Falar que organizações públicas ou privadas podem aprender lições valiosas sobre criatividade e inovação com protestos até parece uma ironia, especialmente porque no próximo domingo haverá manifestações em todo o país contra e a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Soa engraçado porque o nível do debate popular no Brasil caiu a níveis abaixo da cintura e não raras vezes se observa nos protestos cidadãos expressando visões autoritárias ou irracionais, que a tudo simplificam e a tudo classificam com os rótulos de coxinhas, mortadelas ou petralhas.
Aprender com protestos, no contexto desta coluna, significa entender que tipos de grupos foram mais bem-sucedidos em criar e empregar táticas inovadoras em manifestações. E, a partir dessa análise, extrair lições que podem ser usadas em outros contextos organizacionais. Uma pesquisa conduzida pelos professores Sarah Soule e Dan Wang, da Universidade de Stanford, analisou casos de 23 mil protestos entre 1960 e 1965 e deve ser publicada em breve na American Sociological Review.
Segundo reportagem publicada no site da universidade, a descoberta dos pesquisadores é instigante –manifestações que envolvem várias organizações ou públicos com interesses diferentes, mas com uma meta comum, tendem a ser mais inovadoras, articulando táticas de protesto comuns para criar novas formas criativas de atuação. Outra conclusão da pesquisa é que táticas completamente novas surgem quando os protestos são organizados por pequenos grupos ou digam respeito a questões de interesse de pequenas porções do eleitorado.
Em 1967, por exemplo, ativistas de Nova York realizaram um protesto em que várias questões que não haviam sido previamente negociadas acabaram emergindo da interação dos manifestantes – segregação racial, pobreza, educação. Eles criaram táticas que incluíam desde a interrupção de uma reunião do conselho escolar e a ocupação do prédio, até, vejam só, um ciclo de debates públicos sobre o sistema escolar, que resultou em propostas de melhoria.
Outro exemplo citado na pesquisa lembra um episódio de 1967, em que estudantes da Universidade de Yale se uniram à equipe de serviço de alimentação da escola para reivindicar direitos dos trabalhadores. Juntos impediram a distribuição de alimentos e fizeram uma greve de fome, unindo táticas pacíficas incomuns, carregadas de simbologia.
Após analisar o perfil de manifestantes, as pautas de reivindicações, as formas de organização, as táticas usadas, os pesquisadores identificaram algumas lições que podem tornar empresas mais criativas e inovadoras. De acordo com Sarah Soule, da mesma maneira que grupos de interesses menos representativos são mais propensos a criar táticas inovadoras, os “gênios solitários” que trabalham na periferia do mundo dos negócios podem ser ricas fontes de inovação para as empresas. Outra lição é que, assim como grupos com pautas diferentes tendem a ser mais inovadores, as empresas deveriam buscar talentos de diferentes culturas e modelos mentais para trabalharem juntos – quanto maior a diferença, dizem os pesquisadores, mais inovação vai ocorrer.
Embora o estudo trate essencialmente do aprendizado em organizações empresariais, não há razão para acreditar que as lições derivadas dos protestos seriam inúteis ao setor público. Com o aumento de complexidade dos ambientes urbanos, a escassez de recursos e ampliação das demandas sociais, é cada vez mais necessário que se encontrem saídas inovadoras que reduzam custos, sejam sustentáveis e ampliem a qualidade de vida. A análise dos protestos traz uma excelente via para o desenvolvimento de novas soluções.
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