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O Zezinho, um colega de trabalho, perguntou: o que eu achei da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre as cotas raciais nas universidades? Não é melhor um critério social? Que beneficiasse estudantes de escolas públicas? Muita gente acha que essas fórmulas seriam mais justas. Mas a verdade é que o Brasil, infelizmente, precisa de todas essas políticas de inclusão. Por isso foi um grande avanço o STF decidir que as cotas raciais não são inconstitucionais. Não dá para fingir que somos todos iguais quando não somos.

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A Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), que foi a primeira instituição pública a aplicar a cota racial, explica em seu site que o princípio de igualdade previsto na Constituição refere-se apenas à igualdade formal perante a lei. Na prática, a igualdade é um grande ideal a ser almejado, e uma das maneiras de se chegar a ela é a oferta de cotas raciais.

Outro argumento usado é de que o governo deveria melhorar o ensino público fundamental, para que todos tivessem as mesmas condições de concorrer ao vestibular. Claro que isso é preciso, mas não dá para ficar esperando o bolo crescer para depois dividir, como se apregoava durante o regime militar. O ensino público de qualidade deve ser ofertado por todos os governos permanentemente; as cotas são uma medida paliativa e temporária.

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Quando se está brigando por uma vaga na universidade, ou em qualquer concurso público, a meritocracia deve ser o critério básico. Mas o STF entendeu que é possível exigir "méritos" diferentes para a população negra. Os estudantes fazem a mesma prova, precisam todos ter mais acertos do que erros, e geralmente não podem zerar em nenhuma das disciplinas requisitadas. O candidato negro não está "roubando" a vaga de ninguém. Ele precisa passar pelo mesmo teste, mas sua nota será comparada apenas com os outros que se declararam negros.

Vale destacar que a maioria das instituições, como a UFPR, também faz a inclusão social e oferece a mesma quantidade de vagas tanto pelo critério da inserção racial como pelo critério da inserção social, para quem frequentou escola pública.

A junção dos dois modelos é ótima. Precisamos de ambos porque a desigualdade no Brasil é muito profunda. A pobreza ainda atinge aproximadamente um em cada dez brasileiros. Mas a quantidade de negros que são pobres é proporcionalmente muito maior do que o número de brancos que são pobres (veja tabela). Se o critério de cota fosse apenas social, a desigualdade permaneceria.

Discriminação

O critério de renda até poderia ser interessante, mas parece de difícil aplicação e muito frágil, podendo ser fraudado facilmente. Porém, esse sistema não resolveria um grande problema brasileiro, camuflado por muitos: a discriminação racial.

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O preconceito existe e tem dificultado, historicamente, o acesso de negros ao sistema de ensino e ao mercado de trabalho. As barreiras, em muitos casos, são invisíveis e por isso só com medidas concretas, como as cotas raciais, conseguiremos superá-las. Há exemplos diá­­rios de racismo no Brasil e se você achar que não, me escreva que conto alguns casos, pois aqui não há espaço suficiente.

O fato é que esta é uma política pública relativamente recente, implantada a partir de 2003, e por isso é natural e esperado que ocorram mudanças e melhorias. Também torço para que a reserva de vagas em universidades não abra brechas para a implantação de cotas indiscriminadamente. Por exemplo: as pessoas que frequentaram a universidade já estão em pé de igualdade em um concurso público de nível superior. Não precisam de reserva de vagas. Talvez o sistema pudesse ser usado nos concursos públicos de nível técnico ou básico, mas dependendo do contexto de cada localidade.

Repito: a decisão do STF permite a reserva de vagas, mas nada é obrigatório. Espero que o Congresso não aprove nenhuma lei com uma norma única para todo o Brasil, pois somos um país gigante com diferentes realidades. Também espero que o sistema perdure por pouco tempo, pois a intenção é de justamente minimizar as diferenças. A existência das cotas, portanto, dependerá de todos nós, da maneira como nos relacionamos e nos respeitamos.

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