O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, quer disciplinar os grampos telefônicos, mas uma perfídia da burocracia botou no colo do Judiciário uma estatística intrigante. O estado do Rio de Janeiro tem 81 comarcas e em 2007 seus magistrados autorizaram 7.145 interceptações telefônicas. O juiz Rafael de Oliveira, da comarca de Itaguaí, ficou com 2.147 desses grampos, ou três por dia. À operadora Claro ele pediu 874 interceptações, equivalentes a um terço do total encaminhado à empresa no estado.

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Foi em Itaguaí que Machado de Assis instalou o médico Simão Bacamarte.

Estudando os malucos do lugar, convenceu-se de que a loucura não era "uma ilha perdida no oceano da razão", mas "um continente". O doutor fundou um hospício e nele trancou tanta gente que provocou uma rebelião. Quando pediram-lhe explicações, afirmou: "Não dou razão dos meus atos de alienista a ninguém, salvo aos mestres e a Deus".

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O deputado Marcelo Itagiba, presidente da CPI dos Grampos, convocou o doutor Oliveira para explicar a ciência interceptadora de sua comarca, mas ele argumentou que "não é dado ao juiz manifestar-se sobre processos em que funcione, muito menos naqueles que estejam acobertados pelo sigilo". Sendo assim, o magistrado recorreu ao Pretório Excelso de Brasília e, no último dia 21, lá obteve um habeas corpus desobrigando-se da oitiva.

Em seu recurso ao Supremo Tribunal, o magistrado informou que encaminhara ao corregedor-geral de Justiça do Rio um expediente "esclarecendo pormenorizadamente, sem prejuízo do sigilo, acerca dos procedimentos cautelares deferidos por mim". Ele argumentou que o comparecimento a uma audiência pública colocaria em risco sua segurança, bem como a de seus familiares. O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, doutor Airton Valadares Pires, endossou o cuidado, pois, segundo ele, os atos do juiz expuseram "de forma direta e precisa o quadro preocupante vivenciado pela Comarca de Itaguaí".

(Se todas as interceptações estivessem relacionadas com o quadro de Itaguaí, sua população de 95 mil habitantes vivenciaria um grampo para cada 44 bípedes.)

Entendem-se e respeitam-se todos os amparos que a ciência jurídica e a devida proteção aos servidores da coisa pública dão ao doutor Oliveira. É essa a boa forma de funcionamento do Estado e dos seus súditos, mas ficaria tudo mais simples se a patuléia tivesse acesso a qualquer migalha de explicação racional para a dosagem da medicação eletrônica de Itaguaí.

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De CarlosLacerda@edu para EduardoPaes@gov

Caro prefeito, começo testando-o: qual a marca do meu governo no Rio, que foi de 1960 a 1965? Se você respondeu que é o Aterro do Flamengo, logrei-o. Meu grande trabalho foi a adutora do Guandu, que regularizou o fornecimento de água à cidade. No Aterro eu só botei as plantas. Quem moveu a terra foi o Juscelino. Digo isso para demonstrar o poder das idéias num governo. Quem me convenceu a fazer um parque naquele aterro foi a adorável maluca Lota Macedo Soares. (Lembra dela? É a personagem da peça da Marta Goes.)

Você promete revitalizar a área portuária do Rio. Quem fizer isso recriará a cidade, como eu e o Pereira Passos.

Faça com a zona portuária o que fizeram com Barcelona e Buenos Aires.

Chute a burocracia. Chame os doidos e os mandões (a Lota mandava em mim), convoque arquitetos de todo o mundo para projetar a mudança e papeleiros de todas as praias para equacionar as contas. Mantenha os políticos longe da obra e, pelo amor de Deus, não crie grupos de estudo ou comissões (em todos os sentidos).

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Por amor ao Rio,

Carlos Lacerda

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A conta

Não se sabe o que Bush pretende fazer da vida, mas perderá muito tempo explicando-se. Charlotte Dennett, uma advogada de Vermont, pretende processá-lo pelas mentiras que contou para invadir o Iraque.

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Até aí, nada demais, porque sempre há um alguém batalhando por 15 minutos de fama. O caso agravou-se porque o promotor Vincent Bugliosi associou-se à senhora. Bugliosi vive na Califórnia e ganhou 105 dos

106 casos em que litigou. Pediu 21 penas de morte e ganhou todas. Ele escreveu O processo contra George Bush por assassinato, livro boicotado pela imprensa norte-americana, levado às listas de mais vendidos por emissoras de rádio e pela internet. Antes que ele seja confundido com um aventureiro, vale lembrar que seu trabalho anterior,

Resgatando a História, com 1.612 páginas e outras tantas num CD de notas, é a melhor reconstituição do assassinato do presidente John Kennedy.

A conclusão: o crime foi cometido por Lee Oswald sozinho, e o resto é conversa fiada.

Presente

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Faltam dois dias para se saber o nome do sucessor de George Bush. Quem quiser pode pegar na internet relógios contando os dias, as horas e os segundos para a partida do pior presidente da História americana.

Aviso amigo

Quem trabalha na padaria financeira metendo a mão na massa garante que, apesar do teatro da turma do balcão, até hoje não chegou um só ceitil às cabeceiras da economia real. Os doutores do governo acreditam que o dinheiro anda sozinho.

Presunto de mico

Os sábios da banca que emprestaram mais de US$ 2,4 bilhões à Sadia com a cláusula tóxica da aposta contra o dólar tiveram o cuidado de eleger a cidade de Nova Iorque como foro para eventuais litígios.

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(O empréstimo foi para uma subsidiária da empresa, chamada Wellax Food Logistics, com sede no paraíso fiscal da Ilha da Madeira.) Tudo bem. A Sadia precisou renegociar o empréstimo, e só agora os banqueiros se deram conta de que ela não tem sequer um frango na jurisdição dos juízes de Nova Iorque. Isso não significa que nesses casos os calotes fiquem impunes. Globalização, quando é demais, come o dono.

Eremildo, o idiota

Eremildo é idiota e convenceu-se disso ao tentar vender à PM paulista uma escada capaz de permitir a passagem de um policial pela janela do segundo andar de um prédio. Na operação tabajara que terminou com o assassinato da jovem Eloá Cristina, um dos soldados que entraram no apartamento perdeu cerca de 15 segundos escalando o parapeito, pois a escada era curta. A idéia de Eremildo era oferecer escadas mais compridas aos ilustres coronéis do Batalhão de Choque da PM paulista. Enganou-se. Não faltou equipamento. A escada usada era extensível e de tamanho adequado. Bastava que a tivessem espichado direito. Eremildo entendeu. Afinal, é um idiota.