Quem ocupa um cargo no Executivo tem dificuldades para se colocar contra a reeleição de presidente, governadores e prefeitos. O candidato Aécio Neves (PSDB-MG), que desde 2011 é senador da República, voltou a se manifestar contra a inovação implantada por seu partido em 1997, para garantir a continuidade de Fernando Henrique Cardoso na Presidência.
Nesta semana, Aécio afirmou em sabatina ao jornal O Globo: "Eu acho que a reeleição faz mal para o Brasil". Ele negou que a reeleição tenha sido direcionada para beneficiar FHC. "Foi para os prefeitos, foi para os governadores."
Mas, em 2000, Aécio Neves, como líder do PSDB na Câmara dos Deputados, defendia o fim da reeleição para "todos". Na verdade, a declaração dele dava a entender que ele gostaria de tirar o benefício dos governadores e dos prefeitos. "Vamos discutir com a perspectiva de acabar com a reeleição para todos. Não descarto acabar com a reeleição para presidente da República", afirmou ele, segundo reportagem da Folha de S. Paulo de 27 de dezembro de 1999.
Aécio, porém, esqueceu-se disso por um tempo. Ele foi eleito governador de Minas Gerais em 2002 e, em 2006, buscou a reeleição. Tivesse sido coerente com o posicionamento adotado em 1999, a história seria outra.
Ainda em 2006 houve a possibilidade de se discutir isso. Lula, que disputava a reeleição em meio ao escândalo do mensalão, pretendia discutir com líderes tucanos alguns pontos de reforma política, como o fim da reeleição. Em agosto daquele ano, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou o projeto com esse teor, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 41/2003. Mas o plenário não chegou a analisar a matéria. Ficou por isso mesmo.
Trajetórias
Esses detalhes são lembrados para exemplificar como a falta de coerência custa caro. Se fosse só a respeito do posicionamento pessoal de Aécio sobre reeleição, nem provocaria grandes danos, já que os políticos todos se desdizem constantemente.
O problema maior, para o PSDB, é a falta de coerência do partido.
Em 2002, depois dos dois mandatos de FHC, o PSDB escalou José Serra para dar continuidade ao projeto tucano. Quem ganhou foi Lula. Em 2006, a oposição imaginou que o escândalo de corrupção e o mensalão ajudariam a derrotar o petista. Geraldo Alckmin entrou na disputa, mas sem muito lastro. Para empolgar outros tucanos a se dedicarem à candidatura de Alckmin, o PSDB e o DEM voltaram a propor o fim da reeleição. Mas quem ganhou foi Lula, de novo, e o assunto foi esquecido. Em 2010, nova indefinição no PSDB para decidir quem seria o candidato da vez: José Serra ou Aécio Neves? Serra, pelo recall que tinha de 2002, aparecia na frente nas pesquisas. Foi para a campanha, e mais uma vez, abatido.
Agora, em 2014, Aécio foi escolhido pelo PSDB para disputar a Presidência. Há poucas semanas, aparecia com chances reais de vitória. Os escândalos envolvendo o governo federal, a falta de carisma da candidata à reeleição Dilma Rousseff e o desgaste do PT após 12 anos no poder davam a esperança de vitória ao tucano.
Eis que Marina Silva entra na disputa e supera facilmente Aécio, empatando com Dilma. Curiosamente, ela também está envolvida em uma série de incoerências. Ambientalista ferrenha e partidária do desarmamento, tem um vice defensor do agronegócio e da indústria de armas. Isso sem falar de outros pontos polêmicos de seu programa.
Mas, como a maioria dos políticos, Marina não sofre com a incoerência ideológica e política. Ela tem uma história pessoal que supera isso. Lula, para ser eleito em 2002, também renegou posicionamentos anteriores e buscou o apoio do mercado financeiro com a "Carta ao povo brasileiro". Os dois também não desistiram após a primeira derrota na disputa pela Presidência. Lula, aliás, perdeu três vezes seguidas.
Os tucanos, por sua vez, parecem não assimilar bem a derrota. Em vez de apostarem em um candidato competitivo (ou na construção de algum, caso não haja ninguém disponível), ficam trocando de nome a cada eleição presidencial. Nos últimos 12 anos, já foram derrotados, na ordem, Serra, Alckmin e Serra. Mantido o cenário atual, Aécio terá o mesmo destino. Se é tão fácil para o partido mudar de candidato, para o eleitor é ainda mais.
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