Enquanto o universo político se vê às voltas com o processo de impeachment, os acordos nos bastidores para acabar com a Lava Jato e uma quixotesca guerrilha ideológica de militâncias irracionais, há uma parcela da sociedade em franco processo de abertura de novos caminhos para a cidadania. Um exemplo recente de pessoas que deixaram o reclame das redes sociais para colocar as mãos à obra é o projeto “We are all smart”. Dezenas de voluntários de sete países estão ajudando 130 crianças e jovens, entre cinco e quinze anos, a aprender como aplicar fundamentos de Internet das Coisas em cultivo de hortas em Guaraqueçaba.
A iniciativa nasceu dentro da nova lógica que passou a reger os negócios da era digital. Utilizando a ferramenta colaborativa do Peacelabs– uma plataforma em que empreendedores, voluntários e investidores sociais se conectam para cocriarem projetos de impacto – um grupo de ativistas desenvolveu toda uma metodologia para ensinar desenvolvimento de software, hardware e técnicas de cultivo para crianças. A ideia inicial partiu de uma professora de arquitetura da universidade canadense Fanshawe College, que frequenta há anos a região , mas foi discutida e trabalhada pelos voluntários até se chegar ao formato atual.
Numa parceria com o Centro Social Marista Irmãos Panini, 32 voluntários cumpriram a primeira etapa do programa entre 22 e 26 de fevereiro, ensinando noções de programação e manejo de hortas para as crianças e jovens. Na Páscoa, outros 22 foram passar mais dois dias na cidade para prosseguir nas capacitações e propor desafios aos participantes. Toda a infraestrutura tecnológica do projeto é realizada de forma voluntária pelos hackers ativistas do Code for Curitiba, já reconhecidos pelos seus trabalhos de desenvolvimento de aplicativos cívicos na capital do estado.
“O que seria mais uma horta em uma comunidade se transformou em uma mobilização internacional para que crianças sejam desafiadas a entender que todos são inteligentes para aprender qualquer coisa inclusive permacultura, hardware e software aos 5 anos de idade”, explica a voluntária no projeto e diretora do PeaceLabs, Paloma Lecheta.
Com duração de seis meses, o projeto aposta em recursos básicos de gamificação para engajar os participantes. Para se tornar “ninja” no projeto, os jovens precisam vencer uma série de desafios nas áreas de programação e cultivo, recebendo para cada “fase” uma faixa que indica o seu nível de graduação – começando pela branca, passando pela azul, vermelha, verde e marrom, até chegar à preta.
Ao longo do processo de aprendizado, aprendem a desenvolver e instalar sensores nas hortas que indicam o nível de umidade do solo e do ar, temperatura do ar e da terra, luminosidade, chuva, fluxo de água, tudo controlado via tecnologia e internet. Quando chegam à faixa preta, os participantes recebem a missão de repassar os conhecimentos para os novos colegas, gerando um efeito multiplicador. “O projeto envolve assuntos que são de interesses dos jovens, software, hardware internet das coisas”, explica Paloma. “Descobrem que tecnologia pode ser aplicada ao mundo real, não serve só para jogar jogos eletrônicos ou ver vídeos no Youtube.”
São iniciativas como essas que estão pontualmente fazendo a diferença no país. O ponto de virada da sociedade e das instituições brasileiras vai se dar quando, de um lado, os cidadãos conseguirem ampliar massivamente os projetos e negócios que transformem a realidade social e a mentalidade dominante e, de outro, conseguirem um mínimo de alinhamento inter-institucional que proporcione a esses esforços uma estratégia mais ampla em todo o território.
Esse modelo tem uma vantagem. É mais legal que xingar os outros de coxinhas e petralhas nas redes sociais.
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