Como não quer, ou não pode, se penitenciar, resta ao PT dobrar a aposta e tentar de novo se fazer de mártir [no caso do mensalão].
Para ter sucesso na política, é mais importante demonstrar força do que propriamente ter razão. Posto em outras palavras, é esse o raciocínio que parece conduzir o PT na travessia do período mais difícil de sua existência.
Aos ouvidos mais ponderados, a gritaria do partido e companhia soa despropositada e algo amalucada. Tanto quando acusa o Supremo Tribunal Federal de golpista quanto quando convoca partidos aliados para assinar nota em defesa da "honra" e da "dignidade" do ex-presidente Luiz Inácio da Silva, comparando o exame de um processo na Justiça a episódios da História que resultaram na instituição de uma ditadura no Brasil.
Mas o fato de terem perdido a calma e de invocarem o suicídio de Getúlio Vargas e a deposição de João Goulart para se fazer de vítimas não quer dizer que os petistas perderam o juízo. Deliram, mas com método e um objetivo preciso: salvar algum capital político para tocar a vida depois do vendaval do julgamento do mensalão. E para isso, mais importante que enfrentar com racionalidade o fato de que as condenações se avizinham com base na confissão de que o partido deu mesmo dinheiro para outras legendas e o fez mediante expedientes ilegais, é demonstrar capacidade de reação.
Lula não precisa de quem o defenda. É absoluto, popularíssimo, imbatível, o mais habilidoso, intuitivo e espetacular político já surgido na face da terra. Pelo menos assim reza a mítica. Ora, não seriam as assinaturas de presidentes de seis partidos em nota de protesto que lhe serviriam de muro de arrimo. Ainda mais tendo sido um deles (Carlos Lupi, do PDT) demitido do Ministério do Trabalho por suspeita de prevaricação, outro (Eduardo Campos, do PSB) acusado de "traidor" pelos petistas e um terceiro (Renato Rabelo, do PCdoB) pessoa boa, mas de expressão política, digamos, limitada.
Assinaram também os presidentes do PT, Rui Falcão, o do PMDB, Valdir Raupp, e o do PRB, Marcos Pereira. A influência do primeiro na ordem das coisas públicas é nenhuma. O segundo enfrenta contestação interna por ter posto o pé em ambiente onde o partido preferia não ser visto. E o terceiro vai levando do PT o sonho de ganhar a eleição em São Paulo.
Lula é maior que a tropa. Mas é com ela que conta. A outra parte do batalhão está também no banco dos réus, fora de combate e, pelo absoluto desinteresse do PT em defender seus aliados do PP, PTB e PR (antigo PL), está claro que lhes dispensa a companhia. Foram úteis para formar a maioria lá atrás, mas agora o destino dos valdemares, jacintos, pedros e genus pouco importa. Usaram, foram usados e que se virem porque daqui em diante são páginas viradas.
O PT cuida no momento de preparar o terreno para prosseguir. Daí a preocupação de preservar a imagem de Lula e de renovar as parcerias mostrando que não é pólvora molhada, não está isolado e pode, como fez logo depois do escândalo em 2005, dar a virada. Na política, já que na Justiça a batalha está perdida. Na ocasião, foi bem sucedido ao adotar como argumento de defesa a tese de que caixa dois é crime menor, porque "todo mundo faz". Não seria, assim, o pecador, mas uma vítima do sistema pecaminoso.
Como não quer, ou não pode, se penitenciar, resta ao PT dobrar a aposta e tentar de novo se fazer de mártir. Desta vez, das arbitrariedades de uma Justiça inconformada com o sucesso de um partido de massas. Justiça comprometida com o preconceito elitista e movida pelo escuso propósito de desmoralizar um projeto de raiz popular.
Pode dar certo? Depende de a sociedade compreender, ou não, que o Supremo está dizendo ao Brasil que as instituições são maiores e podem mais que qualquer um: homem, mulher, governo ou partido.
Nunca antes
Muito já se viu nesse Brasil, mas presidente da República responder a voto de ministro do Supremo, francamente, é a primeira vez.