Dezenove de novembro: o dia em que a chantagem do presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ficou evidente. Se já era fato consumado nos bastidores, foi só nesse dia, quando declarou que os pedidos de impeachment seriam avaliados todos em 2015, que o ultimato do peemedebista se tornou público. Parecia, porém, apenas mais uma declaração. Cunha latiu tanto durante o ano inteiro que parecia incapaz de tomar uma decisão sobre o início do processo do impeachment. Mas, a duas semanas do recesso parlamentar, resolveu morder.
Foram os seguidos questionamentos aos desmandos de Cunha em um curto espaço de tempo que o levaram a dar o gatilho num processo demorado e doloroso para o Brasil.
Em 19 de novembro, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara tinha uma reunião marcada para as 9h30, para analisar o parecer que recomenda a admissibilidade da representação contra Cunha, por suposta quebra de decoro. Por falta de sala, a reunião teve início às 10 horas.
Passados 20 minutos, um dos aliados de Cunha, André Moura (PSC-SE), questionou o tempo que se deu para aguardar quórum. O presidente do Conselho, José Carlos Araújo (PSD-BA), disse que o início da sessão, às 10h24, com o quórum necessário, seguia o regimento de tolerância de 30 minutos.
O diálogo que se seguiu foi surreal. Moura e outro aliado de Cunha, Paulinho da Força (SD-SP), lançaram mão de várias questões de ordem para protelar e suspender a votação. Por fim decidiu-se que a sessão seria retomada à tarde.
No plenário, Moura, com apoio de outros cunhistas, voltou à carga e reapresentou os questionamentos, o que levou ao presidente em exercício, Felipe Bornier, a cancelar a reunião do Conselho de Ética. O protesto foi geral e, pela primeira vez neste ano, a oposição agiu com rapidez, coerência e firmeza. PSDB, DEM, PPS, PCdoB, PRB e PSol lideraram o movimento que deixou Cunha a ver navios. Por falta de quórum, a sessão foi suspensa.
Além do protesto em bloco, a postura de uma deputada foi fundamental: Mara Gabrilli (PSDB-SP), que é cadeirante. Disse que tem dificuldade para comparecer ao plenário, mas quer dar exemplo. Disse que gostava de Cunha, mas que isso foi ruim. “Isso não me deixou perceber que o senhor nos chama de imbecis, muitas vezes. (...) Eu convido todos os deputados a saírem desta sessão. O que o deputado Felipe Bornier fez aqui não se faz. O senhor está com medo, sr. presidente? É isso que está acontecendo? Chega, sr. presidente. Levante dessa cadeira, Eduardo Cunha!”, discursou, motivando os colegas.
Na sessão fatídica do dia 19, o PT tentou manter o quórum, para garantir votações importantes ao ajuste fiscal. Houve questionamentos à atuação de Cunha, como a feita por Henrique Fontana (PT-RS), mas ao Planalto não interessava fazer um embate direto.
Dada a repercussão negativa, Cunha decidiu suspender a decisão de Bornier sobre o Conselho de Ética. Mas, excêntrico e arrogante, quis terminar o dia dando uma volta por cima. Horas depois, anunciou que iria decidir sobre os pedidos de impeachment neste ano.
Cunha ameaçou, e cumpriu. Com a confirmação dos deputados do PT do Conselho de Ética de que votariam contra ele, o peemedebista anunciou a abertura do processo de impeachment. Se ele cair, quer levar Dilma e o PT junto.
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