Buenos Aires, Rio, Chapecó e Recife - As insinuações do pré-candidato tucano à Presidência, José Serra, de que o governo Boliviano poderia ser eventual cúmplice do tráfico de cocaína para o Brasil geraram um pequeno incidente diplomático. Na última quarta-feira, em evento no Rio de Janeiro, Serra disse que é impossível que as autoridades bolivianas não saibam do envio de grandes quantidades da droga para o Brasil. O Ministério das Relações Exteriores da Bolívia classificou de "irresponsáveis" e "político-eleitorais" as declarações do candidato do PSDB. O tucano fez as declarações sobre a Bolívia quando falava sobre a ideia de criar um Ministério da Segurança Pública caso ele seja eleito sucessor do presidente Lula.
"É um problema de bom senso. Você acha que poderia entrar toda essa cocaína no Brasil sem que o governo boliviano fizesse, pelo menos, corpo mole? Eu acho que não, disse Serra, que definiu a afirmação sobre a suposta conivência do governo do presidente Evo Morales com o tráfico de drogas como "uma análise": "Eu não fiz uma acusação.
Segundo a chancelaria boliviana, as declarações de Serra foram "desaprensivas" (palavra usada para definir algo irresponsável, imoral ou inescrupuloso), pois "fariam alusão a nosso país [a Bolívia] em relação ao tráfico ilegal de drogas". A chancelaria em La Paz também disse que as afirmações de Serra poderiam "ser atribuídas provavelmente à intenções político-eleitorais de absoluta incumbência de sua candidatura".
A nota ainda afirma que as afirmações não refletem a realidade. "O ministério das Relações Exteriores manifesta que os governos da Bolívia e do Brasil estão realizando ações conjuntas na luta contra o flagelo do narcotráfico, no marco da Segunda Estratégia de Cooperação entre a polícia da Bolívia e o Departamento da Polícia Federal do Brasil, conforme a responsabilidade compartilhada que existe neste assunto".
No comunicado, a chancelaria boliviana sustenta que o governo em La Paz "ratifica o compromisso assumido de luta contra o tráfico ilícito de drogas, o mesmo que se reflete através dos resultados obtidos, em coordenação com os organismos internacionais especializados no assunto".
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se encontrou ontem com o presidente boliviano Evo Morales. Os dois estiveram juntos durante o 3.º Fórum Mundial da Aliança de Civilizações, no saguão do Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro. O presidente Lula saiu abraçado ao boliviano Evo Morales e fez piada com Serra. "Vamos posar aqui; vamos fazer inveja no Serra", disse Lula ao colega, rindo bastante, em frente aos fotógrafos. De mãos dadas com o presidente do Brasil, Evo também riu, mas não comentou a declaração. Pouco depois, a entrevista coletiva de Morales, que estava agendada para as 16 horas, foi cancelada. Aos jornalistas, o boliviano se recusou a responder a perguntas.
Apesar das críticas do Ministério das Relações Exteriores da Bolívia e do silêncio do presidente boliviano, Serra voltou a afirmar ontem que o país vizinho poderia ser eventual cúmplice do tráfico de cocaína para o Brasil. Em Olinda, Serra reiterou que não é possível que a Bolívia exporte de 70% a 80% da cocaína que entra no Brasil sem que o governo boliviano "faça corpo mole". "O governo brasileiro deve pressionar o governo boliviano não pela força mas pela moral", disse.
Munição
A declaração polêmica de Serra serviu de munição para Dilma Rousseff, pré-candidata do PT a Presidência. Dilma voltou a comentar ontem a declaração do tucano. "O aspecto que eu chamo a atenção para que haja prudência, porque estadista não faz isso, é incriminar um governo. Isso é uma coisa diferente de dizer que da Bolívia vem droga. Dizer que da Bolívia vem droga é uma coisa, dizer que a responsabilidade é do governo [boliviano] é outra diferente.