A crise política envolvendo a presidente Dilma Rousseff e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), fez crescer ao longo do ano de 2015 a tão criticada “judicialização da política”. Provocada pela atuação dos próprios parlamentares, a interferência do Judiciário no Legislativo permeou o debate de quase todos os temas importantes do Congresso ao longo do ano, com recursos frequentes ao S upremo Tribunal Federal (STF), culminando com a Corte determinando, na semana passada, como será o rito do processo de impeachment.
Ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio de Janeiro, o deputado Wadih Damous (PT) afirma que os recursos frequentes ao Judiciário contribuem para o apequenamento do Legislativo. Ele próprio, porém, foi dos que mais utilizaram do expediente ao longo de 2015, em seu ano de estreia na Câmara. Atribui as buscas que fez pelo STF como tentativa de evitar arbítrios de Cunha.
“Com o momento que estamos vivendo, com um presidente da Casa que é um homem reconhecidamente autoritário, truculento e que violenta a lei, a Constituição e o regimento, muitas vezes somos forçados a fazer o que não gostamos, procurar o Judiciário para arbitrar questões geradas na política. Você é forçado a fazer, porque não resta outra alternativa, tamanhas são as violações que o deputado Eduardo Cunha comete na arbitragem política que deveria fazer”, justifica o petista, que complementa: “Esse protagonismo indevido do Judiciário, que tem até um fundo autoritário, mostra uma imaturidade do Parlamento em resolver seus próprios conflitos, seus próprios problemas. Essa fraqueza acaba gerando essa judicialização constante”.
O deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) é outro que culpa Cunha pelo aumento da busca pelo Judiciário. “Este ano, a busca maior pelo Supremo se deveu às constantes e graves violações perpetradas pelo presidente da Câmara, que usou vários instrumentos para desrespeitar as regras para impor seu posicionamento político”, afirma Molon.
Críticas
Além do impeachment, todos os grandes temas debatidos pela Câmara tiveram capítulos no Judiciário. Foi assim nos debates sobre a redução da maioridade penal, a reforma política, a regulamentação da terceirização e até a criação de uma CPI para investigar a Fundação Nacional do Índio (Funai). Na maioria das vezes, os ministros do STF optaram por não se intrometer nas questões, por entender que os assuntos deveriam ser resolvidos dentro do próprio Congresso.
A constante busca pelo Judiciário já provocou críticas, inclusive, de ministros do Supremo. Gilmar Mendes afirmou em entrevista antes do julgamento do processo de impeachment que não cabe ao Judiciário determinar como o Congresso deve funcionar. “Devemos ter muito cuidado na intervenção nesse tipo de matéria, para não virarmos uma casa de suplicação geral. Os temas têm que ser encaminhados no âmbito do Congresso”, afirmou o ministro.
Crítico da busca pelo Judiciário por seus adversários, o presidente da Câmara afirma que os recursos judiciais se transformaram em mais uma etapa da disputa política. “Temas polêmicos acabam gerando discussões em que quem perde no voto quer às vezes reverter no tapetão. Tem muita coisa que acaba fazendo com que tentem transferir o poder do Legislativo para o Judiciário. Vejo isso como mais uma etapa da disputa política”, afirmou Cunha à reportagem, por mensagem de WhatsApp.
Supremo
O próprio Cunha, porém, foi ao STF questionar decisão interna da Câmara. Ele recorreu à Corte pedindo que Fausto Pinato (PRB-SP) fosse retirado da relatoria do processo a que responde no Conselho de Ética. O ministro Luís Roberto Barroso negou a troca, mas apontou como caminho para a substituição uma decisão da Mesa Diretora da Câmara. Posteriormente, o vice-presidente da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), deu a decisão determinando a saída de Pinato. Cunha nega que seu recurso tenha representado uma incoerência ao discurso que faz. “Isso é outra coisa. É meu direito ao devido processo legal, cumprir o regimento”, afirma o presidente da Câmara.
O líder do PPS, Rubens Bueno (PR), avalia que a maior judicialização é um sinal da “degradação da política” e um retrato de que o país não vive uma total normalidade.
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