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O PT já foi um partido vivo, orgânico, movido ao embate das tendências e regido pela vontade da maioria tal como é descrito hoje em algumas análises cuja visão tem evidente referência no espelho retrovisor.

O PT não é mais aquele do tempo em que até as interferências resultavam de processos, alguns traumáticos, mas tinham o componente da participação da militância. Exemplo disso foram as sucessivas candidaturas de Luiz Inácio da Silva à Presidência da República, sempre resultado da expressão majoritária do partido.

Mesmo as mais difíceis. Uma delas, a de 1998, deu especial trabalho à direção. Havia postulantes de peso à prévia (Tarso Genro, Eduardo Suplicy e Cristóvam Buarque) e uma questão complicada a ser resolvida no Rio.

Lula, José Dirceu e companhia articularam uma chapa com o PDT e Leonel Brizola de vice. Para isso, possibilitar a aliança com Anthony Garotinho, então no PDT, na eleição estadual do Rio, foi preciso atropelar a decisão da seção regional que havia escolhido Wladimir Palmeira como candidato ao governo do estado. Houve reação, muito barulho e confusão, além de um resultado desastroso que praticamente dizimou o partido no Rio.

Mas, quem estava na reunião do partido no Hotel Glória onde se decidiu que Lula seria o candidato a presidente e Brizola o vice com a primazia de indicar o titular da chapa estadual, testemunhou uma decisão colegiada. A força da militância era tão incisiva, o apoio a Lula tão evidente que os pretendentes a disputar com ele a indicação já chegaram ao encontro na condição de desistentes.

E por que esse preâmbulo de passeio pelo passado? Para que se note a diferença entre a época em que postulantes desistiam premidos pelas circunstâncias, vencidos pela maioria, e o tempo atual da imposição de uma só vontade, subtraída a instância da consulta ao coletivo.

Não há, no Brasil, partidos vivos, orgânicos nem celebrantes da democracia interna. É verdade. Mas são duas outras verdades também. Mesmo nos outros partidos existe o contraditório interno, essa é uma.

No velho PFL, Antônio Carlos Magalhães imperava, mas fora da Bahia não imperava sozinho. O grupo de Jorge Bornhausen fazia o contraponto. No PSDB, as escaramuças dispensam apresentações e no PMDB nem se fale, embora nada disso possa ser entendido como sinal de vivacidade partidária.

A outra verdade decorre da impossibilidade de comparação: o PT nasceu e se criou propondo-se a atuar de modo diferente das ditas legendas tradicionais. E durante muito tempo foi. Seus encontros eram abertos e o embate de embate de posições internas, livres. Direção sempre houve. Daí a organicidade do partido.

Mas não havia o que hoje vai se consolidando como uma prática despótica e, sobretudo, contraditória em relação à história do partido.O que era exceção virou regra. O que mal ou bem encerrava algum sentido estratégico, hoje não requer nem argumentação. É assim que Lula quer? Assim se faça.

Com requintes de humilhação, ao arrepio do convencimento e das especificidades regionais. No Maranhão, os petistas já foram obrigados a prestar reverência eleitoral ao clã Sarney. Em Minas, a bater continência ao PMDB. Em São Paulo, quase foram tangidos feito gado palanque de Gilberto Kassab acima. A senadora Marta Suplicy não servia aos planos de Lula de reeditar na disputa paulistana o exitoso "dedazo" que levou Dilma Rousseff à Presidência da República, mas serve para ser tratada como "tarefeira" e, em caso de derrota de Fernando Haddad, para como expiatório.

Com João da Costa, prefeito de Recife, foi ainda pior: ganhou uma prévia, cujo resultado foi simplesmente anulado e "nomeado" o senador Humberto Costa como candidato. Se o prefeito de fato perder a legenda, só falta o PT considerá-lo um traidor se não quiser participar da campanha.

Pode ser um modo pragmático de preservar o poder, mas a simpatia reinante em torno da resistência de Marta e João da Costa sinaliza que talvez não seja a melhor maneira de se resguardar a unidade necessária ao sucesso do projeto.

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