Reza norma geral que, na relação com o Congresso, o Poder Executivo manda nos dois primeiros anos e nos dois últimos pede por obséquio. Presidentes saem fortes das urnas e assim navegam até se aproximar o momento de renovar o contrato com o eleitor quando, então, passam a precisar dos aliados para enfrentar com boa chance de êxito a eleição.
O governo Dilma Rousseff não foge à regra e sofre desvantagem adicional: uma coisa foi governar com o PT na presidência da Câmara, outra bem diferente será (tem sido) enfrentar a segunda metade do mandato com o PMDB no comando das duas Casas do Congresso. Pode ter havido aí um erro de avaliação dos petistas quando fecharam acordo de rodízio com os peemedebistas escolhendo presidir a Câmara no primeiro período e deixando de fora do acerto o Senado, onde continuou valendo o critério de primazia para a maior bancada.
Resultado é que o governo continua tendo o queijo popularidade e caneta , mas é o PMDB quem está na posse da faca, ditando a agenda e o ritmo do Parlamento.
O descontentamento com o governo não é de hoje. Vem desde o primeiro ano do mandato da presidente, mas foi sendo administrado pela direção e pelas lideranças até a eleição das presidências da Câmara e do Senado.
Ao PMDB não interessava elevar a tensão ao ponto de criar qualquer risco à conquista do comando do Congresso, especialmente no ano da graça de 2014.
Note-se como subitamente o parceiro tornou-se ativo: o presidente do Senado fez cumprir a promessa de deixar que percam a validade medidas provisórias enviadas à Casa em cima da hora e o presidente da Câmara pôs a andar projetos que há anos dormiam nas gavetas.
Instalou comissão para examinar proposta de mudanças na tramitação de medidas provisórias, o que obrigará o Planalto a alterar a sistemática de constantemente interditar, na prática, comandar a pauta do Legislativo.
Ao mesmo tempo, anunciou para breve a votação do fim do voto secreto para cassação de parlamentares, cuja consequência mais evidente recairá sobre os deputados condenados no processo do mensalão.
Junto a isso, Henrique Eduardo Alves e Renan Calheiros já na próxima semana vão abrir a discussão sobre o exame de vetos presidenciais para corrigir uma das mais graves omissões do Congresso que, ao não votá-los, deixa o processo legislativo inconcluso.
O ponto mais sensível, contudo, é mesmo o orçamento impositivo para emendas parlamentares. A proposta foi apresentada por Antonio Carlos Magalhães ainda no governo Fernando Henrique Cardoso e torna obrigatória a liberação das verbas destinadas por deputados e senadores ao atendimento das "bases" partidárias e eleitorais.
A emenda ressuscitada pelo PMDB retira do Executivo uma poderosa arma de pressão sobre o Parlamento. Hoje, como tem a prerrogativa de liberar, de segurar e de escolher para quem dar ou deixar de dar o dinheiro, o governo fica dono da situação.
Invertida a mecânica, tal poder simplesmente desaparece. Por que, então, o Congresso não levou o assunto adiante antes? Porque os maiores partidos governistas estavam bem atendidos.
Com Dilma, o PMDB começou a sentir que recebia tratamento de adversário. Suas emendas ficam retidas, enquanto as do PT são liberadas com mais facilidade. Mais: ainda levava a fama de mercador, interesseiro.
Daí a decisão de agir diferente. Tornando-se a liberação obrigatória ela deixa de ser usada como moeda de troca. O governo vai querer? Claro que não. Mas, talvez à exceção do PT, é evidente que todos os partidos haverão de querer. O que não quer dizer que necessariamente vai acontecer. Tudo depende de a presidente substituir a truculência pelas artes da malemolência na recomposição de um convívio em via de decomposição.
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