente licenciado da Associação Médica do Paraná), ele tinha assumido o compromisso de tornar concreta a promessa eleitoral de Greca de restaurar a qualidade dos serviços de saúde da capital no prazo de 180 dias.

Esse prazo termina no dia 30 deste mês e o que se viu no período foi a permanência – ou até mesmo o agravamento – dos problemas que vinham da gestão anterior. Remédios continuaram faltando nos postos de saúde; reclamações da população se multiplicaram; a prometida abundância de verbas estaduais não aconteceu; filas de especialidades continuaram...

Uma lição sobre como fraudar licitação

A delação premiada prestada pelo advogado Sacha Reck é uma peça importante para que a população entenda como funcionam as licitações para obras ou serviços públicos. Atuando como assessor jurídico do Sindicato das Empresas do Transporte Coletivo de Curitiba e Região Metropolitana (Setransp), Sacha teve participação no processo de concorrência para a concessão dos serviços de transporte público da capital, entre os anos de 2009 e 2010.

Tudo começou com investigações do Gaeco de Guarapuava, no âmbito da Operação Riquixá, em que foram detectados os primeiros indícios de favorecimento ao grupo Gulin para exploração do transporte coletivo local. Foi nessa ocasião que, após ficar preso por seis dias, Sacha Reck decidiu colaborar com a apuração. E estendeu o assunto também para Curitiba.

Ele revelou, por exemplo, que gestores da Urbs submeteram a primeira minuta do edital de licitação ao Setransp e este pôde, então, “sugerir” mudanças para a versão final. É certo que nem todas foram acatadas, graças à resistência de uma procuradora municipal que atuava na Urbs.

Mas não faltou boa vontade de outros gestores, segundo relata Sacha Reck. Até mesmo nas horas finais que antecederam a publicação do edital, ele e o empresário Donato Gulin mantiveram encontro nos fundos da Rodoferroviária com alto dirigente da Urbs para introduzir mais uma alteração em cláusula de interesse das empresas de ônibus.

Mais relevante do que isso é a parte da delação em que o advogado relata como as empresas de Curitiba obtiveram o reconhecimento de que a prefeitura lhes devia cerca de R$ 250 milhões – soma que se acumulava desde quando o então prefeito Beto Richa (PSDB) promoveu unilateralmente uma redução no preço da passagem.

Havia impasses quanto a isso – que só foram resolvidos (em benefício das empresas) numa reunião em apartamento privado de que participaram um deputado, um assessor “longa manus” de Richa, um procurador depois alçado ao cargo de conselheiro do Tribunal de Contas e um advogado posteriormente nomeado desembargador do Tribunal de Justiça, além, claro, do próprio Sacha Reck e de empresários do sistema.

O Gaeco ainda está na fase de aprofundamento das investigações. Mas algo já está muito claro – houve conluio de interesses públicos e privados num negócio que movimenta R$ 1 bilhão por ano ao longo de, como prevê o contrato, 15 anos prorrogáveis por mais 10.

Dotti: afastar Temer agora não faz bem para o país

O jurista René Dotti ganhou as páginas dos jornais nacionais esta semana quando fez um surpreendente e firme pronunciamento contra o açodamento tanto do procurador-geral Rodrigo Janot quanto do ministro do STF Luiz Edson Fachin. Ambos atropelaram normas elementares do processo penal para enredar o presidente Michel Temer (PMDB) na trama revelada pela JBS e seus delatores super-premiados.

A mesma tese defendida por Dotti foi abraçada pelo novo ministro da Justiça, Torquato Jardim. Dotti, contudo, faz questão de afirmar que não procura “fazer a defesa do presidente, mas a defesa do interesse nacional”, que, segundo ele, “será profundamente afetado se o afastamento gerar a interrupção dos projetos de reforma e a assunção de um gestor absolutamente imaturo se a escolha recair na pessoa do presidente da Câmara”.

Não custa lembrar que o professor René Dotti foi um dos que mais batalharam em favor da indicação de Fachin para o STF – mas nem por isso ele deixa de anotar sua estranheza com o fato, por exemplo, de o investigado (no caso Michel Temer) ser o primeiro convocado a prestar depoimento, obrigando-o a responder a 82 perguntas em prazo exíguo.

À Folha de S. Paulo, Dotti disse “não ser possível abrir inquérito sem ter comprovação do corpo de delito. Não se investiga homicídio sem um cadáver. No caso, o corpo de delito é a gravação, sobre a qual há dúvidas”. E reafirmou que entende ter o ministro Fachin cometido excesso ao abrir inquérito contra o presidente da República sem antes levar o caso ao plenário do STF.

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