Dallagnol e a pilha de documentos das investigações: o STJ "jogou no lixo" o trabalho| Foto: Marcelo Elias/Gazeta do Povo

Pelo menos 50 investigações do Ministério Público Federal (MPF) e da Polícia Federal (PF) serão interrompidas devido à decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que anulou, anteontem, as provas geradas por interceptações telefônicas no processo em que empresários do grupo Sundown foram condenados por corrupção. Para decretar a nulidade das provas colhidas por meio de grampos, o STJ alegou que o tempo em que as escutas foram realizadas – dois anos – desrespeitou a Lei 9.692/ 1996, que regulamenta as interceptações, prevendo período máximo de 30 dias para os grampos.

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Os inquéritos policiais que vão ser interrrompidos foram instaurados após a operação policial que, em junho de 2006, resultou na prisão de Izidoro e Rolando Rozenblum – donos do grupo Sundown. Essas investigações, que ainda estão em curso, apuram a suspeita de crime de corrupção ativa e passiva no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e de um servidor da Justiça Estadual do Paraná – todas envolvendo os empresários Rozenblum. Além desses, um outro inquérito apurava o suposto crime contra a administração pública por parte de um servidor do Banco Central (BC).

Mas essas investigações, bem como dezenas de outras, devem ser simplesmente interrompidas. E o que foi apurado até agora terá de ser anulado, diz o procurador da República no Paraná Deltan Martinazzo Dallagnol. Segundo ele, quase todos os inquéritos foram instaurados basicamente com base nos grampos, autorizados pelo Judiciário, durante a investigação do caso Sundown.

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"Todas essas investigações vão cair depois da decisão do STJ, que jogou no lixo todo o nosso trabalho para fundamentar as denúncias apresentadas e que já tinham sido aceitas pela Justiça (nas primeiras e segundas instâncias)", afirma Dallagnol. O procurador Orlando Martello Júnior, que ao lado de Dallagnol se debruçou por mais de dez anos no caso Sundown e suas ramificações, alega que se as interceptações durassem apenas 30 dias, como diz a lei, o MPF não denunciaria de forma tão bem fundamentada os empresários. "Após toda a investigação, os empresários foram acusados de mais de 245 crimes", diz ele. Martello afirma que as escutas, mesmo longas, foram importantes porque em média era descoberto um crime a cada três dias de grampo. "Mantendo essa média, com apenas 30 dias de interceptações (limite previsto pela lei), os empresários se livrariam da acusação de 235 crimes."

O que preocupa os procuradores é a situação de dois auditores da Receita Federal, flagrados nas interceptações, que receberam propina de Izidoro e Rolando Rozenblum. "Alguém acha que esses auditores falam abertamente por telefone? Eles usam codinomes e falam em códigos. Só pegamos os auditores depois de ouvir muitas horas de gravação. Se as escutas fossem de apenas 30 dias, eles hoje estariam com certeza trabalhando na Receita", conta Dallagnol. Os auditores foram denunciados e condenados pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) pelo crime de corrupção.

O MPF não tem como recorrer da decisão do STJ. "Podemos apenas aceitar e nada mais", lamenta Martello. Devido à decisão de anteontem sobre os grampos, todos os processos, fruto da investigação da Sundown, agora serão remetidos do TRF4 para a Justiça Federal do Paraná, que vai dar vistas ao MPF. Caberá à Justiça Federal decidir sobre a validade das provas diante da decisão do STJ. O MPF pretende validar pelo menos algumas provas que não foram embasadas somente em escutas.