
Do caso PC Farias, passando pelo mensalão até o petrolão, o financiamento de campanhas permeia os principais escândalos políticos brasileiros desde a volta das eleições diretas para presidente, em 1989. À banalização do caixa 2, somam-se agora denúncias de que empresas envolvidas em desvios da Petrobras teriam pago propina aos partidos por meio de doações legais. Em meio aos desdobramentos da operação Lava Jato, o tema é o eixo central e, ao mesmo tempo, a maior fonte de impasses da reforma política.
Como eleger seu deputado
Um dos temas centrais da reforma política é o modelo de votação. Antes de discutir isso, é preciso entender como funciona o sistema vigente – e ter consciência que não existe um sistema perfeito.
+ VÍDEOSO travamento da discussão se deve, em parte, ao fato de que ela está ligada às mudanças no sistema eleitoral para deputado federal, estadual e vereador. Uma das formas de se adotar o financiamento público exclusivo, por exemplo, é a implementação de listas fechadas para as eleições parlamentares (modelo no qual o eleitor vota no partido e não no candidato). Historicamente, no entanto, os deputados bloqueiam qualquer tentativa de mudar as regras que os elegeram.
Há ainda os interesses diversos dos partidos. Maiores bancadas no Congresso, PMDB, PT e PSDB divergem sobre a melhor saída. Há duas décadas os petistas defendem as listas fechadas com financiamento exclusivo, proposta que bateu na trave na última vez em que a reforma política chegou ao plenário da Câmara, em 2007.
Já os tucanos defendem o voto distrital misto – no qual o eleitor vota duas vezes, em um candidato do seu distrito e numa lista partidária. O partido não tem posição fechada sobre mudanças no financiamento, mas é contra o modelo exclusivamente público.
Na semana passada, os peemedebistas oficializaram a proposta do “distritão”, sistema pelo qual são eleitos os candidatos a deputado e vereador mais votados, exatamente como nas eleições para prefeito, governador e presidente. A legenda defende a manutenção do financiamento misto (público e privado, com liberdade de doações de empresas e pessoas físicas), com a única exigência de que os repasses só possam ser feitos diretamente aos partidos.
Você vota em quem eles escolhem
Políticos se unem em torno da “eleição única”
“Eu estou vendo a proposta do Distritão [adoção de voto majoritário para as eleições parlamentares] crescer muito na Casa. Financiamento público não passa aqui”, disse o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo na semana passada. Simulação feita pelo cientista político Márcio Carlomagno mostra que a defesa da tese tem lógica – se o “distritão” tivesse sido utilizado em 2014, o PMDB seria o maior beneficiado e elegeria mais cinco deputados federais.
“O financiamento público não passa simplesmente porque não tem apelo popular. Como é que você vai falar para a sociedade, em um momento de crise, que vai colocar mais dinheiro público nas mãos dos políticos?”, questiona o deputado paranaense Sandro Alex (PPS), que integra a comissão especial da reforma política na Câmara. Na semana passada, no entanto, o Congresso aprovou o orçamento de 2015 com um aumento de R$ 289,5 milhões para R$ 867,5 milhões no Fundo Partidário.
Especialistas sugerem alternativas
O cientista político Bruno Wanderley Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais, diz que, no momento, o financiamento público exclusivo é uma solução “desesperada”. “A legislação brasileira tem algumas características que claramente favorecem a nossa gritante concentração de financiamento. Deveríamos começar por revogá-las.”
Reis defende em primeiro lugar a adoção de tetos nominais para doações privadas (atualmente, o teto legal é de 2% do faturamento anual bruto para pessoas jurídicas e de 10% da renda anual bruta para pessoas físicas). Depois, a restrição ao uso de recursos próprios dos candidatos (hoje não há limites e candidatos milionários costumam desequilibrar o jogo com “autodoações”). Por último, determinar que as doações precisam ser feitas apenas por um meio seguro e de fácil fiscalização – como as doações com cartões bancários pela internet.
O cientista político da Universidade Federal do Paraná, Adriano Codato, concorda com a criação de tetos nominais, mas adiciona novos dispositivos. “Um modelo ao meu ver mais sensato seria: financiamento empresarial com um teto bem baixo, financiamento individual com teto e financiamento público na exata medida do valor que se conseguisse na sociedade, com a doação de empresas e indivíduos”, afirma.
A Ordem dos Advogados do Brasil, em parceria com dezenas de entidades que apoiaram a criação da Lei da Ficha Limpa, defende o “financiamento democrático de campanha”. O modelo manteria o fundo partidário, excluiria as doações de empresas e estabeleceria um teto de doação de pessoas físicas de R$ 700.
A proposta se alinha à interpretação do Supremo Tribunal Federal, que no ano passado começou a votar a constitucionalidade das doações de pessoas jurídicas. O julgamento sobre o caso começou no ano passado e foi interrompido com seis votos contra as doações empresariais, o que forma a maioria dos votos dos 11 ministros. A suspensão ocorreu por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
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