Os líderes do governo, do PT e do PMDB na Câmara, deputados Cândido Vaccarezza, Henrique Eduardo Alves e Paulo Teixeira, oficializaram no início da madrugada de ontem sua condição de meninos de recados do Palácio do Planalto.
Ignorando a autonomia dos mandatos, os mandamentos do Congresso e o preceito da respeitabilidade pessoal, os três mudaram de posição em pleno encaminhamento de votação do novo Código Florestal e passaram a defender o descumprimento de acordo assinado horas antes.
Por quê? Porque o governo mandou, diante da possibilidade real de vitória do destaque da oposição que retirava do texto a prerrogativa de o Executivo comandar o setor agrícola por decreto.
Não foi um recuo qualquer. O processo de votação havia sido iniciado com o exame de requerimento do PSol e do PV pedindo a retirada do projeto de pauta.
Todos os líderes partidários, à exceção dos signatários, orientaram suas bancadas a votar "não" porque havia sido feito um acordo no gabinete do presidente da Câmara para que a votação ocorresse naquela noite.
Bastou um telefonema de Antonio Palocci, da Casa Civil, para que com a mesma cara lisa de quem antes defendera o acordo, o líder do governo, Cândido Vaccarezza, voltasse à tribuna para denunciar o acordo. Alegou a existência de pontos obscuros e passou a orientar as bancadas a como as manadas caminhar no rumo oposto e votar "sim" ao adiamento.
Não havia nada de obscuro, apenas o governo percebeu que perderia no voto e resolveu desrespeitar a maioria.
Constrangidos e enredados na falta de argumentos, Henrique Alves e Paulo Teixeira também foram à tribuna contar a mesma mentira a respeito da obscuridade dos termos do acordo, impassíveis diante da exibição do documento que haviam assinado. Manobra tosca.
Diante do que aconteceu no plenário da Câmara dos Deputados em matérias de conduta parlamentar, francamente, a votação do Código Florestal chega a ser o de menos.
A não ser pela revelação do real objetivo do governo: assegurar e ampliar seu poder de mando absoluto sobre vida e obra dos agricultores brasileiros.
É óbvia a vontade da maioria de aprovar o texto resultante do acordo entre lideranças a partir do parecer do relator, Aldo Rebelo. Portanto, mais cedo ou mais tarde essa questão estará resolvida. Da pior ou da melhor maneira.
O que restou daquela sessão, porém, não se revolve facilmente: o fato de que a República no Brasil está capenga. Há o Poder Judiciário na vanguarda, há o poder discricionário do Executivo, mas não há Legislativo.
Uma coisa é a articulação de maioria, outra bem diferente é a imposição da hegemonia de poder ao custo do equilíbrio entre os poderes. Institucionalmente imperfeito e entrando numa área de risco, passa da hora de o Brasil dar a devida atenção a isso.
Chumbo trocado
Com semblante de santa, a ex-senadora Marina Silva postou-se ao fundo do plenário da Câmara para viver uma noite incomum. Acostumada a homenagens, Marina ouviu o deputado Aldo Rebelo acusar seu marido, Fábio Vaz de Lima, de contrabandista de madeira.
Rebelo reagia à acusação que havia recebido pouco antes da ex-senadora via Twitter de ter alterado o texto do acordo depois de sacramentado.
"Fraudador é o marido dela, contrabandista de madeira", bradou o deputado ao microfone do plenário, acrescentando, sem medir as consequências da confissão, que quando era líder do governo evitou pessoalmente a convocação ao Congresso de Vaz de Lima para falar do assunto.
Essas brigas servem para o público ficar sabendo que na política pode haver de tudo, menos vestais e querubins.
O líder do PV, Alfredo Sirkis, chamou Rebelo de "canalha traidor", outro deputado verde pediu que se retratasse, mas como Marina Silva também não retirou a acusação de fraude feita pelo relator, virou uma conta de soma zero.
Marina, por ter tido o marido envolvido em algo que carecia de esclarecimento exatamente na área de militância dela, e Rebelo, por ter interferido em prol do acobertamento.