Brasília - O Plano Nacional de Direitos Humanos publicado no fim do ano passado e que levou o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e os comandantes militares a colocarem os cargos à disposição do presidente Lula gerou ontem a reação de outro setor: o do agronegócio. A presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), senadora Kátia Abreu (DEM-TO), afirmou que o decreto trata os agricultores de forma preconceituosa e indica que o governo discute direitos humanos de forma ideológica. Um dos trechos do decreto que ela apontou para embasar a crítica refere-se ao modo de produção na agricultura que, de acordo com o decreto, não contribui para a distribuição "justa de renda e riqueza". Outro ponto criticado pela senadora propõe regulamentar o cumprimento de mandados de reintegração de posse concedidos pela Justiça a proprietários de terra.
O decreto sugere que, antes da análise dos pedidos de liminares pelos juízes, sejam feitas audiências públicas na tentativa de mediar os conflitos. "Isso é o mesmo que descumprir uma decisão judicial", afirmou. "O governo está praticamente estimulando a invasão de terras e a violência no campo. Diz-se para o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) que suas ações são legítimas", acrescentou.
A Secretaria Especial de Direitos Humanos divulgou uma nota à imprensa contestando as críticas de Kátia Abreu. Segundo a secretaria, o plano é resultado de um amplo e longo debate com a participação da sociedade e atende às demandas de vários segmentos, inclusive o setor do agronegócio
Apoio
O Programa Nacional de Direitos Humanos também recebeu manifestações de apoio ontem. A Comissão de Direitos Humanos divulgou nota defendendo a criação da Comissão da Verdade prevista no plano e um dos principais focos de crítica dos militares , que tem o objetivo de apurar torturas e desaparecimentos durante o regime militar (1964-1985).
A nota, assinada pelo presidente em exercício da comissão, o deputado Pedro Wilson (PT-GO), lembra que a mesma proposta foi feita em outros países. "A Justiça não pode prescindir da verdade histórica e da necessidade de apurar as responsabilidades por crimes e violações de direitos cometidas contra quem ousou enfrentar um regime autocrático", afirma o deputado na nota.
O Movimento Nacional de Direitos Humanos também divulgou ontem um manifesto em que se coloca favorável à criação da comissão. No documento, o movimento colocou seu repúdio às recentes manifestações dos chefes das Forças Armadas e do ministro Jobim contra a comissão. Para o movimento, que agrega cerca de 400 entidades de todo o Brasil, "a reação dos militares e do Ministério da Defesa não são bem-vindas e contrastam com os compromissos constitucionais e internacionais com os direitos humanos assumidos pelo Brasil".
Arquivos
O presidente da OAB, Cezar Britto, defendeu ontem que o Brasil siga o exemplo da Argentina e abra os arquivos do período da ditadura militar. A discussão sobre a abertura dos arquivos cresceu com a polêmica sobre a criação da Comissão da Verdade.
Em nota, o presidente da OAB elogiou a decisão da presidente Cristina Kirchner de abrir os arquivos confidenciais do período da ditadura no país (1976-1983). "(A Argentina) deve servir de exemplo a todos aqueles que defendem a democracia e o direito à memória e à história. A OAB espera que o Brasil siga corajosamente o exemplo da Argentina", disse em nota.