O corte de R$ 100 milhões do repasse de dezembro ao Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) foi uma forma de pressionar o Judiciário a liberar o acesso do governo estadual a R$ 600 milhões em depósitos judiciais. A informação foi confirmada por fontes consultadas pela Gazeta do Povo, que aceitaram falar sobre a guerra travada entre Executivo e o Judiciário, com a condição de terem seus nomes preservados.
Precisamos da compreensão de todos os poderes. Não tem dinheiro público; o dinheiro é do contribuinte paranaense.
Na terça-feira (22), reportagem da RPC mostrou o secretário estadual de Fazenda, Mauro Ricardo Costa, afirmando que os outros poderes são “ilhas de prosperidade” e que precisavam dar uma dose de colaboração em um momento de crise financeira. Ele alegou que o TJ tem R$ 947 milhões em aplicações financeiras – no que chamou de “uma poupança desviada” – e por isso passou apenas R$ 40 milhões dos R$ 140 milhões que deveria transferir para o Judiciário em dezembro.
O presidente do TJ, Paulo Roberto Vasconcelos, reagiu e desafiou o secretário a provar o que estava falando. A situação colocou os dois poderes em rota de colisão. O secretário disse que precisa do dinheiro para pagar o salário dos servidores. O repasse feito pelo governo ao Judiciário, à Assembleia Legislativa, ao Tribunal de Contas e ao Ministério Público é obrigatório, com porcentuais fixados na Constituição.
TJ tem aplicações financeiras milionárias, confirma fonte do TC
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) acumulou, ao longo dos anos, sobras orçamentárias que viraram aplicações financeiras de mais de R$ 700 milhões. A informação foi confirmada para a Gazeta do Povo por uma fonte do Tribunal de Contas do Paraná (TC). A existência de aplicações financeiras está no centro da discussão entre o secretário estadual de Fazenda, Mauro Ricardo Costa, e o presidente do TJ, desembargador Paulo Roberto Vasconcelos.
Apesar da independência dos poderes, e de cada um ter direito um porcentual fixo destinado obrigatoriamente por ano, o orçamento estadual precisa respeitar o princípio da unidade. Ou seja, só há um orçamento. Assim, não pode haver sobra em caixa. Isso não é ilegal, mas não é aceitável do ponto de vista técnico. Tanto que o TC costuma ser bastante rigoroso com as câmaras municipais, exigindo a comprovação de que o que não foi gasto seja devolvido.
Mesmo sem poder acumular, essa é uma prática recorrente em alguns poderes. É o caso do TJ, que guardou as sobras. Como o governo estadual estaria com dificuldades para pagar as contas de dezembro, deixou de repassar recursos para o Judiciário alegando que os magistrados poderiam abrir mão da “poupança” que fizeram. O presidente do TJ, em entrevista à RPC, negou veemente a existência das aplicações e desafiou o secretário a provar que o dinheiro estava disponível. A Gazeta do Povo procurou o TJ, mas ninguém se pronunciou sobre o caso.
Informações extraoficiais indicam que o governo do Paraná arrecadou bem menos do que previa neste mês e está com dificuldades para pagar contas. Ainda segundo fontes ouvidas pela reportagem, a administração estadual tentou negociar com o TJ para que as sobras orçamentárias fossem devolvidas – assim como a Assembleia e o Tribunal de Contas já fizeram. Mas não houve acordo. Além disso, o TJ não permitiu que o governo sacasse cerca de R$ 600 milhões em depósitos judiciais. Para pressionar, a administração estadual partiu para o ataque e segurou parte do dinheiro que deveria repassar ao Judiciário. A Gazeta do Povo procurou o TJ, mas ninguém se pronunciou sobre o caso.
Estratégia semelhante foi adotada no Rio de Janeiro. Por lá, também o governo estadual deixou de passar uma parte do orçamento para o Judiciário. Provocado, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que os valores integrais sejam transferidos para o tribunal carioca.
Polêmica
O uso dos depósitos judiciais é controverso. O governo do Paraná começou a gastar dinheiro que estava reservado para bancar precatórios antes mesmo de conseguir autorização legal para isso. E confessou os saques em 2013. Aí manobrou para aprovar uma lei na Assembleia Legislativa permitindo o uso dos depósitos. Em agosto de 2015, uma lei federal “legalizou” os saques, estabelecendo regras – como o tipo de gasto e o uso de no máximo 70% do valor depositado. Contudo, a nova legislação é alvo de contestações na Justiça.
Como não conseguiu que o TJ liberasse o acesso aos recursos, o governo estadual entrou na Justiça. E perdeu. Duas vezes. Tanto na primeira instância da Justiça Federal quanto no Tribunal Regional em Porto Alegre (TRF4). Também outros estados travam batalhas judiciais para acessar o dinheiro.
Algumas entidades, contudo, acham temerário o uso de um recurso que precisaria estar disponível para arcar com despesas de ordem judicial. É o caso do Banco Central, que criticou os saques indiscriminados. Parte dos problemas financeiros do Rio Grande do Sul, por exemplo, seria motivado pelo uso descontrolado de dinheiro que deveria estar reservado para pagamento de precatórios.
Histórico
Depois de muitos meses com problemas financeiros sérios, que incluíam atrasos no pagamento de fornecedores, o governo estadual passou a quitar compromissos a partir da aprovação de leis polêmicas, que aumentaram impostos como o IPVA e mexeram na Previdência estadual. Contudo, ao que parece, o governo volta a enfrentar dificuldades para quitar a folha de salários neste fim de ano.
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