Só a Polícia Federal poderá dizer de onde vieram e para onde iriam os 361 mil euros (R$ 1,1 milhão) escondidos nas meias, na cueca e na pasta de Enivaldo Quadrado. Logo ele, réu no processo do Mensalão por traficâncias de lavagem do dinheiro destinado a parlamentares de base de apoio de Nosso Guia.
Quadrado é um homem audacioso. Sendo réu de um processo no Supremo Tribunal Federal, julgou-se acima de qualquer suspeita. Apesar disso, deve-se admitir que tinha todo o direito de arriscar a sorte. O ex-ministro da Fazenda, Antônio Palocci, é réu num processo de quebra do sigilo de um cidadão e foi honrado pela base de apoio com a presidência da Comissão Especial da Reforma Tributária. João Paulo Cunha, um dos 40 réus do Mensalão, foi agraciado com a relatoria da Medida Provisória 443, a do pacotinho anticrise. Recebeu também a relatoria do projeto de reforma política. Nunca é demais lembrar que um contubérnio tucano-petista sonha com o fim do voto nominal no candidatos a deputado, estabelecendo um sistema de listas partidárias, organizadas de acordo com a preferência das caciquias. Não se sabe se João Paulo Cunha ainda assina documentos com a caneta Mont Blanc que recebeu do poderoso Marcos Valério, ou se continua pedindo à mulher que cuide de alguns de seus saques bancários.
José Nobre Guimarães, o deputado estadual cearense cujo assessor carregava US$ 100 mil na cueca, foi exonerado de qualquer suspeita pelos seus pares da Assembléia Legislativa. Safou-se com o beneplácito de uma parte da bancada tucana. Os mensaleiros petistas movem-se com a mais absoluta naturalidade.
Pudera, o PSDB manteve na sua presidência por quase um ano o senador Eduardo Azeredo, patrono do mensalão mineiro.
Até bem pouco tempo estava na pauta de votações da Câmara dos Deputados um gracioso projeto de emenda constitucional. Em tese, ele acaba com todos os foros privilegiados, remetendo os processos que ora tramitam no Supremo Tribunal Federal ao juízo de primeira instância, com seus novos prazos e velhos ritos. À primeira vista, uma flor de igualitarismo. À segunda vista, refrigério para os denunciados dos mensalões. Os processos, que podem demorar ainda um par de anos no Supremo, seriam devolvidos para uma tramitação que, no mínimo, consumiria mais uma década.
Os costumes mensaleiros estão vivos e vão bem, obrigado. No fundo, Delúbio Soares foi um operador tosco. Entregue aos experimentados profissionais de todas as campanhas, as coisas voltaram aos trilhos. A máquina petista continua voraz, mas ficou chique, parecida com a tucana. Ela elegeu o comissário Luiz Marinho para a prefeitura de São Bernardo com um ervanário que resultou no gasto global de R$ 47 por voto recebido. Até aí nada demais, mesmo sabendo-se que o companheiro Obama pagou menos da metade disso. Puxando-se mais um fio da meia, a repórter Renata Lo Prete informa que um dos principais doadores para a campanha do comissário foi a empresa Quattor, que tem 40% de seu capital nas mãos da Petrobras. É pouco? O presidente da Petrobras, doutor (baiano) Sérgio Gabrielli estrelou um dos poderosos jantares de arrecadação para o candidato.
Elio Gaspari é jornalista.
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