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Quando eu crescer, quero vencer uma licitação de serviço público. Pode ser de transporte urbano, ou de uma rodovia, por exemplo. Os guias de carreira que vejo por aí falam bastante das carreiras de médico, engenheiro, advogado, mas nada parece melhor do que vencer uma concorrência.

Já tenho definida uma estratégia que parece infalível: participo de uma licitação de um pequeno município. São muitas opções: 4,5 mil em todo o Brasil, dos quais 339 no Paraná, que têm menos de 30 mil habitantes. Nesses locais, geralmente não há imprensa atuante para cobrar transparência, celeridade e moralidade do Executivo e do Legislativo, então é um obstáculo a menos para assinar contratos rentáveis com o poder público.

Chego nessa prefeitura com a cara e a coragem. Licitação para construção de creche? Nunca fiz, mas não interessa. Ofereço um preço mais baixo do que o de mercado, saio vencedora e até a licitação ser homologada, vou pensando em como executar a obra. O melhor é que, assinando o contrato, logo posso pedir aditivos. Dificilmente a prefeitura vai dizer não. Melhor pagarem um pouco mais para mim do que cancelarem a licitação ou tentarem suspender o contrato, é muita burocracia.

Claro que o ideal é iniciar os trabalhos numa prefeitura mais “amigável”. Se o prefeito ou um secretário municipal for parceiro, facilita bastante. Em todo o caso, estarei sempre pronta para novas amizades. Muitas delas exigirão pixulecos, mas posso prever, na minha planilha de custos, uns 5% para quem colaborar.

Com o contrato aditivado, vou ter dinheiro para contratar mais pessoas, e farei a obra. Vai dar trabalho, mas será um investimento. Com essa obra no meu portfólio, ganho cacife para participar de outra concorrência – também farei um preço camarada e serei contratada. Logo poderei participar de licitações maiores – o pixuleco também vai aumentar, mas meu capital de giro também. A esta altura, se tudo der certo, já poderei contratar os serviços de algum doleiro e mandar uma bolada para o exterior.

Haverá muitos riscos e, ampliando os negócios, ficará mais difícil ter controle sobre toda a empresa ou evitar vazamento de algo que possa ser incriminador. Mesmo assim parece valer a pena: com o dinheiro acumulado posso pagar advogados bacanas que, se não conseguirem me livrar das acusações, vão saber protelar qualquer decisão judicial desfavorável.

O segredo é se envolver com um número restrito de políticos e outras pessoas com foro privilegiado. Assim, parte do processo vai para instâncias superiores, e com isso surgem vários recursos possíveis. Ou então, se for processada individualmente, poderei recorrer a amigos poderosos: consigo uma secretaria e passo a ter foro especial; deixo o cargo e o processo tem que voltar à primeira instância; negocio uma indicação para o Tribunal de Contas, e por aí vai.

Cidades grandes

O ideal mesmo seria vencer alguma licitação de transporte público, com um contrato de 20 anos. Teria poderes até para fazer uma prefeitura de refém, se fosse do meu interesse. Cobraria a tarifa que quisesse, pois no Brasil nem Executivo, nem Legislativo, nem Judiciário, nem Tribunal de Contas, nem pressão popular conseguem reverter um contrato, por mais mal feito que ele tenha sido.

Outra ótima opção é uma concessão rodoviária, de preferência por um prazo longo, de 24 anos. Dependendo dos governantes e fiscais de plantão, deixo de fazer investimentos e, antes de vencer o contrato, faço uma ótima proposta (para mim): executar grandes obras em troca da prorrogação desse contrato já longuíssimo.

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