O que se percebe nessa disputa é que hoje o Eduardo[Cunha] tem um poder que o Renan [Calheiros] não tem, que é respaldo de uma lealdade maior da bancada.
Estratégia
“O que o PMDB faz é usar das divergências internas para criar dificuldades e vender facilidades”, avalia o líder da oposição no Senado, Alvaro Dias (PSDB). Para ele, que deixou o PMDB em 1989, esse é um jogo que interessa ao governo. “O que importa é o número de votos que o partido reúne.” O PMDB tem atualmente as maiores bancadas do Senado (18 cadeiras) e da Câmara (67).
A inversão da máxima de que “a união faz a força” tornou o PMDB o dono do jogo político nacional. Dividido entre dezenas de oligarquias estaduais e, recentemente, três forças nacionais – o vice-presidente Michel Temer e os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha – o partido usa as diferentes facções para manter o governo Dilma Rousseff encurralado. Nas últimas semanas, contudo, a estratégia da cisão passou a ser ameaçada pela competição interna.
Renan e Cunha tornaram públicos desentendimentos que chegaram ao auge no debate sobre o projeto de regulamentação da terceirização. Aprovado na Câmara graças ao empenho pessoal de Cunha, o texto começou a tramitar na semana passada no Senado em “marcha lenta”, graças a Renan. A proposta, descrita pelo senador como uma “pedalada nos direitos dos trabalhadores”, vai precisar tramitar em quatro comissões antes de chegar ao plenário, contrariando expectativas de um regime de urgência.
Na segunda-feira (27), um grupo de senadores governistas, incluindo peemedebistas, começou a se articular para “desmontar” as propostas de interesse de Cunha que chegassem à Casa. O foco são os projetos de cunho conservador, como a redução da maioridade penal e mudanças no estatuto do desarmamento. Do outro lado, o presidente da Câmara já havia indicado que usaria do mesmo expediente para barrar projetos de senadores.
“O que se percebe nessa disputa é que hoje o Eduardo tem um poder que o Renan não tem, que é respaldo de uma lealdade maior da bancada”, diz o deputado federal João Arruda (PMDB-PR). Todos os quatro deputados peemedebistas do Paraná, por exemplo, são seguidores fieis de Cunha – mesmo que tenham jogado contra ele em disputas anteriores pela liderança do partido.
Como pano de fundo, ambos os presidentes do Legislativo passam pelo constrangimento de estar entre os denunciados pela Procuradoria-Geral da República ao Supremo Tribunal Federal por envolvimento na Lava Jato. Outro ingrediente é a briga pessoal por cargos. Nessa questão entra Temer.
Mais um cacique
O vice-presidente, que havia perdido espaço com a ascensão dos dois parlamentares, voltou a ser protagonista ao ser designado por Dilma para assumir a articulação política do governo. Temer tem sido o mediador histórico na concorrência por postos no Executivo travada pelo PMDB do Senado e da Câmara. Passou por ele a nomeação do ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves para o Ministério do Turismo, o que desalojou Vinícius Alves, aliado de Renan.
Para apaziguar os ânimos, o governo indicou Jorge Bastos, apadrinhado de Renan, para a Agência Nacional de Transportes Terrestres. Os senadores do partido terão direito a outras indicações em agências reguladoras, enquanto os deputados com outras “joias” do segundo escalão, como a direção do Departamento Nacional de Obras contra a Seca (sempre cobiçada por parlamentares do Nordeste) e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte. A tendência é que essas indicações caibam a lideranças estaduais.
Na quinta-feira (30), porém, Renan decidiu atirar contra Temer. “O PMDB não pode transformar a coordenação política em uma articulação de RH para distribuir cargos e boquinhas”, declarou. O vice presidente retrucou logo depois e disse que o país precisa de políticos “à altura dos seus desafios”.
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