Líderes partidários do Congresso estudam retirar a urgência do projeto de lei de iniciativa popular derivado da campanha ‘Dez Medidas Contra o Corrupção’. Parte dos deputados considera que alguns pontos da proposta precisam ser melhor debatidos. Além disso, a retirada da urgência destravaria a pauta de votações da Câmara. Membros do Ministério Público Federal (MPF) consideram preocupante essa mudança na tramitação da iniciativa.
O projeto, elaborado por procuradores e promotores do MPF e assinado por mais de 2 milhões de eleitores, tramita na Câmara desde o dia 30 de março em regime de urgência. O prazo para que a proposta seja votada em plenário se extinguiu na última terça-feira (28) – como o Congresso vive um “recesso branco” por causa das comemorações de São João, a proposta passaria a trancar a pauta a partir do reinício dos trabalhos.
Entretanto, pela leitura dos deputados, ainda há dúvidas e falta consenso sobre diversos pontos do projeto – que possui 67 artigos. Entre os pontos polêmicos, por exemplo, está a possibilidade de cassação de registro de partidos envolvidos em esquema de corrupção. Por isso, seria difícil votar a proposta nessas condições – vale lembrar que o afastamento do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e polêmicas posteriores ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) paralisaram as atividades da Câmara por boa parte desse período.
Além disso, segundo o jornal Folha de S. Paulo, há o temor, por parte do presidente interino Michel Temer (PMDB), que a proposta tranque a pauta e, sem consenso, impeça a votação de propostas consideradas importantes pelo governo. Por meio da assessoria de imprensa, o líder do governo, André Moura (PSC-SE), negou que o Planalto tenha se manifestado sobre o assunto. De acordo com ele, trata-se de uma discussão interna dos líderes da Câmara.
“Respirando por aparelhos”
O procurador do MPF Diogo Castor de Mattos, integrante da força-tarefa da Operação Lava Jato, vê com preocupação a retirada do regime de urgência dos projetos de combate à corrupção. “O processo penal brasileiro está no leito de morte, está respirando por aparelhos. Então há uma urgência muito grande em aprovar essas medidas, principalmente para aproveitar esse momento de apoio das ruas para essa finalidade [o combate à corrupção].”
Segundo ele, a Lava Jato um dia vai acabar e a “janela de oportunidade” para aprovar medidas anticorrupção pode se fechar. Mattos considera que a retirada do pedido de urgência é uma “manobra” para adiar a discussão dos projetos nesse momento de pressão popular pela aprovação das medidas.
O procurador diz ainda que há propostas dentro do pacote anticorrupção que “não têm nem o que discutir”, tais como a criminalização do enriquecimento ilícito e a transformação da corrupção em crime hediondo. “São propostas que já tramitam há muito tempo no Congresso.” Ele ainda destaca que os projetos das ‘Dez Medidas Contra a Corrupção’ foram fruto de dois anos de discussão com a sociedade.
Mattos também destaca que, em paralelo ao adiamento da discussão das ‘dez medidas’ no Congresso, existe pressão de parlamentares para colocar em votação projetos que vão dificultar o combate à corrupção. É o caso, diz ele, da proposta para proibir delações premiadas firmadas por pessoas que estejam presas e do projeto que restabelece a detenção de condenados apenas com o julgamento em última instância (decisão recente do Supremo Tribunal Federal determinou que sentenças de segundo grau já são suficientes para determinar o cumprimento da pena em regime fechado).
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
Quem são os indiciados pela Polícia Federal por tentativa de golpe de Estado
Bolsonaro indiciado, a Operação Contragolpe e o debate da anistia; ouça o podcast
Seis problemas jurídicos da operação “Contragolpe”
Deixe sua opinião