A toga não esconde a existência de divergências internas no Tribunal de Justiça do Paraná. Caso emblemático ocorreu há 43 anos, com a ajuda decisiva da ditadura militar, quando colegas desembargadores apearam Alceste Ribas de Macedo da presidência do TJ e da magistratura – ato revertido anos depois pela Lei da Anistia.
Se alguém pensa que se vive lá, entre seus 120 desembargadores, um clima de absoluta paz e tranquilidade, está enganado. Os subterrâneos do TJ contam outras histórias de desavenças, mas poucas vêm a público. A grande maioria nem sequer ganha contornos jurídico-burocráticos – pois também existe e costuma prevalecer uma força maior de contenção, o corporativismo. Em nome deste corporativismo autoprotecionista, a regra é calar, fechar os olhos e tapar os ouvidos.
Não é o que está acontecendo na 2.ª Câmara Criminal do Tribunal presentemente. Não é uma câmara qualquer – é aquela a que estão afetos julgamentos de crimes contra a administração pública. Para se ter ideia de sua importância: é pela 2.ª Câmara que neste momento estão tramitando casos tão polêmicos quanto o das operações Quadro Negro, Publicano, Barreado e Panaceia – sem falar no caso dos Diários Secretos.
Já se vê por aí que é uma Câmara que mexe – diria o vulgo – com “cachorro grande”. É de se imaginar, portanto, que os cinco desembargadores e juízes substitutos que a compõem, sofram pesadas pressões dos poderosos envolvidos (direta ou indiretamente) nas ações em julgamento. E este fato deve ser a razão do clima beligerante que a cada dia se agrava entre seus membros.
Dentre os desembargadores da 2.ª Câmara há um que, no bom e velho sentido republicano, tem dado “trabalho” para os demais. Costuma votar as matérias com inusitado rigor e divergir dos votos alheios quando, segundo sua percepção, se afastam do bom Direito ou da Justiça. Trata-se do desembargador José Maurício Pinto de Almeida, que nas últimas semanas:
• Formalizou denúncia contra colegas por prática de nepotismo cruzado – um nomeando parente do outro com a devida reciprocidade. Documentado, levou a denúncia ao presidente do TJ, Paulo Vasconcelos, e comunicou os fatos ao Ministério Público e ao CNJ. Vasconcelos mandou investigar.
• Descobriu que um juiz-convocado da Câmara deu duas decisões contraditórias em relação à concessão de habeas corpus que pedia a suspensão da ação penal contra réus envolvidos na Operação Publicano – aquela que investigou a fraude de R$ 1 bilhão contra os cofres públicos no âmbito da Receita Estadual de Londrina. A primeira decisão foi no sentido de não conceder o habeas corpus; estranhamente, poucos dias depois, acatou a liminar. Auditores fiscais teriam agido em proveito próprio e, supostamente, para abastecer a campanha de reeleição do governador Beto Richa.
• Votou contra o habeas corpus que trancou a ação contra um grupo de advogados acusados de cometer irregularidades, em conluio com serventuários de um cartório de Antonina, em processos de indenização para milhares de pescadores vítimas da poluição causada pelo vazamento de um oleoduto da Petrobras que os impediu de trabalhar por meses.
Tudo isso – e muito mais – tem gerado sério desconforto no interior da 2.ª Câmara, ao qual se somam constrangimentos que atingem também grandes escritórios de advocacia, políticos e agregados de toda espécie.
E por falar em agregados, na última quinta-feira, em voto relatado pelo desembargador José Maurício, o ex-diretor-geral da Assembleia Legislativa, Abib Miguel (o Bibinho) teve indeferido o habeas corpus que pretendia tirá-lo da preventiva que cumpre num quartel da PM. Nem mesmo foi-lhe concedida prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica. Para relembrar: Bibinho é um dos principais personagens dos “Diários Secretos”, série de reportagens desta Gazeta que revelou, em 2010, o desvio de R$ 200 milhões na Assembleia ao tempo em que o deputado Nelson Justus era o presidente. Justus espera julgamento pelo Órgão Especial do TJ enquanto o tempo passa e os crimes dos quais é acusado prescrevem.
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