O novo secretário-chefe da Casa Civil, deputado Valdir Rossoni, faz parte do cada vez mais raro grupo dos políticos sinceros: ele diz o que pensa e não se incomoda com o que pensam sobre o que ele pensa ou faz. Nesta segunda-feira (21), ao tomar posse no cargo em substituição a Eduardo Sciarra, deu mais uma demonstração deste seu atributo de temperamento.
BIBINHO livre na “República de Curitiba”
No discurso perante o governador e convidados à solenidade no Palácio Iguaçu, Rossoni revelou que, em recente encontro com cerca de meia centena de deputados federais, em Brasília, disse que no Paraná só existiam dois casos de corrupção – os investigados pelas operações Publicano (sobre desvios na Receita Estadual) e Quadro Negro (que surrupiou verbas da secretaria e do ministério da Educação). Os parlamentares que o ouviam ficaram espantados, pois, segundo Rossoni, alguns informaram que em seus estados havia 20, 30 casos de corrupção.
Numa tradução livre do que disse o ex-presidente da Assembleia Legislativa, o Paraná, comparativamente a outros estados, é “meio virgem” em matéria de corrupção. São “só” dois casos conhecidos, ambos investigados não só pelo Gaeco, mas também pelo próprio governo estadual. A sinceridade de Rossoni deve ter ofendido, por exemplo, o atual presidente da Assembleia, Ademar Traiano, presente à solenidade, um dos indiciados no inquérito do Gaeco sobre a Operação Quadro Negro, enviado pelo Gaeco à tutela da Procuradoria Geral da República (PGR).
É possível que o governador também tenha ficado chateado com o discurso do seu novo chefe da Casa Civil, pois na Operação Publicano estão envolvidos alguns de seus mais diletos amigos, dentre os quais o co-piloto Marcio Lima e o primo distante Luiz Abi. Segundo o principal delator que prestou depoimentos ao Ministério Público e a Justiça, fiscais da Receita eram orientados a direcionar parte das propinas que recebiam para financiar a campanha de reeleição de Richa ao governo, em 2014.
Em razão do seu temperamento severo, Rossoni fez inimigos pelo rigor moral que imprimiu durante seus quatro anos como presidente da Assembleia Legislativa. Se agir da mesma maneira agora como chefe da Casa Civil, não é improvável que outros casos se somem à Publicano e à Quadro Negro.
República 1
A “República de Curitiba”, chefiada pelo juiz federal Sergio Moro, às vezes estende seus domínios para o âmbito estadual e instala gabinete no prédio do Tribunal de Justiça. Dia destes, por exemplo, descobriu-se que o ex-diretor-geral da Assembleia Legislativa, Abib Miguel (o Bibinho), deixava a sala especial da Polícia Militar onde era mantido preso para sair por aí sem prévia autorização judicial. Bastava o conhecimento do comandante da guarnição. Quando soube da esdrúxula liberalidade, o juiz estadual da República de Curitiba mandou transferir o réu para um complexo penal – decisão depois revogada pelo STJ.
República 2
A República instalada na 4ª Câmara Criminal do TJ também descobriu outra coisa interessante relacionada a Bibinho: como está com seus bens indisponíveis, incluindo o representado por uma fazenda em Goiás, arrendada para terceiro, o ex-diretor da Assembleia mandava que o arrendatário depositasse os valores relativos ao arrendamento na conta pessoal do seu advogado, Eurolino Reis. Veio a dúvida se os valores ficavam com o advogado a título de honorários ou se eram repassados ao “cliente”, o que, neste caso, poderia configurar “lavagem de dinheiro” e/ou atuação imprópria do advogado.
República 3
Inconformado, Eurolino recorreu à OAB, que impetrou habeas corpus para livrá-lo da condição de réu no processo-crime proposto pelo Ministério Público, tentando provar, no tribunal, que o dinheiro se referia mesmo a honorários. Compete a três desembargadores da Câmara julgar o habeas. Um deles (o relator) já votou contrário à concessão; o segundo pediu vistas, sintoma de que poderá votar a favor, dadas as relações de amizade com um dos sócios de Eurolino e também envolvido na mesma denúncia; ao terceiro, caberá o desempate.
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