A crise que se estabeleceu no Senado, envolvendo o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), há quase seis meses reacendeu a discussão sobre o papel e a utilidade do Senado. Dentro do PT, a ala Mensagem ao Partido, ligada ao ministro da Justiça, Tarso Genro, defende que seja feito um debate amplo sobre a adoção do unicameralismo (com apenas uma Câmara Legislativa Federal) no Brasil. O deputado Paulo Teixeira (SP), que faz parte do grupo, explica que a intenção do Mensagem ao Partido não é acabar com o Senado, mas abrir uma discussão sobre o tema.
"O Senado foi concebido como uma câmara representativa e revisora, mas hoje tem um número de matérias que não deveria ter, uma função exacerbada. Por exemplo, além de revisor, é um espaço também para originar projetos", diz. Teixeira afirma que é partidário de uma revisão das funções do Senado, mas é favorável à permanência do sistema bicameral.
Para especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, além de um possível desequilíbrio no sistema federativo brasileiro, a extinção do Senado poderia ameaçar a manutenção da democracia do país.
"No momento que nós estamos, se fosse feita uma consulta pública, provavelmente se escolheria a extinção do Legislativo. Mas esse é um ponto fundamental da democracia e se isso acontecesse voltaríamos ao autoritarismo", avalia o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil sessão Paraná (OAB-PR), Alberto de Paula Machado.
A OAB nacional também manifestou ser contrária a qualquer ideia de extinção do Senado. A principal preocupação seria justamente com os efeitos dessa mudança na democracia brasileira. O presidente da Ordem, Cezar Brito, afirmou na semana passada que até mesmo a discussão sobre o possível fim do Senado poderia resultar na extinção do Legislativo, o que jogaria o Brasil em uma ditadura.
"Como instituição moderna, o Senado vem de uma ideia desenvolvida pelo federalismo nos Estados Unidos, e tem como função manter o equilíbrio entre os integrantes da federação e manter a legitimidade do Legislativo", diz o cientista político Ricardo Costa de Oliveira, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Mudanças
A necessidade de mudanças no mandato dos senadores também foi destacada pelos cientistas políticos consultados pela reportagem. A alteração no sistema de suplência do cargo hoje, o suplente de senador não precisa disputar a eleição para assumir uma cadeira na Casa e o mandato de oito anos são os pontos mais criticados.
"Os suplentes não representam ninguém, eles não receberam nem mesmo um voto para estarem no Senado. É preciso que a pessoa que se candidate a Senado se comprometa a levar o cargo até o final", comenta Roberto Romano, professor da Faculdade de Filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atualmente, cerca de 20 senadores são suplentes. Entre eles Wellington Salgado (PMDB-MG) e Paulo Duque (PMDB-RJ), algumas das figuras polêmicas da atual crise que tomou conta da Casa.
Para o professor de Ciências Políticas David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), seria necessário "zerar" o Senado. "Tirar os agregados e comissionados. Convocar nova eleição e até impedir os fichas-sujas de se candidatarem", comenta. "Mas isso seria meio missão impossível, porque significaria um suicídio para muitos dos senadores", afirma. Outra mudança necessária, na opinião do professor, seria reduzir o tempo dos mandatos para quatro anos. Isso, na opinião dele, reduziria o domínio de alguns grupos políticos sobre a Casa e evitaria situações como as que Senado enfrenta atualmente.
Revisão constitucional
Em outras ocasiões, integrantes do PT já defenderam a extinção do Senado. Em 2007, quando a Casa vivia uma crise envolvendo o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) na época presidente do Senado , o deputado Ricardo Berzoini (SP), presidente do partido, propôs a adoção do sistema legislativo unicameral. Na época, Berzoini defendia a convocação de uma Constituinte para ser feita uma reforma política.
A redação de uma nova Constituição seria necessária para se extinguir o Senado e mudar o sistema legislativo brasileiro, afirmam juristas consultados pela Gazeta do Povo. Segundo o advogado Flavio Pansieri, presidente da Academia Brasileira de Direito Constitucional, nem mesmo um plebiscito poderia extinguir o Senado pela legislação atual. "O artigo 60, parágrafo 4, da Constituição diz que Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado. Portanto, qualquer emenda constitucional que possa ameaçar a forma federativa, como a abolição do Senado, não é admitida", afirma.
O sistema bicameral é comum em países de proporções continentais que adotaram o sistema federativo, como o Brasil. "O raciocínio do bicameralismo é que a câmara baixa representa a população e a câmara alta no caso o Senado os estados de igual para igual", diz David Fleischer. Na Câmara, o número de deputados por estado é definido de acordo com o tamanho da população de cada ente federativo. Já no Senado, que tem como função básica ser uma câmara revisora, cada estado tem direito a ter três representantes, independentemente do número de habitantes.
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