Atuação
14 investigados no país. Só um é do Paraná
Catorze magistrados em todo o Brasil são alvo de investigação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por supostas irregularidades. Os casos tramitam em segredo de Justiça e o CNJ não informa o nome dos investigados nem o suposto desvio funcional que determinou a abertura de um procedimento administrativo. Uma fonte do CNJ afirma que um desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná está sob suspeita.
A abertura de procedimento administrativo contra um desembargador do tribunal paranaense não é de conhecimento do presidente Miguel Kfouri Neto. Em teoria, caberia a Kfouri investigar o colega. O caso, como já mostrado pela Gazeta do Povo, expõe um dos motivos que levou a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) a entrar com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a atuação do CNJ.
No Paraná, a corregedoria do Tribunal de Justiça investiga a atuação de seis juízes um da região metropolitana de Curitiba e outros cinco do interior do estado. O corregedor Noeval de Quadros afirmou que há seis procedimentos administrativos abertos por atraso reiterado no serviço; um pelo fato de o magistrado deixar de prestar informações aos desembargadores; e outro por "falta de tratamento com urbanidade" [desrespeito, indiscrição]com advogados e serventuários. "São oito procedimentos porque um juiz responde a três supostas irregularidades", explicou, citando que só em 2011 foram abertas cinco investigações e que três juízes estão afastados cautelarmente dos serviços. (KK)
Responsável por investigar juízes e desembargadores do Paraná, o corregedor-geral do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), Noeval de Quadros, é mais um integrante do coro dos descontentes com a ministra Eliana Calmon, do Conselho Nacional de Justiça. O desembargador vai a Brasília na próxima semana junto com corregedores de todo o país para falar com a ministra e com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cézar Peluso.
A ideia da reunião, que ocorre nesta segunda-feira, é acertar os ponteiros do Judiciário nacional, abalado pela declaração da ministra de que haveria "bandidos de toga" na magistratura brasileira. A frase surgiu em meio à discussão sobre quem tem poderes para apurar crimes cometidos por juízes. Eliana Calmon, corregeadora nacional, crê que é o Conselho Nacional de Justiça. Uma ação da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) no STF diz que o CNJ deve agir se os tribunais estaduais não tomarem providências.
Noeval de Quadros está do lado dos que consideram que o CNJ vem extrapolando suas funções. E pretende dizer isso em Brasília. Veja os principais trechos da entrevista concedida à Gazeta do Povo:
AMB x CNJ
"A atuação do CNJ não deve concorrer com a dos tribunais. Deve ser complementar. No aspecto técnico, o CNJ é realmente uma inovação muito boa, trouxe novos saberes, trouxe estatísticas, aspectos sociológicos, tecnocráticos. Ajudou muito a modernizar a Justiça. No aspecto disciplinar, se ele tiver uma atuação concorrente, não há estrutura para fazer investigação em todos os estados como precisaria. Além disso, vai subtrair uma competência que pela Constituição é dos estados. Estaria ferindo o principio federativo de autonomia dos estados. Se alguma corregedoria é inoperante, o CNJ tem que intervir nessa corregedoria pontualmente. Mas não é verdade que as corregedorias todas sejam ineficientes. E o CNJ acompanha isso todos os dias: toda vez que abrimos um procedimento contra um juiz ou que arquivamos algo, o CNJ fica sabendo."
Poder de investigação
"Esta ação, caso seja dado ganho de causa à AMB, não vai reduzir o poder de investigação do CNJ. Entendo que o STF vai se pronunciar sobre a Resolução 135, que disciplina o procedimento administrativo, para decidir se ela contraria ou não a Lei Orgânica da Magistratura Nacional. De qualquer modo, também vai dizer se a Corregedoria Nacional pode investigar diretamente juízes e desembargadores ou se ela tem que encaminhar primeiro para as corregedorias estaduais ou os presidentes dos tribunais, no caso de desembargadores."
"Bandidos de toga"
"A magistratura se sentiu atingida pelo fato da generalização. O meu vizinho pode imaginar, por exemplo, que eu sou um desses bandidos de toga. É isto que fere o amor próprio dos juízes. Porque hoje os juízes estão também em evidência pelo fato de que são as pessoas mais julgadas pela sociedade. Eles estão sendo até ameaçados de morte. Tivemos casos recentes de morte por conta do juiz estar cumprindo seu papel. Uma afirmativa como esta da ministra, que se refere a algumas pessoas, que ela não esclareceu quem são, ataca a classe como um todo. Como em toda profissão, quando a gente faz um concurso não pode prever o futuro, não sabe se a personalidade da pessoa é deformada ou não. Nós fazemos uma investigação sobre a vida pregressa, mas não sabemos o que aquela pessoa vai fazer depois, no exercício do poder. Não vamos dizer que não haja desvios dentro da magistratura, mas podemos afirmar, com bastante segurança, que é um mínimo e que efetivamente, quando há desvios, eles têm sido apurados. Por isso, o colégio de corregedores se sentiu atingido quando se disse que a atuação das corregedorias é inepta".
