A violência do dia 29 de abril no Centro Cívico confundiu de vez a cabeça daqueles que só enxergam a política brasileira na base da simplificação do PT x PSDB. Deve ter psicólogo ganhando dinheiro com gente que não se conforma com os que gritaram “Fora Beto Richa” na final do Paranaense e, dois dias depois, bateram panela durante a propaganda partidária petista na televisão. Afinal, é logicamente errado reprovar os dois ao mesmo tempo?
Claro que não. Política passa longe do dogma religioso. Quem não questiona sua fé nos partidos e nos políticos (principalmente os militantes mais fervorosos) vira refém da manipulação.
Além disso, é sempre possível aferir concretamente as decisões políticas. Esqueça o esforço de construção de imagem das legendas e veja como elas agem na prática. Despidos da marquetagem, Dilma e Richa parecem filiados à mesma sigla. Veja os porquês:
1) Caros amigos
Além do PT, a chapa que elegeu Dilma tinha mais oito partidos. Quatro deles (PSD, PP, PR e Pros) compunham a megacoligação de 17 legendas de Richa. Todas essas siglas agora ocupam cargos em ambas as gestões. O PSD controla a Casa Civil no Paraná e o Ministério das Cidades em Brasília. O casal formado pela vice-governadora Cida Borghetti (Pros) e pelo deputado federal Ricardo Barros (PP) é o que melhor expõe essa salada partidária. Ela acaba de ser nomeada chefe do Escritório de Representação do Paraná em Brasília, ele é vice-líder do governo federal na Câmara.
2) O melhor está por vir
Esse era o slogan de campanha de Richa, mas cairia como uma luva na campanha de Dilma. Castigada por pibinhos sucessivos ao longo do primeiro mandato, ela dizia ter priorizado a estabilidade dos índices de emprego para voltar a fazer o país crescer a partir de 2015. Eis que o desemprego aumentou e o cenário é de estagflação (economia estagnada, inflação alta). Richa garantia ter colocado as contas do Paraná em dia. A cada fim de mês do novo mandato, porém, virou rotina a agonia de não saber se há dinheiro para honrar a folha do funcionalismo.
3) Meu tarifaço, minha vida
Dilma e Richa fizeram apostas idênticas para superar a herança que receberam deles mesmos. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o secretário estadual da Fazenda, Mauro Ricardo Costa, seguem a mesma cartilha de arrocho para tentar colocar as contas em ordem. Dilma jogou todas as fichas para aprovar seu pacote fiscal no Congresso – a vaca começou a tossir na semana passada com a aprovação de mudanças no seguro-desemprego. Richa aumentou ICMS, IPVA e soltou os cachorros (literalmente) para ter acesso aos recursos da Paranaprevidência.
4) Síndrome de Voldemort
Voldemort é o vilão dos filmes de Harry Potter, tratado como “Aquele cujo nome não pode ser pronunciado”. O nome batizou a operação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) que prendeu o primo de Richa, Luiz Abi Antoun, por suposto envolvimento em licitações fraudadas do governo do estado. Dilma está no olho do furacão da Operação Lava Jato, que a cada dia traz à tona um Voldemort novo, seja empreiteiro ou tesoureiro do PT.
5) A culpa é das estrelas
Ao final de tudo, Dilma e Richa escolhem a mesma rota de fuga para escapar dos seus problemas – os quais, é claro, só podem ter sido provocados por fatores externos. A presidente diz que o país vai mal porque é vítima da crise financeira internacional, embora o auge da confusão externa tenha sido há seis anos. Richa põe a culpa na perseguição do governo federal e na influência do PT nos sindicatos de servidores, apesar de o Paraná ter sido campeão no aumento de receita corrente líquida (evolução de 56%), entre dezembro de 2010 e abril de 2014. Se um dos dois comandasse o planeta Terra, certamente ouviríamos que o Estado Islâmico é culpa do Sistema Solar.
Esquerda tenta mudar regra eleitoral para impedir maioria conservadora no Senado após 2026
Falas de ministros do STF revelam pouco caso com princípios democráticos
Sob pressão do mercado e enfraquecido no governo, Haddad atravessa seu pior momento
Síria: o que esperar depois da queda da ditadura de Assad
Deixe sua opinião