Há tempos PT e PMDB são como um casal em crise que dorme em quartos separados. A metáfora usada na última quinta-feira (16) pelo presidente da Câmara dos Deputados, o peemedebista Eduardo Cunha, expunha um relacionamento difícil, mas que poderia ter uma saída. Esperança que implodiu, graças ao próprio Cunha, um dia depois.
Acuado pela denúncia do empreiteiro Júlio Camargo de que teria cobrado US$ 5 milhões de propina relacionada a contratos com a Petrobras, ele formalizou na sexta-feira (17) o rompimento com o governo Dilma Rousseff (PT) . E o ambiente entre o Legislativo e o Executivo ficou pesado como há muito não se via.
Nunca antes na história do país, os presidentes da República, da Câmara e do Senado correm risco simultâneo de perder o cargo em meio a suspeitas de envolvimento em corrupção. Para se salvar, Cunha e o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) preparam um cenário de “guerra total” contra Dilma. Os dois atribuem ao Planalto as acusações contra eles, pois entendem que a estratégia do PT seria tentar desviar o foco da Lava Jato do governo para o Congresso.
A gente poderia estar discutindo uma pauta para o bem do país, mas tudo vai ficar paralisado por esse confronto.
Entre o baixo e o alto clero das Casas, há certeza de que a vida política do país vai parar durante o conflito. “Em tempos de crise econômica, a gente poderia estar discutindo uma extensa pauta para o bem do país no segundo semestre, mas o fato é que tudo vai ficar paralisado por esse confronto”, prevê o deputado Roberto Freire, presidente nacional do PPS.
Fora do Congresso, um relatório da agência de classificação de risco Moody’s foi além e citou, no final da semana passada, que a batalha política vai produzir efeitos até meados de 2016. Segundo o estudo, “investigações de corrupção pressionaram significativamente a economia brasileira, arrastando os setores de engenharia e construção e energia, consequentemente afetando também as indústrias de aço e materiais de construção”.
É justamente no campo econômico que a dupla Cunha e Renan têm mais armas para atingir Dilma. Três propostas fundamentais para as contas do governo dependem da aprovação da Câmara e do Senado. A primeira é o projeto de lei (PL) que reduz a desoneração da folha de salários, último dos textos do ajuste fiscal montado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Cunha, aprendiz de ditador
Causou espanto o anúncio feito nesta sexta-feira (17) pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, de rompimento com o governo federal. Quer dizer que antes ele estava alinhado com o Planalto?Se o primeiro semestre gerou desapontamento entre os que torcem para o Brasil, as perspectivas para os próximos meses são sombrias.
Leia a matéria completaA segunda, que também tramita no Senado, é o PL que regulariza a situação de brasileiros com dinheiro no exterior. Juntas, as duas propostas gerariam uma receita de até R$ 27 bilhões para o governo. Por último, há a proposta de emenda à Constituição que prorroga a Desvinculação das Receitas da União (DRU), dispositivo que permite à União gastar livremente parte das receitas de contribuições sociais, até 2023.
No campo do debate sobre corrupção, Renan e Cunha atuaram para a instalação de novas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI). Na quinta-feira, o senador sinalizou a criação de CPIs para apurar desvios nos fundos de pensão ligados ao governo e em empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). No dia seguinte, Cunha criou comissões sobre os mesmos temas na Câmara.
“Pode parecer que não tem tanto peso, mas CPI tem aquela coisa de que todo mundo sabe como começa, mas não como acaba”, lembra o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), que foi relator da CPI dos Correios, que investigou o mensalão.
Do outro lado, Dilma ganhou mais munição para enfrentar Cunha depois dos desdobramentos da Lava Jato. “A base que sustenta o Eduardo Cunha não é baseada em adoração à figura dele. Os deputados seguem o poder que ele tem e, se esse poder diminui com essas novas denúncias, essa base também diminui”, diz o paranaense Ênio Verri (PT), que fez campanha contra o peemedebista na disputa pela presidência da Câmara.
Para emparedar Cunha, Dilma poderia cortar cargos e emendas de bancada de parceiros do deputado. Além disso, estimular dissidentes de Cunha dentro do próprio PMDB para isolá-lo e partir para o um vale-tudo “ético” perante a opinião pública. Apesar das denúncias de que dinheiro desviado da Petrobras foram utilizados na campanha da petista, não há citações de que ela teria tirado proveito particular dos recursos.
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