A presidente Dilma Rousseff tem sido muito elogiada por seu estilo, na forma e no conteúdo. Faz por merecer no gestual firme, porém contido, no tocante aos apetites fisiológicos (só do PMDB, note-se), nas ações racionais em relação aos gastos públicos, na inflexão democrática no que tange à política externa e principalmente na conduta cotidiana comedida.
Dilma não desfruta abusivamente do poder para destratar críticos nem se exibe desfrutável para cima e para baixo a tagarelar despropósitos ao molde do antecessor. Aos olhos e ouvidos fartos de espetáculos diários de vaudeville presidencial, a presidente assume feição de maravilha curativa.
Mas Dilma, como governante algum, não é um bálsamo. Trata-se apenas de uma pessoa, digamos, normal, que identifica os problemas e se dispõe a atacá-los. Por exemplo, dá à aproximação da volta da inflação acima do razoável sua real dimensão de desastre a ser evitado.
Nada disso, contudo, dá à presidente da República um salvo-conduto para se eximir da responsabilidade que tem sobre o atual cenário resultante da inconsequência do governo Luiz Inácio da Silva em relação à realidade da Nação. Notadamente em relação às irracionalidades cometidas durante o ano eleitoral de 2010.
Entre outros motivos porque decorrentes do afã de Lula em elegê-la como sucessora. De repente, parece que Dilma Rousseff é fruto de outra árvore, que chegou à Presidência depois de uma longa vida de serviços prestados à política e à construção de uma candidatura por esforço próprio.
Até poucos meses atrás ela dizia amém a tudo o que seu mestre mandasse. Estava ao lado dele para, como gerente administrativa do governo, corroborar a justeza de toda e qualquer decisão tomada. Inclusive aquelas que rendem agora um montante de R$ 11,5 bilhões de contas atrasadas, mais de R$ 4 bilhões em relação às pendências de 2009 para 2010.
Louve-se a mudança, mas que não se perca o discernimento. Não se pode imaginar que Dilma, candidata de Lula, o desmentisse a cada bravata nem que brigasse internamente para que o governo não entrasse na rota da gastança.
Tampouco ser aceitas de forma acrítica as providências de contenção tomadas agora, como se na campanha que a elegeu não houvesse sido vendido ao público um horizonte de esplendores num país arrumadíssimo sob todos os aspectos da economia.
Nada ia mal e iria muito melhor, dizia Lula com a anuência de Dilma.
Não cabe, evidentemente, à presidente nem aos governistas imprimir uma boa dose de relatividade aos fatos. Eles estão no papel deles: representam e, onde essa representação significar ganhos coletivos, ótimo.
Mas a sociedade não pode perder de vista o passado a fim de que no futuro não venhamos a dizer que a cigana nos enganou. Nem deixar essa tarefa ao encargo da oposição para depois reclamar que o Brasil não dispõe de oposicionistas à altura.
E que futuro é esse? Está muito próximo: mais exatamente em 2012, quando, então, haverá de novo eleições, poder em disputa e oportunidade para conferir se o país está mesmo ou não sob uma nova, racional, civilizada e legalista direção.
Lição do abismo
Eis o PSDB: o partido decide apoiar a proposta de um salário mínimo de R$ 600, baseado em promessa de campanha, sustentando que há condições objetivas para tal. Certa ou errada, foi uma decisão.
Mas uma ala, liderada pelo senador Aécio Neves, na última hora abraça a tese de R$ 560 no intuito de se "aproximar das centrais sindicais", posando ao lado de um dos maiores detratores da candidatura presidencial tucana, Paulo Pereira da Silva.
Considerando que o governo tem os instrumentos que as centrais gostam e está apenas começando, com no mínimo mais quatro anos pela frente e uma identidade indissociável, o PSDB não consegue uma coisa nem outra: não quebra a aliança com os sindicalistas incrustados e dependentes da máquina e perde a chance de unir o partido numa discussão de repercussão nacional.
É assim, privilegiando disputas internas, que se constroem as grandes derrotas.
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