Sérgio Machado: técnica é “enganar” o interlocutor com dois celulares.| Foto: Luciana Whitaker/Valor/Folhapress

Pelo menos três personagens da Operação Lava Jato colaboraram de alguma forma com as investigações por meio de conversas gravadas com outros envolvidos no esquema de corrupção. O caso mais recente é do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Após firmar um acordo de colaboração premiada, ele partiu “a campo” para gravar conversas comprometedoras com políticos.

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As gravações de Machado resultaram em um pedido de prisão por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra figurões do PMDB: o presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha; o presidente do Senado, Renan Calheiros; o senador Romero Jucá e o ex-presidente e ex-senador José Sarney.

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Dois celulares

Uma das estratégias usadas por Machado para gravar as conversas era ter dois celulares em mãos. Um deles ficava à vista do interlocutor, para que todos “ficassem tranquilos”, já que havia uma “onda de gravar tudo”. Enquanto isso, o delator gravava as conversas com um celular no bolso.

A estratégia não é nova. O filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, Bernardo Cerveró, utilizou uma tática parecida para gravar a conversa que derrubou o ex-senador Delcídio Amaral (ex-PT). Bernardo gravou uma reunião entre Delcídio, o chefe de gabinete Diogo Ferreira e o então advogado do ex-diretor Edson Ribeiro.

Em depoimento à PGR, o filho de Cerveró contou que levou um telefone celular extra para o encontro, já que havia uma prática do grupo de esconder telefones em um armário numa tentativa de evitar qualquer monitoramento. Enquanto um aparelho ficou trancado no armário, Bernardo ligou o outro para gravar o encontro.

Segundo Bernardo, sua “atuação” chamou a atenção do assessor Diogo Ferreira. Um terceiro aparelho, um chaveiro gravador chamado de “espião”, preso à mochila de Bernardo, fez Ferreira deixar o lugar onde estava sentado e ir até à bolsa do ator. Depois de ter certeza que o aparelho estava desligado, Ferreira ligou a TV e se colocou entre o senador e a mochila na expectativa de dificultar a gravação. “Não tive tempo de acionar este gravador”, disse Bernardo Cerveró no depoimento aos procuradores.

Estratégia parecida

A contadora do doleiro Alberto Youssef, Meire Poza, conta que usou uma estratégia semelhante. Em um livro do qual é personagem principal, a contadora conta como auxiliou nas investigações da Operação Lava Jato. Ela diz que foi orientada pelos policiais a gravar a maior quantidade de conversas que pudesse. Para isso, utilizava dois smartphones. Um iPhone 5C, que lhe fora presenteado por Youssef, e um outro, 5S, que ela mesma havia comprado.

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Segundo o livro, Meire desligava um celular na frente de quem ela iria grampear e deixava o outro, gravando, dentro de uma bolsa. Mesmo quando pediam para que ela retirasse o celular da sala, ela tirava um e mantinha o outro lá na bolsa, gravando. Segundo Meire, nunca ninguém desconfiou da técnica.

Meire conta na obra de um caso específico, de quando encontrou pessoalmente o então advogado do ex-deputado Luiz Argôlo (SD). “Gravei o Aluísio [ Lundgren, advogado de Argôlo à época] da forma mais simples que existe: chegamos ao restaurante, sentamos um de frente para o outro. Preparei o celular na frente dele”, conta Meire. “Coloquei o aparelho com a tela virada para baixo exatamente no meio da mesa, entre nós dois, e como a abertura do gravador virada para ele. Era como se o estivesse entrevistando. E ele sequer se preocupou com isso. Veja: ele não quis falar comigo pelo telefone para que não fosse ‘grampeado’. Veio de Brasília a São Paulo para uma conversa particular. E não reparou que havia um celular entre nós. Longe demais de mim, que era a proprietária. Perto demais dele”, ironiza a contadora.

Projeto de lei

A técnica usada pelos colaboradores da Lava Jato pode sofrer limitações por causa de um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados. O projeto é de autoria de Veneziano Vital do Rêgo (PMDB-PB) e “tipifica o ato de fotografar, filmar ou captar a voz de pessoa, sem autorização ou sem fins lícitos”. O projeto prevê ainda a responsabilização de quem divulgar o conteúdo.

O parecer do relator Fábio Sousa (PSDB-GO), porém, sugere que não haja pena para a divulgação em alguns casos, como notícias jornalísticas e denúncias de atos ilícitos. O projeto já passou pelas Comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática e Constituição e Justiça e de Cidadania e deve seguir a plenário.