Marta Suplicy escolheu a mais letal das armas para dar combate ao PT na hora da saída: a verdade. Não é um artefato com o qual o partido esteja acostumado a lidar.
Tudo o que ela disse a Eliane Cantanhêde na entrevista publicada domingo no jornal O Estado de S. Paulo é a fiel expressão dos fatos. Com os quais boa parte dos petistas concorda publicamente e a quase totalidade deles assente em particular.
No fim do ano, o ex-presidente Luiz Inácio da Silva, em encontro do partido, deu recado idêntico ao de Marta. Não disse com tanta crueza "ou o PT muda ou acaba", mas afirmou aos companheiros que o PT precisava rever seus métodos e modos se quisesse sobreviver.
Sobre os desmandos a que se referiu a senadora dão notícias os inúmeros escândalos, as sentenças de prisão dos mensaleiros, o esquema de corrupção da Petrobras. A respeito de outros detalhes de bastidores relatados na entrevista, os personagens citados sabem que não podem rebater. Não pela intenção de subtrair "holofotes" a Marta, mas por carência de versão verossímil para pôr no lugar.
Lula realmente não desautorizou a movimentação de bastidores nem sondagens sobre a possibilidade de se candidatar no lugar da presidente Dilma Rousseff em 2014.
O presidente do PT, Rui Falcão, a quem Lula pediu que Marta procurasse, fez corpo mole diante do tema. Mais adiante agiu contra, pegando o ex-presidente de surpresa num Congresso do partido pedindo à plateia que levantasse os crachás vermelhos para confirmar a candidatura de Dilma. Fez isso porque no governo dela se sentiu prestigiado. Foi recebido e consultado como nunca havia sido por ele, que de Falcão não precisava para fazer política.
Os empresários convidados para o jantar na casa da então ministra da Cultura, no início de 2014, com o intuito de levar Lula a ouvi-los sobre o que pensavam do governo, testemunharam as críticas do ex-presidente à administração da sucessora.
A referência à arrogância do chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e ao fato de se movimentar como pretendente a preferido da presidente Dilma para disputar sua sucessão em 2018 não é suposição, é constatação compartilhada por 11 entre 10 frequentadores do roteiro do poder.
A senadora tem tudo bem catalogado na mente. Incluindo os detalhes do vaivém da demissão do ministério. O pedido foi feito várias vezes e sempre recusado. Na penúltima, a presidente não a recebeu, mas falou ao telefone no Palácio da Alvorada e a chamou de "paranoica". Na última, em conversa no Palácio do Planalto, a ainda ministra tentou entregar a carta, Dilma não recebeu, mas quando Marta anunciou de forma barulhenta a demissão, a presidente afirmou que havia recebido o documento dois dias antes. Não era verdade.
Não é difícil que a senadora disponha de mais que registros de memória daquilo que relata ora como desmandos do partido, ora como os "sapos" que foi obrigada a engolir, ora como "humilhações inadmissíveis".
Em novembro, logo depois de deixar o governo, Marta Suplicy listava três opções para seu destino político: disputar a legenda do PT para se candidatar à prefeitura; sair do partido; esperar no Senado a melhor oportunidade para uma candidatura em 2018.
De lá para cá o quadro mudou. Concorrer no PT não faz sentido. Esperar 2018 não combina com o temperamento de Marta e sair do partido implica risco. Embora improvável, há no horizonte o perigo da perda do mandato por infidelidade partidária.
A lei prevê exceções: mudança para entrar em novo partido, no caso de mudança substancial de programa na antiga legenda e quando o parlamentar sofre grave discriminação pessoal na agremiação em que milita.
Novo partido não tem tempo de televisão para 2016; o PT mudou de métodos, mas o programa continua o mesmo. Já a terceira hipótese veste suas mãos como uma luva de pelica.
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