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Clareza torta 1
Faltou clareza nesta semana para certos integrantes do Movimento Passe Livre (MPL) de Curitiba. Atingir um técnico da Urbs com uma torta na cara para mostrar aversão à eleição do vereador Jorge Bernardi (PDT) como presidente da CPI do Transporte Coletivo não faz o menor sentido, é antidemocrático e completamente ineficaz. Se a intenção do MPL de Curitiba é a de evitar que a CPI se torne um jogo de cena, há meios mais inteligentes. Pode-se começar pelo acompanhamento dos trabalhos, posicionando-se como observador autônomo e interessado nas discussões sobre os custos do preço da passagem. Pode-se requerer os dados coletados pela CPI, fazer um exame das informações, questionar as conclusões, contrapor argumentos e propor soluções. Dá trabalho, mas fazer política é isso aí.
Clareza torta 2
Buscar um envolvimento mais amplo na discussão do preço da passagem de ônibus não significa que seja ilegítimo ir à Câmara protestar com o objetivo de que a CPI não acabe em pizza. As manifestações são saudáveis e funcionam como instrumento de pressão. Mas jogar torta, sapato ou qualquer objeto em alguém que é convidado a falar na CPI, é um desrespeito demasiado. O técnico da Urbs Luiz Fila foi à CPI de bom grado prestar esclarecimentos e recebeu um tratamento que não condiz com esses tempos de liberdade e democracia. Pegou mal para os manifestantes e faltou coragem em admitir o erro. Uma pena.
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Política partidária com o chapéu do contribuinte. Não há outro nome para a presidência da Câmara dos Deputados ter gasto R$ 28,4 mil para pagar despesas referentes a um jantar que Henrique Alves (PMDB-RN) ofereceu aos colegas de bancada do PMDB, ao vice-presidente da República, Michel Temer, e aos ministros Garibaldi Alves (Previdência) e Antonio Andrade (Agricultura). As informações são da ONG Contas Abertas. Segundo a ONG, o líder da bancada do PMDB na Câmara teria admitido que o encontro foi um "jantar social de semestre".
Alguém consegue encontrar um bom motivo para que uma atividade partidária (jantar social de semestre) seja custeada por recursos públicos? Certamente Alves e seus convidados não veem problemas nisso. É possível que estejam tão acostumados a usar recursos públicos para organizar festas, para viajar com aviões oficiais com o objetivo de satisfazer interesses particulares, que achem isso um dever do contribuinte. Fica a impressão de que os cerca de 490 protestos ocorridos em todo o país em cerca de vinte dias de junho já perderam seu efeito.
O primeiro semestre legislativo acabou mal para a classe política brasileira. O ânimo para atender "a voz das ruas" arrefeceu, o Palácio do Planalto transferiu a responsabilidade do plebiscito da reforma política para o Congresso Nacional e os parlamentares se ocuparam apenas em votar um pequeno "pacote de bondades", evitando acabar com benesses e distorções do sistema político. Nos estados, governadores fingem que o problema tem origem só no descontentamento com o governo federal e prefeitos fazem de conta que a onda de protestos já passou e tudo pode voltar a ser como antes.
A crise de representatividade é séria e ainda não teve seu desfecho. Em Brasília, há um esforço para mostrar que o Congresso e o governo federal estão preocupados em atender a pauta de reivindicações dos manifestantes. Contudo, como bem se sabe, a pauta dos novos movimentos sociais é ampla e, por vezes, genérica contra a corrupção, contra os privilégios, contra tudo o que esta aí. Isso é consequência da indignação da sociedade que se traduz em uma espécie de intuição de que as coisas não estão bem.
Os gastos para a realização do jantar da bancada peemedebista na residência oficial de Henrique Alves é apenas mais um sintoma de que a república está doente. Há outros. O Senado paga R$ 15 mil de verba indenizatória e concede o direito a assistência médica vitalícia a parlamentares, ex-parlamentares e dependentes. Autoridades públicas abusam de aviões oficiais para atividades particulares.
Achar que isso tudo é normal e dever do Estado para o bom funcionamento das instituições é a constatação de um sistema de privilégios, em que eleitos e membros não eleitos dos demais órgãos públicos são seres que merecem um tratamento superior ao do cidadão brasileiro, que faz as engrenagens da máquina pública funcionarem com o pagamento de impostos. O descaso das autoridades está se enveredando por um caminho perigoso. Nem parece mais que houve um estouro de protestos em junho.
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