Entenda o caso
O passo a passo da licitação para a reforma da sede do TJ:
O Tribunal de Justiça do Paraná selecionou, por concorrência, uma empresa para realizar o projeto da obra de reforma de sua sede, o Palácio da Justiça, no Centro Cívico, em Curitiba.
A Sobe Serviços, Obras e Empreendimentos, ao custo de R$ 537 mil, ficou responsável pelo projeto.
O projeto feito pela Sobe definiu os moldes do edital de licitação para a escolha da empresa que irá executar a reforma, orçada no valor máximo de R$ 79,6 milhões.
O processo de licitação foi aberto em 5 de setembro. Os detalhes do projeto estavam disponíveis apenas para quem se cadastrasse no site do TJ e pagasse uma taxa de R$ 10.
Durante licença do então presidente do TJ Clayton Camargo, o desembargador Paulo Vasconcelos assumiu interinamente o comando do tribunal. Em meados de setembro, Vasconcelos determinou a suspensão do processo de licitação para a reforma do prédio.
Em 23 de setembro, já após retornar ao cargo de presidente, Camargo revogou a decisão de Vasconcelos e retomou o processo de escolha da empresa para a escolha da empreiteira. Foi um de seus últimos atos no comando do tribunal, pois pediu aposentadoria e, depois, renunciou à presidência.
A decisão de Camargo sobre a licitação foi levada ao Órgão Especial, colegiado formado por 25 desembargadores. O Órgão referendou a retomada da licitação.
Mesmo formalmente em andamento, o processo licitatório está sendo reanalisado por técnicos do TJ.
Histórico
Não é a primeira vez que uma obra do Judiciário paranaense está envolvida em polêmicas.
O Anexo
A construção do Anexo do Palácio da Justiça, prédio hoje ocupado pelos desembargadores, foi alvo de suspeita de superfaturamento e licitação dirigida. Em 2005, o gasto de R$ 48 milhões com a obra foi contestado pelo Tribunal de Contas e pela comissão de obras do Tribunal de Justiça. As investigações sobre a obras foram arquivadas pelo TJ. O caso foi remetido ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que em 2011 entendeu que não houve irregularidades.
Novo Fórum Cível
No fim do ano passado, o CNJ determinou que fosse interrompida a construção do novo Fórum Cível de Curitiba, na área do antigo presídio do Ahú. A suspeita é de favorecimento na licitação. O caso ia ser julgado na última sessão do CNJ, na segunda-feira passada. Mas foi adiado para a próxima reunião dos conselheiros.
Documentos obtidos pela Gazeta do Povo mostram que o ex-presidente do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) Clayton Camargo ignorou pareceres do corpo técnico do Departamento de Engenharia e Arquitetura (DEA) do próprio TJ durante a formatação da licitação da reforma do Palácio da Justiça sede do Judiciário estadual, no Centro Cívico, em Curitiba. O ex-diretor do DEA Raul Baglioli Filho também não levou em conta os mesmos pareceres. O valor máximo previsto para a obra é de R$ 79,6 milhões.
As ponderações do DEA estão focadas basicamente nas vantagens de um sistema de ar condicionado conhecido como Fluxo Refrigerante Variável (VRF) em relação a outro modelo, o Água Gelada Chiller de Mancal Magnético Condensação a Ar. O primeiro sistema é o que aparece nos trâmites iniciais da modelagem da licitação. O Protocolo n.º 39.862/2013, de fevereiro deste ano, traz o sistema VRF como aquele que viria a ser utilizado na readequação do prédio.
O VRF seguiu como sistema preferencial até 26 de julho. Nessa data, ofício de Camargo a Baglioli "determina a adoção das providências necessárias à instauração do procedimento licitatório para execução da referida obra". No dia seguinte, a Sobe Engenharia, empresa licitada para realizar o projeto da reforma, propôs a troca do sistema VRF pelo Chiller.
A partir daí, iniciou-se uma disputa técnica entre a Sobe e o corpo técnico do próprio TJ. Pareceres assinados por técnicos do tribunal apontam problemas nas análises da Sobe. "Cabe ressaltar que não foram apresentados os projetos do sistema proposto e na planilha de orçamento os itens são agrupados em sistemas não havendo descrição detalhada dos itens. Este formato é inadequado para uma licitação por preço unitário e impede a análise dos valores considerados", diz um trecho do Parecer 0691/2013, de 2 de julho.
