Metrô é um modal que já tem 200 anos, e é uma alternativa ultrapassada para enfrentar os problemas de transporte público de Curitiba. A capital paranaense, que tanto inovou entre as décadas de 60 e 90, poderia propor soluções mais viáveis, tanto em termos econômicos como ambientalmente sustentáveis. Esses são alguns dos pontos levantados em um debate recente entre professores e personalidades locais e um grupo de 20 estudantes do mestrado em Gestão Ambiental Internacional da Universidade Mines ParisTech.
Os alunos passaram uma semana de fevereiro em Curitiba, com o objetivo de conhecer a cidade de que tanto ouviram falar na França. Segundo a pesquisadora Rebecca Pinheiro-Croisel, que atua na ParisTech, há um fascínio muito grande com o nosso sistema de ônibus, o BRT (Bus Rapid Transport), que inspirou alguns prefeitos franceses.
"Desde os anos 2000 ouvimos na Europa que Curitiba é a cidade sustentável da América Latina. Mas será que Curitiba realmente é uma cidade sustentável? A ponto de todos os habitantes usufruírem disso? Como é a situação por trás do cenário? Queríamos descobrir, e por isso a visita", explica Rebecca, que é uma curitibana que se formou na França e há anos atua na ParisTech. As conclusões do grupo serão enviadas à prefeitura de Curitiba em breve, após os estudantes finalizarem seus relatórios.
Alguns pontos mais relevantes foram destacados pela pesquisadora: o discurso sobre desenvolvimento sustentável e ecologia já é coisa do passado. Agora, para inovar realmente, Curitiba precisa se dedicar à justiça social. "Sustentabilidade é assunto muito básico. A cidade precisa ser resiliente, resistir às crises sociais, econômicas, climáticas. Enquanto não tivermos justiça social, teremos violência", avalia Rebecca.
A justiça social é um conceito amplo, e pode ser aplicada ao planejamento do sistema de transporte público, por exemplo. Para a pesquisadora, não é justo usar bilhões de reais na construção do metrô se for para atender apenas a uma parte pequena da população. "Porque não usar esse dinheiro para tirar do isolamento quem mora nas vilas mais afastadas, ou mesmo construir creches, dar saúde e dignidade às pessoas?", questiona. Para ela, a prefeitura deveria ter sensibilidade e sabedoria para conseguir garantir a verba federal mesmo sem fazer o projeto do metrô.
O espanto dos franceses com o projeto do metrô é o mesmo que o meu e de muitos outros: gastar rios de dinheiro para construir uma estrutura exatamente embaixo das vias expressas, substituindo um sistema de ônibus que cumpre seu papel, ainda que necessite permanentemente de melhorias.
Pessoalmente, invejo as pessoas que podem usar o metrô. Mas o sistema funciona em metrópoles, e com uma rede equivalente. Rebecca ressalta que Curitiba não tem densidade habitacional tão alta como Paris e outros locais.
Visão local
É interessante conhecer a opinião de pesquisadores do exterior sobre Curitiba, mas na verdade a visão crítica sobre o metrô existe há tempos em Curitiba. O professor da UTFPFR Décio Estevão do Nascimento, especialista em políticas e dinâmicas de desenvolvimento territorial, também participou do debate com o grupo francês e exprimiu ideias semelhantes.
"Olhando sob a ótica da inovação, eu não acredito que uma solução criada no final do século XIX para resolver problemas de mobilidade em grandes cidades de países desenvolvidos, com grandes recursos para investimentos, seja solução para o problema específico de Curitiba do século XXI", diz. Ele também se incomoda com a incapacidade da cidade em inovar. "Será que perdemos a mão, a ousadia e o gosto pela criação? Curitiba, de criadora de soluções urbanísticas e de mobilidade, passará a ser criatura?"
O receio é grande.
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