Eu torço para que os gestores de Curitiba, atuais e futuros, levem em conta algumas das sugestões urbanísticas de Jaime Lerner. Principalmente as que são contra a implantação do metrô, uma obra incrivelmente cara, demorada e complexa, que vai servir apenas aos usuários de uma linha.
A torcida, porém, é para que escutem, mas com um sensor crítico ligado. As pessoas estão tão saudosistas que se esquecem que Lerner foi prefeito em outra época, quando o controle público não existia e os prefeitos podiam executar obras na marra, sem consultar ninguém.
Jaime Lerner foi prefeito de Curitiba em três ocasiões: entre 1971 e 1974; entre 1979 e 1983; e entre 1989 e 1992. Na época dele, tudo era mais fácil. Foi na primeira gestão que ele promoveu uma obra de grande impacto para a região central da cidade: a criação do calçadão da Rua XV, fechando o tráfego para veículos.
Em entrevista publicada pelo jornal Folha de S. Paulo em 8 de setembro, Lerner recorda da obra: “Inovar é começar. Melhor trabalhar rápido e mostrar resultados que gastar muito tempo com teorias. Fizemos o primeiro calçadão do Brasil em 72 horas. As pessoas tinham que ver e sentir o resultado, explicação nenhuma funcionaria como a demonstração na prática. Defendo obras rápidas e simples.”
Alguém defende obras demoradas, por acaso?
De fato, Lerner enfrentava grande resistência ao seu projeto – bastante inovador e fundamental. Ele decidiu fazer a obra durante um fim de semana, liquidando a possibilidade de mobilização de comerciantes e outros.
Mas, também, 1972? Imagina quanta coisa o poder público conseguia fazer em 1972, sem ter de se explicar para ninguém. O Brasil era um outro país, muito diferente do atual. Para começar, estávamos em plena ditatura. Entre 1969 e 1974, Emílio Garrastazu Médici era o presidente do país, e a época foi de endurecimento do aparelho repressor.
Sim, Lerner também fez obras e intervenções na cidade na sua terceira gestão, já sob a redemocratização e a Constituição Federal de 1988. Mesmo assim, comparar aquela época com a de agora é covardia. O administrador público de então tinha muito mais liberdade para gastar do que agora.
Reportagem da Gazeta do Povo publicada no fim de semana mostra algumas diferenças cruciais. Basta ver a legislação que passou a vigorar pós-Lerner para ter noção de que o laço ficou mais apertado. O grande desafio são as atribuições de saúde que passaram das mãos da União e dos estados para os municípios.
Segundo o economista François Bremaeker, gestor do Observatório de Informações Municipais, antigamente as prefeituras do Brasil gastavam cerca de 5% do orçamento municipal com saúde e 12% com educação. Agora, pelas novas responsabilidades assumidas, gastam em média 24% com saúde e 25% com educação, acima até do que preconiza a Constituição. “Os recursos que antigamente iam para urbanismo minguaram, na média, de 25% para 11%”, declarou Bremaeker para a Gazeta do Povo.
Além das novas obrigações de investimentos, os gestores passaram a conviver com as amarras (necessárias) da Lei de Responsabilidade Fiscal, que passou a vigorar somente em 2000. Antes disso, havia todo tipo de maracutaia para jogar dívidas para a frente e criar novos tipos de endividamento.
Fazer obras era muito mais fácil.
O próprio Lerner, na entrevista à Folha de S. Paulo, disse que gostou de ser prefeito porque na cidade havia resultados mais concretos. E disse que, quando governador, sofreu “o ajuste da primeira vez que a Lei de Responsabilidade Fiscal foi implementada”.
Sorte de Lerner que seu mandato de governador (1995 a 2002) já estava no fim – ele enfrentou apenas alguns meses de LRF. Depois, disso, não concorreu a nenhum outro cargo eletivo. Com certeza seria muito mais difícil entregar obras sob um controle público tão rigoroso.
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