Outro lado
Prefeitos dizem que só querem igualdade em relação ao estado
Em busca de um consenso, o presidente da Assembleia, Valdir Rossoni, se encontra hoje com representantes do TC para discutir o projeto de lei. Ele irá apresentar um levantamento formulado pela Associação de Municípios do Paraná (AMP), que aponta que 145 dos 399 municípios do estado (36% do total) tiveram prestações de contas reprovadas pelo TC de setembro de 2013 até agora. As multas também teriam aumentado expressivamente nos últimos anos. Dados do TC atestam que a aplicação de sanções, somadas, passou de pouco mais de R$ 50 mil em 2011 para mais de R$ 600 mil só no 1º quadrimestre deste ano. De acordo com a AMP, os prefeitos não estariam conseguindo pagar as multas. Eles alegam ainda que a maioria das punições seria motivada por erros burocráticos, ou seja, que não geraram desvio de recursos. A justificativa do projeto diz que o TC não teria competência para criar leis e normas de procedimento administrativo. O presidente da AMP, Luiz Sorvos, garante que os prefeitos não querem limitar a atuação do TC, mas buscar igualdade. "A fiscalização não seria prejudicada de maneira nenhuma. Só entendemos que haverá critérios mais consistentes de se fiscalizar", afirma. O projeto de lei foi formulado por um estudo jurídico de técnicos da AMP, de um consultor externo e de assessores jurídicos da própria Assembleia.
O presidente da Assembleia Legislativa do Paraná, Valdir Rossoni (PSDB), decide hoje se colocará em tramitação o projeto que altera a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Paraná (TC). A proposta é polêmica porque enfraqueceria e imporia limites ao poder do TC responsável por fiscalizar as contas do governo do estado, prefeituras e câmaras municipais. Embora o projeto seja defendido pelos prefeitos, que alegam que o TC exagera nas punições aos gestores das cidades, na prática o projeto também reduz os poderes de fiscalização sobre todos os demais órgãos estaduais e municipais, como o governo paranaense.
INFOGRÁFICO: Veja os principais pontos do projeto de lei do Tribunal de Contas
Dentre as mudanças que podem vir a ocorrer se o projeto for aprovado, está a proibição de o TC decretar a ilegalidade de legislações municipais e estaduais. Também estariam liberados gastos públicos desnecessários, desde que não sejam ilegais. Haveria ainda uma expressiva redução do valor das multas impostas aos maus gestores públicos: hoje o valor varia de 10% a 30% do dano causado aos cofres públicos; passaria a ser de apenas 5%.
O enfraquecimento do poder de fiscalização pode ocorrer principalmente porque o projeto estipula que as normas e procedimentos internos do TC perderiam validade , fazendo que com as ações do tribunal ficassem limitadas apenas ao que já está previsto em leis federais ou estaduais. O problema é que parte expressiva dos procedimentos de fiscalização usados pelo TC atualmente estão previstos apenas em resoluções do próprio tribunal, no regimento interno e nos chamados prejulgados (decisões já tomadas que norteiam o julgamento de casos posteriores semelhantes).
O professor de Direito Constitucional da UFPR Egon Bockmann lembra que o Tribunal de Contas da União (TCU) toma decisões baseado no regimento. Ele ainda comenta uma situação que pode vir a ocorrer no TC: para tomar determinada ação que não esteja prevista na lei, o tribunal teria que elaborar um projeto de lei, enviar para a Assembleia e então aguardar aprovação dos deputados e a sanção do governador. "A questão é que, dependendo do teor do regimento interno, pode complicar a vida daqueles que vão ser objeto de controle por parte do TC. Mas se há abusos no regimento, nada impede que se recorra ao Judiciário para questionar", diz.
Para Rodrigo Kanayama, especialista em Direito Financeiro, a redação de alguns pontos do projeto é inadequada e abriria margem para interpretações. Ele aponta que a perda de validade dos prejulgados é temerária. "Qualquer alteração que tenda a reduzir a fiscalização não é adequada."
"Abusos"
A Associação de Municípios do Paraná (AMP), principal articuladora do projeto de lei, argumenta que as mudanças serviriam para corrigir supostos "abusos" cometidos pelo TC na aplicação de sanções a cidades do estado. A ideia, de acordo com a AMP, seria garantir o "mesmo tratamento" no julgamento de contas de prefeituras e do governo estadual (que nunca teve as contas reprovadas), além de evitar que o tribunal aplicasse multas pesadas em casos de problemas técnicos nas prestações de contas, que não tenham sido cometidos por má-fé dos prefeitos. O projeto articulado pela AMP deve ser apresentado na Assembleia pelo deputado Ademir Bier (PMDB).
Tribunal investiga autores do projeto
Três pessoas envolvidas na elaboração do projeto de lei que limita os poderes do Tribunal de Contas estão sendo investigadas pelo TC. Luiz Sorvos, presidente da Associação dos Municípios do Paraná (AMP), é investigado por nomear a mulher, Ângela Silvana Zalpa, como controladora interna de Nova Olímpia, município em que ele é prefeito. Na última sexta-feira, o tribunal anunciou que também vai investigar Sorvos por licitações municipais vencidas por parentes dele. Um primo de Sorvos, dono de posto de gasolina, teria vencido licitação de R$ 850 mil para fornecer combustíveis para a prefeitura. Um cunhado e uma tia dele teriam vencido processo para prestar serviços médicos. Por fim, Ângela teria assinado cheques da prefeitura no lugar do marido, o que é considerado irregular pelo TC.
Sorvos não nega as acusações, mas diz que foram motivadas por revanchismo. "Ela [Ângela] assinou [os cheques] no passado, quando o cargo não era incompatível. Ela esteve comigo durante meu mandato, teve época em que era minha procuradora, então assinava. Aliás, eu preciso de gente de confiança", diz. "Tem mesmo minha prima lá, porque é médica. É difícil conseguir médico para ir lá. Ela está prestando serviço direito. O posto de gasolina participou de licitação. Tem preço, está prestando serviço: qual é o problema? Me atacando talvez eles tirem o foco do projeto de lei. Mas é meu 4.º mandato e minhas contas sempre são aprovadas pelo TC."
O assessor jurídico da AMP, Júlio Henrichs, tem empresas que prestam serviços jurídicos para 63 prefeituras. Os contratos somam R$ 16,9 milhões, dos quais pouco mais de R$ 9 milhões já teriam sido pagos, segundo o TC. E o consultor Marcos Eloi Kraft, que participou da elaboração do projeto de lei, tem contratos de assessoria com pelo menos 12 municípios, somando R$ 3,6 milhões. A prestação desses serviços é considerada irregular segundo um prejulgado do TC que perderia eficácia caso seja aprovada a lei.
Henrichs diz que os serviços são regulares e não se enquadram no prejulgado por tratarem de questões complexas. Segundo ele, só um dos contratos foi reprovado pelo TC. A regularidade, diz Henrichs, já teria sido atestada pelo Tribunal de Justiça e pelo Ministério Público. Já Kraft nega ter qualquer tipo de interesse pessoal no projeto. "A minha participação na elaboração do projeto não tem nada a ver com a elaboração dos contratos. O prejulgado fala sobre empresas responsáveis pela contabilidade e representação na esfera judicial. Eu apenas assessoro a elaboração de orçamentos."
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