PEC no Senado
Diante da possibilidade de restringir poderes de fiscalização do CNJ, o senador Demóstenes Torres (DEM) protocolou no Senado uma Proposta de Emenda Constitucional que garante a manutenção do trabalho do Conselho.
"Nós vamos discutir isso entre os corregedores do país inteiro, porque pode ferir o princípio da harmonia e independência entre os poderes. Nós não temos interesse em restringir a atuação da Corregedoria Nacional".
Desfecho da crise
"Esse embate é político, é institucional, e há momentos em que uma declaração como esta [da ministra Eliana Calmon] ganha contornos bombásticos. O juiz tem que ser econômico ao fazer este tipo de declaração, mas isso evidentemente é do estilo de cada um. Acho que a instituição do Poder Judiciário é muito forte e ela vai sair deste episódio com mais transparência e ainda mais fortalecida".
Corporativismo
"É muito difícil fazer uma afirmativa generalizada porque não conheço a realidade dos outros estados. No Paraná não existe corporativismo. Quem julga os juízes é o Órgão Especial [do TJ]. O corregedor apenas apresenta uma proposta de voto e o Órgão Especial, que tem 25 membros, é quem decide. Nunca vi esse tipo de corporativismo para impedir a punição a um juiz. Em tribunais menores pode haver maior dificuldade."
Falta de estrutura
"A estrutura da nossa corregedoria não é suficiente. É preciso ter mais juízes auxiliares e mais auditores para que possamos fazer todo esse trabalho. O número de juízes no estado vem aumentando e a estrutura da corregedoria está estável há bastante tempo. Hoje são seis juízes auxiliares e seis assessores correcionais que viajam uma semana sim, outra não. Para percorrer todo o estado nós levaríamos três anos. Para fazer a correição em Curitiba o tempo estimado é de mais ou menos um ano. Em outros estados, no Rio Grande do Sul, por exemplo, a estrutura é praticamente o dobro da nossa. Uma das minhas metas é deixar a corregedoria do Paraná mais bem estrututrada para o futuro e desenvolver um trabalho mais de orientação e prevenção do que propriamente de repressão".
Investigar colegas
"Eu não acho desconfortável o trabalho de investigar juízes. Eu julgo há 31 anos. É a minha tarefa. Então, o processo contra um colega é um processo como qualquer outro. O corregedor, quando assume essa função, já sabe qual será sua atribuição. E também nós usamos de bastante bom senso para instaurar processo administrativo contra o juíz. O próprio juiz já sabe que ele eventualmente pode ter cometido alguma falta e compreende qual é o papel do corregedor."
Exemplo?
Desde a criação, em 2005, o CNJ condenou 50 magistrados, nenhum do Paraná.
"A qualidade do trabalho dos juízes do Paraná é excelente. Na parte disciplinar, todas as faltas são apuradas. A média nos últimos sete anos é de sete a oito processos administrativos disciplinares abertos por ano. Neste ano, nós ja temos cinco instaurados e dois prontos para ser levados ao Órgão Especial para saber se vão ser instaurados ou não. Todas as reclamações que aqui surgem são investigadas. No geral as reclamações não são por falta ética ou moral, mas sim por insuficiente capacidade de trabalho e atraso no serviço. Porque hoje os juízes lidam com muito trabalho, muita pressão. São faltas, mas não tão graves a ponto de causar punições, como uma demissão, por exemplo".
Punições brandas?
A aposentadoria compulsória foi a punição mais recorrente aplicada pelo CNJ em casos de irregularidades cometidas por magistrados.
"A magistratura tem discutido sobre isso. O novo estatuto da magistratura deve prever mudanças. A atual legislação prevê esse tipo de penalidade, mas também prevê a pena de demissão para o juiz que for condenado criminalmente, como já ocorreu no Paraná. As punições não são brandas, são adequadas para o nível da tarefa e das exigências que cercam a pessoa do juiz, que lida com interesses variados, poderosos. Então o juiz não pode ficar à mercê de que também haja a perda do cargo, a não ser por um fato extremamete grave. E quando esses fatos ficam comprovados, a resposta tem sido dada".
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