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Algo de sobrenatural, no sentido metafísico do excesso, está acontecendo quando um ministro de Estado toma posse acusando a presidente da República (responsável por sua nomeação) de ter cometido uma injustiça ao demitir um antecessor, colega de partido, por suspeita de corrupção no ministério dos Transportes.

As denúncias que levaram a presidente Dilma Rousseff a demitir Alfredo Nascimento ainda no primeiro ano de governo resultaram em dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal e o ato da demissão rendeu prestígio e popularidade à governante anteontem apontada pelo novo titular da pasta, César Borges, como autora da iniquidade.

"Hoje se corrige uma injustiça cometida a Vossa Excelência, que foi denunciado, mas nada, nada, nada foi provado", disse Borges referindo-se a Nascimento, muito aplaudido pela plateia.

Entre os que ovacionavam estavam o deputado Paulo Maluf, caçado pela Interpol, o deputado Natan Donadon, prestes a ser preso por ter sido condenado pelo STF por corrupção, e o presidente do Senado, Renan Calheiros, denunciado ao Supremo por uso de documentos falsos e desvio de dinheiro público.

Tom Jobim dizia que nosso país não é para amadores. A frase literal: "O Brasil não é para principiantes". Tivesse vivido mais uns 20 anos (morreu em 1994), provavelmente chegaria à conclusão de que o panorama nacional foge também à compreensão dos profissionais.

A presidente, cujos assessores são sempre tão ciosos em lustrar-lhe a imagem de pessoa irascível, achou ruim? Caso tenha achado, fez que não notou que o Palácio do Planalto servia de palco para ato de desagravo de um dos varridos na dita "faxina ética".

Sorriu e atribuiu ao empossado a tarefa de consolidar a presença do PR – até então tratado feito lixo no governo – a fim, naturalmente, de "segurar" o partido na aliança até a eleição de 2014. Afinal, o que é a coerência (não, não, falar em decência soaria grosseiro) diante dos 70 segundos a que tem direito a legenda no horário eleitoral?

Em verdade, o que se passou naquela cerimônia foi um jogo de aparências. O PR fingindo que estava satisfeito, a presidente fazendo de conta que preservava autoridade ao impor nome de sua preferência, mas o que fica é o seguinte: o ministério não é garantia de nada e Dilma tropeçou na austeridade.

A conta só não soma zero porque o país continua a arcar com o prejuízo do modelo pervertido de loteamento da máquina pública mediante critério puramente eleitoral.

Legado

Além de ministros "faxinados" de partidos depois reincorporados ao governo, além da ilusão "vendida" ao governador Sérgio Cabral de que a divisão dos royalties do petróleo seria resolvida no Palácio do Planalto, e os problemas daí decorrentes na aprovação da nova lei pelo Congresso, o ex-presidente Lula deixou várias heranças nada benditas para a sucessora Dilma Rousseff.

A construtora Odebrecht, por exemplo, arcou com os custos do estádio do Corinthians, o Itaquerão, confiante na promessa de Lula de que o BNDES entraria com R$ 400 milhões. Como a construção de campos de futebol está fora do alcance legal da instituição, o problema se transferiu para o Banco do Brasil, o agente financeiro, que há meses negocia com a Odebrecht as garantias, ora não aceitas pela empresa, ora não aceitas pelo BB

E com isso, a pendenga se estende na proporção direta em que se reduzem as chances de o estádio ficar pronto para a abertura da Copa do Mundo como previsto no anúncio retumbante do então presidente.

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