Em uma das sessões de julgamento das três ações apresentadas neste ano pela oposição à Justiça contra o presidente Luiz Inácio da Silva por campanha eleitoral antecipada, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Carlos Ayres Britto, não poderia ter sido mais explícito.
Ao se dirigir aos advogados dos reclamantes, informou que o TSE dispõe de equipamento de vídeo ao qual poderiam recorrer para exibir imagens para ilustrar, e assim sustentar de forma mais consistente, suas ações. Inútil. Como aquela, as outras duas reclamações foram rejeitadas.
Por absoluta inconsistência de provas. Dias atrás, logo após o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, sinalizar o desconforto do Judiciário ante os comícios travestidos de ações governamentais, Ayres Britto voltou a dar o recado. Disse que o TSE estava aberto a reclamações e que o fato de outras ações terem sido rejeitadas não significava "predisposição à leniência".
"Evidencia, sim, inconsistência no preparo das peças de representação." Mais não disse, e não diz, a despeito de solicitações para que detalhe e amplie o raciocínio. "Seria acusado de leviano se fizesse alguma acusação sem provas", encerra.
Ayres Britto, na realidade, na ocasião disse em som audível a voz corrente nos bastidores do tribunal, onde reina a desconfiança de que os partidos de oposição apresentem ações malfeitas de propósito. Para, de um lado, encenar reação. E, de outro, não avançar o suficiente para que se crie uma jurisprudência que amanhã ou depois venha a se voltar contra eles. Porque é como se diz no Judiciário: o representante de hoje pode ser o representado de amanhã.
E em que se baseia tal suspeita? Primeiro, na espantosa precariedade das ações diante do farto material existente para ser incluído nas representações. Quando o presidente do TSE falou em plena sessão do tribunal sobre filmes, estava se referindo a algo que a Justiça aceita como prova.
Os recortes de matérias de jornais, o único material apresentado naquele tipo de ação, serve de indício, mas as imagens, as entrevistas, os depoimentos, os discursos, seriam perfeitamente aceitos como provas. Não necessariamente de campanha eleitoral antecipada, mas de crime de responsabilidade com viés eleitoral por violação ao princípio constitucional da impessoalidade exigida ao administrador público.
Sobre a já famosa reunião de prefeitos patrocinada pelo governo federal em fevereiro último, a oposição poderia ter apresentado muito mais que recortes de jornais. Como não o fez, o tribunal rejeitou a representação por unanimidade.
A Justiça não pode agir por iniciativa própria nem julgar com base em pistas frouxas. A suspeita de que os partidos fazem uma espécie de jogo de cena, mas no fundo se protegem uns aos outros a fim de que não venham a ser alvos do adversário, se baseia também em outras duas evidências.
Na falta de reclamações sobre o uso do caixa 2, porque haveria o interesse comum de não se firmar jurisprudência para punições, e na displicência com que os partidos encaram a perda de parlamentares para outras agremiações.
De fato, a quantidade de reclamações por devolução de mandatos não é proporcional ao volume do troca-troca, quase o mesmo do passado, quando o Supremo ainda não havia determinado que, pela Constituição, os mandatos pertencem aos partidos e não aos eleitos.
Nisso, uma ponta fica solta: o Ministério Público. Se há, como se diz no Judiciário, ilegalidades que não estão sendo enfrentadas por uma disfarçada rede de autoproteção dos partidos, há inação por parte dos procuradores, cuja função é defender a sociedade, entre outras coisas de abusos contra o patrimônio coletivo.
Contrabando
O presidente do Tribunal de Contas da União, Ubiratan Aguiar, diz que o tribunal aceita a mudança proposta na Lei de Diretrizes Orçamentárias que dá prazo de 90 dias para o julgamento de medidas cautelares suspendendo obras por indícios de regularidades. Desde que, bem entendido, o prazo comece a contar a partir do fornecimento de dados solicitados pelo TCU aos órgãos gestores das verbas e das empresas executoras das obras.
A proposta tal como está elaborada fala em 90 dias a partir da expedição da cautelar sem instituir nenhuma obrigatoriedade de prazo para as respostas às dúvidas postas pelo tribunal. "Se ficar assim, basta que ninguém se pronuncie por 91 dias para a medida cautelar cair", argumenta Aguiar. Se a proposta passar, o TCU fica de mãos amarradas, "refém de respostas que nunca são dadas", diz o presidente.
Mais que isso
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