Políticos em apuros costumam lançar mão de um comportamento que os manuais básicos de psicologia definem como “vitimismo”. Eles sempre se dizem vítimas de adversários ocultos e/ou genéricos. A síndrome do vitimismo é atemporal e pluripartidária. Às vezes, trata-se de uma atitude intuitiva; em outras, de uma recomendação do marqueteiro de plantão.
Antológico é o exemplo de Jânio Quadros, que, em 1961, renunciou à Presidência vítima de “forças ocultas”. Outro caso emblemático é paranaense e bem mais recente: o governador Beto Richa se considerou a “mais ferida” das vítimas do confronto do Centro Cívico de 29 de abril do ano passado.
Lula, claro, não foge à regra. Repete à exaustão que todos “eles” são inimigos, aí incluídos principalmente a “zelite” e a imprensa – todos inconformados com o fato de um filho de “mãe que nasceu analfabeta”, retirante nordestino acossado pela fome e operário metalúrgico ter chegado à Presidência.
Nos últimos dias, a Operação Lava Jato jogou gasolina à fogueira em que Lula ansiava parecer um cordeiro em imolação. O genérico “eles” passou a receber nomes de Sergio Moro, Ministério Público e Polícia Federal. Fez-se vítima deles por ter sido levado coercitivamente a uma dependência policial para, como cidadão comum que agora é, prestar depoimento em inquéritos que o colocam como suspeito de ilicitudes.
Ainda nesta segunda-feira (7), em carta dirigida aos investigadores da Lava Jato, Lula exagerou no vitimismo: “A mesquinhez dessa ‘denúncia’ [sobre o triplex] é o final inglório da maior campanha de perseguição que já se fez a um líder político nesse país”.
Erro estratégico?
“Eles”, isto é, o juiz & companhia, talvez tenham cometido não um atentado à lei, mas um erro estratégico que deu a Lula um bom motivo para hastear de novo a bandeira vitimista. O discurso reativo que fez após seu depoimento no aeroporto de Congonhas (SP) na última sexta (4) foi típico dos que, apesar das bravatas e dos desafios, buscam a comiseração que o povo dedica aos que considera vítimas de injustiças.
O sofrimento, real ou imaginário, faz emergir o instinto animal que o medo provoca. Foi esta lógica que inspirou a frase mais marcante de seu discurso: “Se quiseram matar a jararaca não bateram na cabeça, acertaram o rabo. E a jararaca tá viva como sempre esteve”.
A jararaca reage com a ameaça de se candidatar de novo à Presidência, em 2018. O que demonstra que, apesar das vicissitudes, ainda mantém a chama que o fez líder da resistência à ditadura e, carismático, permitiu-lhe atrair admiradores para fundar o PT, partido que prometia ética na política.
De Getúlio a Lula
Por inúmeras vezes Lula se comparou a Getúlio Vargas, tanto como pai dos pobres como pela importância histórica. Mas é bom lembrar que o presidente que criou a Petrobras em 1953, preferiu o suicídio a sair do Catete preso pelos militares que comandavam a República do Galeão (olha aí, de novo, um aeroporto metido na encrenca!). Seu gesto trágico tinha muito a ver com a vergonha de ver que alguns reles jagunços que cuidavam de sua segurança pessoal davam-se, entre outras coisas, a cometer pequenos achaques, infinitamente menores do que os do “petrolão”.
Com certeza, Lula não chegará ao extremo do auto-martírio. Muito vivo, se finge de morto, esconde as vergonhas e se faz de vítima.
Em agosto de 1954, o povo foi às ruas chorar o suicídio de Getúlio, promoveu quebra-quebras e converteu o velho presidente em venerável mártir. Em março de 2016, Lula e o PT, ao açular o povo para também ir às ruas redimir suas desventuras, namoram com o perigo. É o que se vai conferir dia 13.
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