Pelo que se sabe até agora o grupo de brasileiros preso por suspeita de planejar atos terroristas era de um amadorismo sem igual. Os seus integrantes tentaram comprar armas pela internet, combinaram de aprender artes marciais, fizeram batismo virtual (seja lá como for isso) junto ao Estado Islâmico, além do que parece não haver evidências de terem alvo certo para ataque na Olimpíada do Rio. O caso merece reflexão sob dois aspectos. O primeiro, como se formam esses bandos de cabeças tortas e quantos deles podem estar entrando na onda do radicalismo como propósito de vida.
No momento em que você está lendo esta coluna, é de se questionar quantos outros grupos nativos estão arquitetando sair do anonimato para entrar na história como autores do primeiro ataque terrorista islâmico em terras brasileiras. Qual a probabilidade de gente profissional, muito diferente desses atrapalhados, estarem planejando ataques terroristas sem serem notados?
A resposta é que hoje não há a mínima ideia a esse respeito. Não se sabe se realmente existem ou quantos grupos estão em formação. Não se sabe quais fatores levam pessoas que poderiam ter aderido à causas transformadoras, mas preferem a destruição e a barbárie. Sem conseguir responder minimamente a esses pontos será muito difícil buscar soluções que neutralizem o problema antes que seja tarde demais.
O segundo aspecto, talvez o mais curioso do episódio, é o fato de os suspeitos terem suas conversas via os aplicativos WhatsApp e Instagram monitoradas pela Polícia Federal. Para uma semana que começou com a polêmica de um Juízo suspendendo o WhatsApp em todo o país e vai terminando com o desmantelamento de uma suposta organização terrorista que usa aplicativos para trocar informações, reabre-se uma discussão interessante sobre o direito de privacidade e a garantia de segurança coletiva.
Antes de tudo vale esclarecer alguns pontos. A ordem judicial que suspendeu o serviço do aplicativo na terça (20) foi completamente desarrazoada – o descumprimento da decisão pelo Facebook, companhia controladora do WhatsApp, poderia ter sido resolvido com medidas menos gravosas, como imposição de multa. Por outro lado, em sua defesa, o Facebook afirmou não ser capaz de atender a determinação judicial, por causa da tecnologia de criptografia empregada. Não cabe aqui discutir se há possibilidade técnica, ou não, de cumprir a ordem da Justiça. Se hoje é incapaz, a empresa deveria prontamente se adequar à legislação brasileira, pois ela confere ao Judiciário a possibilidade de conceder ordem para interceptação de comunicações em sistemas de informática nas investigações criminais.
Caso diferente é o da Operação Hashtag da Polícia Federal, que prendeu dez suspeitos de planejar atentado terrorista nos jogos olímpicos do Rio. O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, não explicou como se deu o monitoramento das comunicações nos aplicativos, apesar de o WhatsApp usar criptografia. Esse é um ponto obscuro que precisa ser esclarecido. Se não houve ordem do Poder Judiciário para interceptação das mensagens, qual outro instrumento legal foi utilizado? A interceptação se deu mediante procedimento previsto em acordo internacional?
São questões de alta relevância que precisam ser tratadas abertamente. Não é possível aceitar a justificativa do ministro, de que explicar o fato atrapalharia as investigações. Se não houver amparo legal para o monitoramento, o Brasil estará diante de uma flagrante violação ao direito de privacidade, apesar do fim nobre, de combater o terrorismo.
Todo o episódio envolvendo o grupo de supostos terroristas é muito obscuro. Não se sabe quem são, como surgiram, qual o potencial de dano que suas ações tenderiam a causar. Não se sabe se existem grupos de gente profissional pronta para deflagrar verdadeiro terror. Tampouco se sabe com que respaldo legal foram monitorados. São dias estranhos, nada transparentes. O tema terrorismo e monitoramento de dados privados merece ser tratado com mais clareza.
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