A diplomacia brasileira tem um problema com objetos de couro. Em janeiro de 2002, o ministro Celso Lafer tirou os sapatos para embarcar num vôo doméstico nos Estados Unidos. Cumpriu uma determinação do governo norte-americano, pela qual os passageiros deveriam pôr seus calçados nas cumbucas de plástico que passam pelos aparelhos de raios X. Hoje, isso só é pedido às pessoas que ativam o detector de metais. Lafer pagou caro.

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Na segunda-feira, retornando de um passeio pelas calçadas de Nova Iorque, o chanceler Celso Amorim, acompanhado por sua mulher, entrou no Hotel Waldorf Astoria pela porta da Avenida Lexington. O repórter Ricardo Balthazar viu a cena e contou: o segurança da casa pediu que a bolsa da senhora passasse pelo raio X. Amorim disse ao cidadão que era ministro das Relações Exteriores do Brasil e, naquela tarde, estivera com o presidente George Bush. Neca. Ou passa a bolsa ou volta. Amorim foi embora, contornou o quarteirão e entrou pela porta da Avenida Park. O segurança do saguão apontou para a maldita bolsa, mas distraiu-se atendendo um outro hóspede e o casal foi em frente.

Suprema vitória da diplomacia-companheira. Enfim, o anti-Celso Lafer.

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Por causa da Assembléia Geral da ONU, estavam no hotel vários chefes de Estado, inclusive o companheiro Bush. Ademais, quem garantia ao segurança que aquele cidadão era chanceler de seja onde for? Mais: o carteiraço de que estivera à tarde com Bush recomendava que fosse redobrada a vigilância sobre o cidadão. Qualquer pedestre da Lexington pode dizer isso, inclusive os malucos.

Admita-se que o companheiro-chanceler não estivesse disposto a transigir. Mudasse de hotel, não de porta. (A mulher do presidente francês François Mitterand foi-se embora do Congresso norte-americano quando lhe pediram que passasse por um detector de metais. É verdade que Danielle Mitterand usa um marca-passo, mas, depois que ela se referiu a essa circunstância, sem ser atendida, não carteirou o guarda, deu meia-volta e foi para casa.)

Faz tempo que o doutor Celso Amorim não passa pela rotina da patuléia que lhe paga o salário. Ninguém voa no Brasil (nem em lugar algum) sem botar a bolsa na esteira dos raios X. Em 2003, quando Nosso Guia foi a Palmares, o detector de metais obrigou a choldra a ficar numa fila de quase um quilômetro, debaixo do sol.

Fala, Azeredo

O tucanato ficou nervoso porque o senador Eduardo Azeredo disse que, em 1998, na mobilização nacional do PSDB para a reeleição de FFHH, "parte dos custos foi bancada" pelas arcas mineiras. Ela "tinha comitês bancados pela minha campanha".

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Conta mais, Azeredo. Assim será possível demonstrar como as arcas de Marcos Valério transbordaram para a reeleição de Nosso Guia, que também não sabia.

Laços fortes

Não há motivo para se duvidar de Lula quando ele defende seu ministro Walfrido dos Mares Guia dizendo: "Para mim, ele merece minha confiança total".

Em maio de 2005, quando Roberto Jefferson denunciou o mensalão, Nosso Guia disse: "Parceiro é solidário com seu parceiro".

À primeira vista, nesse caso faltou solidariedade. Olhando melhor, pode-se suspeitar de que acabou havendo alguma compreensão.

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Natasha no STF

Madame Natasha adora o Supremo Tribunal Federal, porque é o único lugar onde os homens vestem panos parecidos com saias. Ela estava no plenário quando o ministro Gilmar Mendes atirou no seu colega Joaquim Barbosa:

– Vossa Excelência não pode pensar que pode dar lição de moral aqui.

– Eu não quero dar lição de moral.

– Vossa Excelência não tem condições.

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– E Vossa Excelência tem?, fechou Barbosa.

Natasha acredita que, nesse nível, eles podem ser chamar de "você".

(Na corte norte-americana, pelo menos, há mais senso de humor. Em 1953, quando o juiz Felix Frankfurter soube que seu colega Fred Vinson, presidente da Casa e racista de boa cepa, tinha sido fulminado por um ataque cardíaco, comentou: "Essa foi a primeira indicação que eu tive de que Deus existe".

Zumbi vai bem, obrigado, na Unipalmares

Falta pouco para a formatura da primeira turma de Administração da Unipalmares, criada em 2003. São 160 alunos, dos quais 140 negros.

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Em março realizarão seu baile de formatura, com traje a rigor, no Jockey Club de São Paulo. É uma história de sucesso na qual não entrou dinheiro da Viúva, da Igreja ou dos sindicatos.

Desde sua fundação, pela ONG Afrobrás, ela se dispõe a ter 50% de alunos negros. (Contra 1,3% em São Paulo e 2,3% no Brasil.) Todos os seus vestibulares têm cerca de 80% de candidatos negros, com três inscritos para cada vaga. Hoje a Unipalmares tem 2 mil alunos, mais uma faculdade de Direito. (São Paulo tem 368 desembargadores, nenhum negro.) A mensalidade custa R$ 260 e a instituição mantém um inédito programa de emprego. Oito em cada dez alunos estão no mercado de trabalho, a maioria deles nos grandes bancos, que adotam salas de aula, oferecem bolsas, estágios e posições. Fora do mercado financeiro, só a Camisaria Colombo, onde funciona um sistema que dá 20% dos postos de trabalho a afrodescendentes. As aulas de inglês da universidade são dadas pelo curso Alumni.

Para que não se pense que essa experiência é uma iniciativa destinada a passar pó-de-arroz em jovens negros, o completo da escola é Universidade da Cidadania Zumbi dos Palmares.

Saúde americana

Pelo menos um aspecto da campanha eleitoral norte-americana deveria chamar a atenção dos candidatos brasileiros. É a questão dos planos de saúde.

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No Brasil, há cerca de 30 milhões de pessoas que, enquanto têm saúde para trabalhar, dispõem da proteção dos planos das empresas. Quando trocam de serviço ou se aposentam, quase sempre dançam. Nos Estados Unidos, ninguém tem cobertura pública antes dos 65 anos ou da indigência. Até lá, 47 milhões não têm cobertura alguma.

Hillary Clinton e Barack Obama já apresentaram propostas para universalizar a assistência médica. Cada projeto tem suas peculiaridades, mas coincidem num ponto: permitem ao trabalhador que, ao mudar de emprego, leve consigo seu plano de saúde, preservando-o, à sua custa, mesmo depois da aposentadoria.

A Clínica Mayo juntou 400 especialistas durante 18 meses e produziu uma proposta de universalização, juntando pagamentos dos clientes, dos empregadores e, em casos de baixa renda, com dinheiro público.

A selvageria do mercado brasileiro pode ser medida por duas idéias que o doutor Adib Jatene teve em 1995. Uma foi a criação de um imposto provisório para socorrer a rede pública. Chamava-se CPMF, está aí até hoje e a saúde leva apenas uma lasca de seu butim de R$ 24 bilhões. A outra foi armar uma forma de ressarcimento para a Bolsa da Viúva toda vez que um cliente de plano privado fosse atendido na rede pública.

Nem pensar. As operadoras remancham e, segundo a Agencia Nacional de Saúde Suplementar, no ano passado deviam R$ 253 milhões à rede da escumalha.

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