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Como fiscalizar os recursos públicos para que os deputados não paguem por matérias favoráveis?
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Deputados estaduais do Paraná usam parte de sua verba de gabinete, paga pelo contribuinte, para se promover em veículos de comunicação. No primeiro semestre de 2013, 12 realizaram pagamentos mensais a veículos de comunicação acima dos R$ 1 mil. Os parlamentares alegam não infringir a lei, mas, em alguns casos, é nítido que os mesmos veículos que recebem publicidade dos gabinetes promovem os deputados com matérias favoráveis em seus jornais.
INFOGRÁFICO: Confira os gastos dos deputados com divulgação
As maiores notas foram pagas pelo deputado Jonas Guimarães (PMDB) ao jornal Folha Regional de Cianorte. Ele fez cinco pagamentos mensais ao jornal no primeiro semestre de 2013, variando entre R$ 8,7 mil e R$ 8,8 mil. A direção do jornal alega que todos os pagamentos são feitos para a publicação de propagandas do deputado. A reportagem procurou o parlamentar, mas não teve resposta.
A Gazeta do Povo teve acesso a uma amostra de exemplares do jornal e verificou apenas uma peça publicitária do deputado que parabenizava a cidade pelo seu aniversário. As matérias elogiosas e de duvidosa relevância, por outro lado, aparecem em quase todas as edições.
Uma delas, particularmente curiosa, mostra Jonas prestigiando o aniversário do governador Beto Richa (PSDB), com uma foto em que aparecem os dois cantando sobre um palco. Outras edições apresentam fotos do deputado na capa mesmo quando o assunto não é relacionado com suas atividades, como a redução do preço das passagens de ônibus em Cianorte e a cobertura de um rodeio em São Tomé. Desde o início da legislatura, o deputado já gastou R$ 152,6 mil com esse jornal.
O deputado Nelson Justus (DEM) também faz periodicamente pagamentos, de R$ 2,6 mil a R$ 5,2 mil, ao jornal Tribuna do Norte, de Apucarana. O diretor do jornal, Baltazar Eustáquio de Oliveira, diz que o valor se refere à compra de espaço de divulgação de mensagens de felicitações.
"Ele é da região, foi o deputado mais votado em Apucarana, e compra espaço. Quando tem aniversário de alguma cidade, ele dá parabéns", diz. Ele admite publicar releases do deputado, mas apenas quando há relevância jornalística. O deputado pagava anúncios no jornal desde 2011, somando um total de R$ 59,7 mil. A reportagem procurou o deputado, que não respondeu.
Matérias pagas
Já o deputado Duílio Genari (PP) fez quatro pagamentos mensais de R$ 2,1 mil ao Jornal do Oeste, de Toledo. Ele admite que paga o jornal para "acompanhar seus atos como deputado" e que pagou por matérias sobre suas atividades. Ele ressalta, entretanto, que todos os pagamentos foram feitos dentro da lei.
A direção do veículo, entretanto, negou que se tratem de matérias pagas. De acordo com Armando Manfroi, dono do jornal, os gastos se referem a publicações de mensagens em datas especiais como o Dia das Mães. O jornal publica farto material produzido pela assessoria do deputado, mas Manfroi nega que os textos sejam pagos. "Nós publicamos matérias do deputado sem custos." Desde o início do mandato, o jornal já recebeu R$ 33,6 mil.
Lei permite notícias sobre o mandato, mas veda autopromoção
Os gastos dos deputados em veículos de comunicação estão no limite da legalidade e da ética. A promoção pessoal de agentes públicos com recursos públicos é vedada pela Constituição, e a compra e venda de matérias é uma infração gravíssima ao código de ética do jornalismo. Ainda assim, existe uma previsão legal para o gasto com a divulgação do mandato, e a fiscalização desses gastos não é adequada.
Para o professor de Direito Constitucional da UFPR Egon Bockmann, os gastos com divulgação no poder Legislativo deveriam servir apenas para divulgar as ações realizadas pela Assembleia. "Em tese, essa verba é para divulgar ao público o resultado das ações do Poder Legislativo. Não há de ser uma verba que seja um financiamento de uma campanha permanente", afirma.
Sendo assim, já é possível considerar no mínimo questionável o gasto de dinheiro público para atos publicitários como notas de felicitação de um determinado deputado a um município que faz aniversário. Esse tipo de gasto não tem qualquer utilidade prática para a população como poderia ter, por exemplo, um panfleto mostrando os projetos de lei e outras atividades do deputado e serve apenas para promover a imagem do parlamentar.
Mais grave, entretanto, seria o uso dessa verba diretamente para a compra de matérias e de apoio político em geral. Para Bockmann, isso poderia configurar, inclusive, improbidade administrativa. Na prática, fazer essa relação é mais difícil. É possível ver indícios claros da compra de apoio, principalmente pela absoluta falta de relevância de certas matérias e nítido favorecimento editorial desses veículos aos deputados-clientes. No entanto, essa relação fica mascarada pela compra de espaço publicitário.
Campanha antecipada
Na visão de Bockmann, o gasto desses deputados com publicidade, se levados ao pé da letra, poderiam ser interpretados como campanha antecipada. O advogado eleitoral Guilherme Gonçalves, ex-presidente do Instituto Paranaense de Direito Eleitoral, discorda. De acordo com ele, a lei eleitoral especifica que a campanha antecipada ocorre somente quando há um pedido explícito de votos.
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