É bonito o entusiasmo. Mais bonito ainda quando reúne multidões em prol de uma causa. Portanto, não se trata de desqualificar os anseios de quem saiu às ruas do centro do Rio na marcha em defesa de uma divisão dos royalties do petróleo menos injusta para o estado que aquela proposta no projeto em tramitação na Câmara.
Ocorre que as coisas precisam ter consequência. Se não, corre-se o risco de enveredar pelo terreno da mistificação. Cabe a quem mobiliza uma massa de gente em torno de uma bandeira fornecer todas as informações sobre as regras do jogo em que estão sendo jogadas, a fim de conferir maturidade à relação entre governante e governados.
O ato patrocinado pelo governador Sérgio Cabral Filho não atendeu a esse pré-requisito. Ainda que a maior parte dos presentes soubesse exatamente do que se tratava hipótese improvável , a maioria não sabia que o esforço seria em vão no tocante ao objetivo pretendido: sensibilizar a Câmara a não aprovar a proposta ou a presidente Dilma Rousseff a vetar a lei.
A festa pode ter sido boa para Cabral capitalizar politicamente uma luta perdida, mas não mudará as posições no Congresso nem levará a presidente a arrumar briga com parlamentares e governadores de 24 estados não-produtores de petróleo que pretendem ter acesso às receitas geradas pela extração de petróleo.
O assunto é mais complicado do que o desenho simplesinho mostrado pelo governador à população, instada por ele a "cobrar" de Dilma o veto em retribuição aos votos dados a ela por cariocas e fluminenses.
Cabral imprime caráter passional à questão, mal posta e pior ainda conduzida desde que o governo propôs a modificação do sistema de distribuição dos royalties. Houve demagogia, houve excesso de confiança na força do então presidente Lula, houve falta de capacidade (e de vontade, por que não dizer?) das partes de construir um acordo condizente com a realidade da Federação.
Agora, com passeata ou sem passeata o Rio, vai arcar com o prejuízo. Evidentemente o governador sabe disso, mas faz um gesto político com o intuito de reduzir seu desgaste junto ao eleitorado, cujo conhecimento da missa não chega à metade.
O arrebatamento é bonito. Mas perde o brilho se posto a serviço de objetivo não explícito e cai no vazio quando é causa sem efeito.
DNA
O PT fechou a questão e definiu o nome de Fernando Haddad como candidato à prefeitura de São Paulo. Eliminou as prévias e avisou aos navegantes do partido que a regra deve ser seguida nas principais capitais do país.
Como sempre, e ainda mais depois que chegou à Presidência da República, o PT não brinca quando o assunto é política e eleição. Não se acomoda, trabalha para consolidar sua hegemonia de maneira a melhorar as condições de enfrentamento na eleição presidencial.
Goste-se ou não dos métodos, sejam eles criticados por contrariarem os preceitos originais do partido, mas reconheça-se: o PT está no mundo a serviço. Note-se, porém, o que fazem os tucanos na principal cidade do país. O PSDB tem quatro pré-candidatos à prefeitura de São Paulo, uma prévia marcada para janeiro, já com previsão de adiamento para fevereiro, intenção de deixar para março e a esperança de que, no fim, se dispense a consulta ao partido.
Por esse roteiro, o PT já estará em campanha de fato há cinco meses quando o PSDB resolver, afinal, quem será o candidato em seu maior reduto.
Qualquer tempo
Corre uma interpretação sobre o julgamento da Lei da Ficha Limpa no Supremo Tribunal Federal, sobre a possibilidade de o adiamento da decisão para o ano que vem invalidar sua aplicação na eleição municipal.
Não por isso. Aprovada em maio 2010, a lei não pôde ser adotada para a eleição de outubro porque o STF entendeu que seria ferido o princípio segundo o qual toda regra referente a processo eleitoral deve ser aprovada um ano antes do pleito.
Agora, o tópico relativo à anualidade já está atendido. Se a lei for considerada constitucional será aplicada independentemente de prazos.
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