Com uma duração média 142 dias – cerca de cinco meses –, as prisões preventivas no âmbito da Operação Lava Jato estão no radar do Supremo Tribunal Federal (STF). Os ministros da Corte sinalizaram atenção especial com a questão desde que o pedido de habeas corpus do ex-deputado Eduardo Cunha chegou a cortes superiores – o plenário do Supremo negou o pedido da defesa de Cunha, mas outra ação tramita no Superior Tribunal de Justiça (STJ) ainda sem data de julgamento.
No início do mês, o ministro Gilmar Mendes chegou a dizer que o STF teria um “encontro marcado com as longas prisões que vêm de Curitiba”. O juiz Sergio Moro, por sua vez, saiu em defesa da duração das preventivas. “As críticas às prisões preventivas refletem, no fundo, o lamentável entendimento de que há pessoas acima da lei e que ainda vivemos em uma sociedade de castas, distante de nós a igualdade republicana”, escreveu Moro no despacho em que manteve Cunha preso. O ex-deputado do PMDB está preso desde outubro do ano passado.
Confira o ranking dos presos preventivos da Lava Jato
A legislação brasileira não estabelece um limite de duração de medidas cautelares, como a prisão preventiva. Até o fim da década passada, alguns tribunais brasileiros levavam em conta um período máximo de 81 dias para as preventivas – que corresponderiam à soma dos prazos legais da instrução penal do preso. Porém, os tribunais superiores não levam em conta qualquer prazo, mas a “razoabilidade” da manutenção da prisão.
Condenação em segunda instância
O STF tem o entendimento que a partir de uma condenação em segunda instância já é possível iniciar o cumprimento da pena.
Esse é o caso de René Pereira, por exemplo, cuja condenação já foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4). Acusado de tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, ele está atrás das grades há mais de mil dias.
Também já presos e sentenciados, mas sem que suas ações tenham tramitado em julgado – quando não há mais meio de recorrer – estão os ex-deputados André Vargas, Luiz Argolo e Pedro Corrêa (ambos detidos há 675 dias) e o ex-diretor da Petrobras, Renato Duque (822 dias).
Princípio da razoabilidade é o que vale
Um projeto de lei (PL 8045/10) que tramita no Senado desde 2010 propõe prazos à prisão preventiva: 180 dias (se decretada antes de sentença condenatória recorrível) ou 360 dias (se decretada por causa de sentença condenatória). Apensado a outras propostas, o projeto – de autoria de José Sarney (PMDB) – aguarda parecer na comissão especial, que trata do Código do Processo Penal.
Por enquanto, o magistrado tem de avaliar cada caso isoladamente, analisando se ainda permanecem os pré-requisitos que motivaram a prisão preventiva: garantia da ordem pública, impedir que o réu atrapalhe o andamento do processo e impedir que ele fuja. É usando esses requisitos que os defensores da duração das prisões preventivas da Lava Jato se baseiam para alegar que não há exageros nas decisões de Moro.
O procurador da república Diogo Castor de Matos, que integra a força-tarefa, classifica as prisões como “imprescindíveis” às investigações. “Em toda investigação de organizações criminosas é necessário a acautelamento provisório dos ‘cabeças’, dos líderes. Prendemos os que têm papel-chave. É a única forma de debelar o esquema”, diz.
Porém, quem critica a duração das prisões preventivas no âmbito da Lava Jato vê a situação de outra forma. “As pessoas estão sendo presas antes de serem julgadas definitivamente. Isso é uma inversão do que a Constituição determina. Só que a população aplaude isso, então esse Judiciário que tem esse viés punitivo se sente à vontade para fazer isso”, afirma Thiago Bottino do Amaral, advogado e professor da Fundação Getúlio Vargas do Rio (FGV-Rio).
O criminalista Daniel Bialski, da Bialski Advogados, de São Paulo, classifica a extensão das prisões preventivas como um “exagero inaceitável” e entende que a prática se configura em constrangimento ilegal. “A Justiça não pode se esquecer de seus princípios. Não interessa se o réu é da Lava Jato ou não, se é uma pessoa denunciada por homicídio ou no maior esquema de corrupção do país. A lei tem que prevalecer”, apontou o advogado.
Seguindo a mesma linha de Moro, Castor de Matos atribuiu as críticas à manutenção das prisões ao alto poder aquisitivo dos presos da Lava Jato. Na avaliação dele, a mesma modalidade de prisão não é questionada quando os alvos são “presos comuns”. “O mesmo princípio de uma quadrilha de rua está sendo aplicadas nos crimes de colarinho branco. Esses mesmos advogados não questionam as prisões quando se tratam de traficantes ou membros do PCC.”
Críticas refletem entendimento de que há pessoas acima da lei, diz Moro
O juiz federal Sergio Moro, responsável por julgar as ações penais da Lava Jato, rebateu as críticas acerca da duração das prisões preventivas decretadas por ele. Em despacho que manteve o ex-deputado Eduardo Cunha na prisão, o magistrado disse que não há “pessoas acima da lei”.
“As críticas às prisões preventivas refletem, no fundo, o lamentável entendimento de que há pessoas acima da lei e que ainda vivemos em uma sociedade de castas, distante de nós a igualdade republicana”, escreveu.
Moro apontou ainda a necessidade de “firmeza”, diante dos fatos apurados pela Lava Jato. “Se a firmeza que a dimensão dos crimes descobertos reclama não vier do Judiciário, que tem o dever de zelar pelo respeito às leis, não virá de nenhum outro lugar”, apontou. O juiz federal também citou a Operação Mãos Limpas, deflagrada na Itália, na década de 90, em que houve “cerca de oitocentas prisões preventivas nos três primeiros anos”.
No ano passado, o juiz Já havia defendido as medidas cautelares. “Claro que a prisão preventiva é excepcional, mas, infelizmente, estamos em tempos excepcionais [...]. Mas mesmo essa excepcionalidade tem sido citada, nos casos de comporta, dentro dos marcos legais”, disse, durante o 5.º Fórum Nacional dos Juízes Federais Criminais, realizado em São Paulo.
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