Em 7 de agosto, diante das respostas tidas como insuficientes, a assessoria jurídica do DEA considerava o serviço da Sobe como "não realizado". A empresa enviou seu laudo técnico ao TJ, no qual explicava sua preferência pelo sistema Chiller. "O melhor sistema, em analisando o projeto de retrofit [reforma] e ampliação do Palácio da Justiça, é o sistema de água gelada Chiller Mancais Magnéticos, pois tem custo operacional anual menor em 16%".
A análise da Sobe convenceu a cúpula do TJ, que, em 14 de agosto, referendou o novo sistema. Ainda assim, não havia um entendimento com os técnicos do DEA. Um dia depois, outro parecer do departamento trazia conclusão diferente: " (...) verifica-se que o sistema VRF tem um custo de operação anual de R$ 289.558,17 a menos que o sistema de água gelada. Além disso, o sistema VRF tem um custo de instalação de aproximadamente R$ 858.127,27 a menos".
Outras divergências
Esse não foi o único apontamento interno do TJ. Um relatório de auditoria interna do Núcleo de Controle Interno do TJ estabelece a necessidade de apontar um BDI [Benefícios e Despesas Indiretas, mecanismo pelo qual se calcula a remuneração da empresa em obras públicas] diferente para a aquisição do ar-condicionado nas obras.
"Verificou-se que nas obras auditadas o BDI é aplicado de forma linear para todos os itens da proposta, sem diferenciação para itens de fornecimento de equipamentos (ex: ar condicionado, elevador, etc), os quais são geralmente fornecidos e instalados por empresas especializadas (subcontratadas). Desta forma o preço final acaba agravando pela dupla incidência de BDI, pois a efetiva executora do serviço (subcontratada) cobra pelo preço global de material e demais custos, e a contratada pela administração aplica sobre este valor o porcentual linear do BDI apontado na proposta", diz o texto.
Apesar do apontamento, a presidência do TJ estabeleceu um BDI linear de 25,65% em todos os itens da planilha de orçamento.
Suspensão
O presidente em exercício do TJ, desembargador Paulo Vasconcelos, chegou a revogar a licitação quando ocupou a presidência na ausência de Clayton Camargo. Vasconcelos levou ao DEA um questionamento levantado pelo advogado Roger Santos Ferreira, para quem havia problemas na trâmite no edital e impedimentos à concorrência. O DEA considerou os argumentos pertinentes e o desembargador cancelou a licitação. "Vários itens estavam irregulares", diz Vasconcelos, ressaltando que não identificou má fé no edital. "A ideia é que o que está errado deve ser corrigido." Na sequência, ao voltar ao cargo e antes de se aposentar, Camargo retomou a licitação, com o aval do Órgão Especial do TJ.
Ar-condicionado escolhido tem prós e contras
Especialista ouvido pela Gazeta do Povo afirma que os dois sistemas de ar condicionado que causaram as divergências dentro do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) são usados com frequência em grandes obras. "As vendas são bastante semelhantes entre eles", diz o engenheiro Oswaldo Bueno, diretor do Departamento Nacional de Empresas Projetistas e Consultores (DNPC) e membro da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava).
Segundo Bueno, os dois sistemas têm algumas divergências técnicas em relação ao modelo de refrigeração e aquecimento utilizado. Na prática, o Sistema Fluxo Refrigerante Variável (VRF) permite uma maior independência de andar por andar. "Um pequeno controle remoto permite o ajuste do ar-condicionado", diz Bueno. Na comparação, o sistema Água Gelada Chiller de Mancal Magnético Condensação a Ar escolhido pelo TJ deixaria cada andar com menos autonomia. "Fica mais na mão de um administrador do prédio." A favor do Chiller está a melhor capacidade de promover a renovação do ar e umidificar o ambiente.
Em relação ao custo, o engenheiro diz que o preço varia de obra para obra. Mas, como regra geral, o VRF costuma ser mais caro na hora da instalação. "O problema é que o mancal magnético traz um refinamento técnico e encarece a instalação. No fim das contas, o VRF compensa mais no longo prazo. Tem custos menores de manutenção e despesas com energia."
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