Nesta segunda-feira tem início o ano legislativo no Brasil. Como é ano de eleições gerais, a tendência é que os parlamentares trabalhem menos. Como é ano de Copa do Mundo, a expectativa é que folguem ainda mais. A torcida é para que isso não se concretize, mas a desconfiança é grande.
Fazendo algumas contas rápidas no calendário, sabe-se que entre 2 de fevereiro e 31 de dezembro, teremos 238 dias úteis. O recesso no meio do ano deve compreender o período entre 17 de julho e 1º de agosto. Entre 12 de junho e 13 de julho, período em que a bola estará rolando por aí, há 22 dias úteis. Mesmo que não haja feriado algum, é difícil imaginar nossas excelências no plenário ou em comissões. O período de campanha eleitoral se concentrará entre 1º de agosto e 5 de outubro. Se houver segundo turno no Paraná, serão outros 15 dias úteis de arritmia política.
Quantos dias sobram? Não muitos, mas isso até poderia ser aceitável, desde que no tempo restante nossos legisladores trabalhassem com mais afinco para servir ao interesse público. Normalmente, a condução dos trabalhos leva em conta apenas isto: ser aliado ou oposição ao chefe do Executivo mais próximo. Os vereadores votam conforme sua ligação com o prefeito sem muitos arroubos, porque são poucas as câmaras municipais que contam com transmissão das sessões. Os deputados estaduais obedecem ou escracham as diretrizes do governador e os deputados federais e senadores se digladiam em uma luta que eles consideram ser do bem versus o mal, que gira em torno do PT e do PSDB.
O Legislativo é um teatro, e tudo bem, faz parte do jogo político. Em países desenvolvidos também ocorrem situações bizarras. Desconheço um exemplo tão ilustrativo como o de um desenho dos Simpsons, de 2003, que faz uma paródia do Congresso americano. Krusty, o palhaço, concorre e ganha uma vaga de senador. Seu objetivo é levar à votação um projeto de lei que proíbe o tráfego aéreo em áreas residenciais, uma reivindicação da cidade de Springfield, que não suporta mais o barulho das aeronaves que estão passando por ali. Assim que entra, Krusty enfrenta a dura realidade. "Você é o quê, um idiota? Não sabe que senador novo não apresenta nada?", avisa um colega.
Krusty tenta emplacar o projeto em uma comissão, para depois levá-lo ao plenário, mas também não consegue. Um zelador explica aos Simpsons como fazer para ajudar o senador: é preciso chantagear alguns congressistas e anexar a proposta do controle de tráfego aéreo a um projeto popular, que tenha aprovação garantida. E isso é feito com um clipe de papel garantia de que o projeto está anexado. O projeto é aprovado.
O exemplo é exagerado, mas segue a linha de um lugar-comum: "leis e linguiças, melhor não saber como elas são feitas".
Audiências públicas
Há maneiras, entretanto, da população acompanhar como as leis são feitas, e opinar a respeito: as audiências públicas, por exemplo. Como cidadão, é possível sugerir onde o município vai aplicar parte do orçamento. Mas há audiências ainda mais elaboradas, em que além da população afetada, especialistas no assunto são chamados a dar seu parecer. Todas as casas legislativas promovem essas audiências públicas, mas elas são bem consolidadas nas comissões da Câmara dos Deputados.
E o que isso tem a ver com o cenário descrito nos parágrafos anteriores? O grande problema é que o número de audiências públicas cai drasticamente em anos de eleição. Os deputados até podem alegar que trabalham normalmente, que aprovam muitas leis. Isso é fácil, pois basta limitar as discussões, adotar o esquema "rolo compressor" e passar algumas madrugadas votando no plenário. Mas o fato é que o trabalho feito junto com a sociedade, construído nas audiências, é seriamente prejudicado. E, além disso, teremos a Copa do Mundo.
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