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Souza, ex-procurador da República: caso do mensalão deve ser julgado em dois ou três anos | Wenderson Araújo
Souza, ex-procurador da República: caso do mensalão deve ser julgado em dois ou três anos| Foto: Wenderson Araújo

Ao longo de quatro anos no cargo de procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza propôs 130 ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) e 141 inquéritos, o triplo da média de seus antecessores, sem contar os mais de 5 mil pareceres. Apesar do volume de trabalho, o que lhe deu notoriedade foi investigar o caso do mensalão, uma suposta "mesada" paga a deputados federais para votarem a favor de projetos de interesse do governo Lula. Em agosto de 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou a denúncia de Souza e abriu processo criminal contra todos os 40 acusados de envolvimento no mensalão. A ação incluiu três ex-ministros, um ex-presidente da Câmara, 13 deputados e ex-deputados, empresários, dirigentes de partidos e de bancos. Dois anos após o início das ações, o procurador diz não ter dúvidas de que o esquema de compra de apoio foi abastecido por uma soma considerável de dinheiro público e há indícios suficientes que comprovam a culpa dos indiciados.

Nascido em Fortaleza (CE), Souza tem fortes vínculos com o Paraná. Veio para Curitiba aos dois anos de idade, se formou em Direito na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e fez carreira no estado. Antonio Fernando de Souza dedicou a maior parte de sua vida ao Ministério Público, onde ingressou em março de 1975. "Meu pai era de Antonina, toda a minha vida, formação e relação de colegas é no Paraná. Me considero também um paranaense", afirmou. Aos 60 anos de idade e de férias, o procurador afirma que agora pretende descansar e a hipótese mais provável é de uma aposentadoria em breve. Ele deixou o cargo de procurador-geral da República no dia 28 de junho, sendo substituído por Roberto Gurgel.

O mensalão foi o caso que ganhou maior repercussão durante sua atuação como procurador-geral. Em que fase está o processo?

Inicialmente era um inquérito judicial do Supremo, houve oferecimento da denúncia, que foi recebida, e agora corre o processo penal. Já foram colhidos interrogatórios de todos os réus, todas as testemunhas de acusação já foram ouvidas e agora estão sendo inquiridas as testemunhas de defesa. Esse é o procedimento normal, é um número grande de pessoas. O ministro [responsável pelo caso no STF] também deferiu a complementação de uma nova prova pericial que vai ser realizada, mas é sigilosa. O próximo passo será marcar o dia para o julgamento, que será bem demorado.

Essa demora pode representar risco de os crimes prescreverem?

Não, a previsão é de demorar dois ou três anos. O ritmo do processo é muito ágil e os fatos são relativamente recentes. São mais de 400 testemunhas de acusação e um número razoável delas já teve o depoimento colhido. Mantido o ritmo processado, não há risco de prescrever.

O senhor acredita que alguém será condenado?

Seria um exercício de futurologia, mas o Supremo, ao receber a denúncia, reconheceu que haviam indícios suficientes de que as pessoas indicadas teriam praticado os fatos apontados. Agora, se essa prova que já existia, somada a essa nova que está se fazendo, confirmar a culpabilidade só poderemos verificar no julgamento. Para a grande parte dos fatos, há elementos suficientes para isso. Agora o julgamento é do Supremo.

Há indícios claros de compra de apoio no caso mensalão e uso de dinheiro público?

Os fatos foram descritos minuciosamente numa sessão longa da denúncia. Os elementos da própria denúncia já indicam a presença de parte respeitável de dinheiro público, senão não haveria nem o oferecimento da denúncia.

Durante as investigações, o senhor recebeu pressões dos envolvidos?

Não. Em toda a minha atuação como procurador-geral, não me senti e nem fiquei sujeito a pressão, exerci meu cargo plenamente.

E nesses quatro anos no cargo, que outros casos marcaram sua atuação?

Teve muitos procedimentos, assuntos não penais importantes e uma série de Adins que envolveram temas relevantes que passaram por aqui, embora o mensalão tenha chamado mais atenção.

Qual seria o melhor caminho para o país no combate à corrupção e escândalos envolvendo recursos públicos?

A sensação que tenho é que estamos vivendo um regime de regularidade democrática, que implica que todas as instituições funcionem. O Ministério Público está coibindo elementos de atuação indevida, como a corrupção de autoridades. O Judiciário tem processado, acompanhando as regras processuais. A expectativa é que essa atuação tenha função educativa, para que as pessoas fiquem sabendo que, se praticarem atos ilícitos, estarão sujeitas a condenação. Estamos evoluindo, mas ainda há muito o que fazer.

O que precisa ser feito?

Certos aperfeiçoamentos, como resolver de uma vez por todas como deve ser o poder de investigação do Ministério Público, não para assumir o papel da polícia, mas definir sua capacidade de proceder a investigação.

Há lacunas sobre o poder de investigação do órgão?

Isso está em aberto, porque o Supremo não julgou as Adins que estão pendentes e os habeas corpus que tratam sobre o tema. Acho que as atribuições estão definidas, mas há pontos de divergência, como se as investigações podem ser conduzidas desde o início pelo MP ou não. O Ministério Público tem exercido ações civis e públicas e nessa área cresceu muito. São inúmeros os termos de ajustes de conduta e decisões administrativas que acolhem recomendações do MP na proteção do meio ambiente, direito do consumidor e outras áreas.

Mas a investigação já não pode ser aberta pelo Ministério Público? O que mudaria nessa redefinição de atribuições?

Sim, a investigação já se faz e tem sido extremamente importante, mas a dúvida é se é válido ou não co­meçar a investigação. Não de­­fen­­demos que ninguém seja exclusivo na área de investigação, mas que o próprio MP, a polícia, a Re­cei­ta Federal, o Banco Central e todos os agentes públicos que tem função de verificar atos ilícitos possam fazer isso. É uma discussão sem sentido, mas que está colocada.

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