O juiz Moro tem defendido publicamente a necessidade de decretar a prisão de condenados já em primeira instância| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

O empresário Márcio Andrade Bonilho, do Grupo Sanko Sider, vai poder apelar em liberdade da condenação que sofreu de 11 anos de prisão por crimes de lavagem de dinheiro (4 anos) e organização criminosa (7 anos) no processo criminal sobre supostos desvios de recursos das obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. A decisão é do juiz Sérgio Moro, que conduz as ações penais da Operação Lava Jato.

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Moro fixou o regime fechado para o início de cumprimento da pena de Bonilho - que responde ao processo em liberdade -, mas, ao final da sentença, ponderou. “Não estando em vigor prisão cautelar e não tendo o Ministério Público Federal requerido a sua decretação para a fase recursal, reputo oportuno postura prudente e permitir o apelo em liberdade.”

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Outros réus desse processo da Lava Jato também pegaram penas elevadas, mas como Bonilho também poderão recorrer em liberdade. Na prática, a prisão dos condenados da Lava Jato só poderá ocorrer com sentença definitiva ou se surgir um ‘fato novo’, como risco de fuga ou descoberta sobre novos crimes envolvendo os acusados.

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A possibilidade de apelar em liberdade foi considerada ‘uma vitória’ por advogados que atuam na defesa dos réus da Lava Jato. O juiz Moro tem defendido publicamente a necessidade de decretar a prisão de condenados já em primeira instância. As defesas dos acusados por supostos desvios das obras da Refinaria Abreu e Lima temiam que o juiz mandasse prender imediatamente os condenados.

Em artigo publicado no Estadão dia 29 de março, intitulado “O problema é o processo”, o juiz da Lava Jato defendeu: “A melhor solução é a de atribuir à sentença condenatória, para crimes graves em concreto, como grandes desvios de dinheiro público, uma eficácia imediata, independente do cabimento de recursos.”

Na avaliação do juiz da Lava Jato, a proposta não viola a presunção de inocência. Para Moro, a presunção de inocência “é um escudo contra punições prematuras, impede a imposição da prisão, salvo excepcionalmente, antes do julgamento”.

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“Mas não é esse o caso da proposta que ora se defende, de que, para crimes graves em concreto, seja imposta a prisão como regra a partir do primeiro julgamento, ainda que cabíveis recursos. Nos Estados Unidos e na República francesa, dois dos berços históricos da presunção de inocência, a regra, após o primeiro julgamento, é a prisão, sendo a liberdade na fase de recurso excepcional.”

“O problema principal é óbvio e reside no processo”, alertou Sérgio Moro, no artigo publicado em 29 de março. “Não adianta ter boas leis penais se a sua aplicação é deficiente, morosa e errática. No Brasil, contam-se como exceções processos contra crimes de corrupção e lavagem que alcançaram bons resultados. Em regra, os processos duram décadas para ao final ser reconhecida alguma nulidade arcana ou a prescrição pelo excesso de tempo transcorrido. Nesse contexto, qualquer proposta de mudança deve incluir medida para reparar a demora excessiva do processo penal.”

Primeira sentença de Abreu e Lima não incluiu crime de corrupção

A sentença judicial relativa a superfaturamento nas obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco - primeira sentença no âmbito dos contratos da Petrobras - não incluiu o crime de corrupção. Os oito réus, entre eles o ex-diretor de Abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, e o doleiro Alberto Youssef, foram condenados por lavagem de dinheiro e organização criminosa.

A denúncia que culminou com a sentença desta quarta feira, 22, apontava apenas crimes de pertinência à organização criminosa (artigo 2.º da Lei 12.850/2013) e crimes de lavagem de dinheiro (artigo 1.º da Lei 9.613/1998). Essa denúncia não discriminou crimes de corrupção ativa ou passiva. “Tais crimes não constituem objeto da sentença, sem prejuízo de apreciação em outras ações penais”, decidiu o juiz Sérgio Moro, que conduz as ações da Lava Jato.

Nessa primeira ação da Abreu e Lima, o Ministério Público Federal descreveu cinco crimes de lavagem de dinheiro. Pela lei, a lavagem pode ser denunciada sem os crimes antecedentes, o que ocorreu no caso da Refinaria Abreu e Lima.

Os crimes antecedentes foram superfaturamento e sobrepreço que configurariam peculato e violação ao artigo 96 da Lei 8666/93 (fraudes em licitações). A corrupção, assim como outros crimes antecedentes, são alvo de uma ação criminal à parte. A Petrobras informou que não comentará as condenações.

O advogado Mauricio Jalil, que faz parte da defesa do executivo Márcio Bonilho, afirmou que provavelmente deve entrar com um recurso denominado embargo de declaração até a próxima semana. O embargo de declaração é um pedido ao juiz que formulou a sentença para que ele esclareça tópicos considerados obscuros ou omissos. “Eu respeito os fundamentos e as razões pelas quais ele (juiz Sérgio Moro) se valeu para embasar sua decisão, mas não concordo”, disse o advogado. “Eu, sinceramente, acredito que não ficou comprovada a prática de lavagem. A situação da Sanko Sider e de Márcio (Bonilho) foi esclarecida pela perícia da Polícia Federal. Os produtos (tubos) foram vendidos, não houve superfaturamento. Isto foi confrontado e comprovado por laudo da PF. No meu entendimento, não existe lavagem de dinheiro, me estranha essa decisão”, disse Jalil.

Para o advogado, a organização criminosa também não ficou comprovada. “Não tem o número de pessoas para configurar o crime, muito menos os atos da própria organização. O Márcio (Bonilho) simplesmente pagava as comissões pela venda dos produtos. O que era feito com esse valor, o Márcio não tinha a menor ideia, desconhecia por completo.”