Campanha é campanha, governo é governo. Esta verdade com a qual os eleitores estão acostumados há muito tempo se confirmou ontem durante a prestação de contas que o secretário da Fazenda, Luiz Carlos Hauly, fez na Assembleia Legislativa a respeito da situação financeira que o novo governo encontrou ao tomar posse em janeiro passado. Indagado por parlamentares sobre as promessas ouvidas durante a campanha de Beto Richa de que os salários de professores seriam reajustados Hauly foi claro: nas condições atuais, não há maneira de o governo dar conta desse recado.
Segundo ele, a participação da folha salarial no orçamento já atingiu o limite máximo permitido pela Lei de Responsabilida Fiscal (LRF) e não há como aumentar a despesa nesse quesito e que o candidato (supõem os eleitores mais ingênuos) desconhecia essa realidade durante a campanha. Agora, porém, já tem uma certeza: aumentos salariais para o funcionalismo só mesmo após providências que resultem em aumento da arrecadação coisa que certamente não vai acontecer em curtíssimo prazo. No máximo, tentará cumprir o que já é lei, caso do novo regime de subsídios concedido às polícias Militar e Civil.
Este, contudo, foi apenas um dos pontos sombrios que o secretário Hauly abordou em seu depoimento uma espécie de inventário sobre a "herança maldita" que a nova administração estadual encontrou e que mantém o Paraná no atraso. Porque uma coisa leva a outra: se não há recursos para aumentos salariais, não há também para investir em obras estratégicas para o desenvolvimento do estado.
O Paraná está depauperado: a dívida interna e externa chegou em 2010 a exorbitantes R$ 18 bilhões (em 1994, era de R$ 1,26 bilhão) e vai continuar subindo, pagando-se por ela 17% de juros ao ano em 2010 este encargo representou R$ 1,3 bilhão. Por isso mesmo que o Paraná pague pontualmente seus compromissos, ainda assim a dívida só tende a crescer. Não bastasse isso, comparativamente ao crescimento do PIB e ao desempenho de outros estados, a arrecadação estadual vem caindo ano a ano.
Por esta razão sobra muito pouco para investimentos. Entre os anos 2000 e 2010, a capacidade de investir em obras públicas caiu à metade, situando-se agora em cerca de 5% do orçamento. Hauly lembrou que o Paraná gozou de situação muito melhor na década de 80, quando 20% de seus recursos podiam ser investidos em infraestrutura.
"Paraná maravilha" só com receita (muito) melhor
Resgatar a "herança maldita" só mesmo melhorando a arrecadação, o que não será fácil. Por exemplo: seria necessária uma emenda à Constituição Federal para mudar a tributação sobre energia elétrica. Ao contrário de qualquer produto de consumo, o ICMS que incide sobre a energia é recolhida em favor dos estados consumidores e não dos estados geradores, como é o caso do Paraná, maior produtor nacional de eletricidade.
A Constituição ficou assim graças a uma emenda de autoria do então constituinte José Serra ironicamente do mesmo partido de Beto Richa e Hauly, o PSDB. Só isso causa um prejuízo anual ao Paraná da ordem de R$ 1 bilhão. Outra sangria é decorrente da desoneração do ICMS na exportação de produtos primários. Ora, o Paraná é o maior produtor e exportador de commodities agrícolas do país, mas o imposto que deixa de recolher não é compensado pelos repasses da União.
Logicamente, mudanças dessa natureza implicam na aprovação da reforma tributária coisa pregada há tanto tempo mas que nunca sai do terreno das discussões teóricas. Exatamente porque os interesses de um estado conflitam com o de outros estados. Por exemplo: São Paulo, coincidentemente governado também pelo PSDB, maior consumidor nacional da eletricidade que move suas indústrias, estaria disposto a abrir mão do ICMS que recolhe?
Enfim, senhores leitores, o "Paraná maravilha" decantado durante a campanha pelos candidatos parece ter ficado mais longe de se tornar realidade a partir da explanação do secretário da Fazenda. Culpa desse governo? Não, culpa da legislação perversa que prejudica de modo particular o Paraná, culpa dos governos anteriores que concederam aumentos ao funcionalismo acima do que podiam pagar, e culpa também do governo federal.
A solução? Ainda não há. "Economizar no custeio? Estamos fazendo. Aumentar a receita do estado? Estamos iniciando um processo, mas sabemos das dificuldades", disse Hauly. Como corolário dessas afirmações, veio a divisão de responsabilidades e a convocação à colaboração dos deputados: "Nós temos um desafio conjunto. Eu não assumo a responsabilidade de equacionar sozinho."
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