Lições para aprender com os vizinhos
As alterações feitas no texto que cria a Comissão da Verdade que examinará as violações de direitos humanos cometidas no Brasil entre 1946 e 1988 mostram que o autoritarismo ainda é muito forte no país e que a ditadura militar continua sendo um tabu. Em relação aos países vizinhos, o Brasil está muito atrasado na discussão sobre o assunto.
O lançamento do terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), em dezembro passado, além de ter sido cercado por polêmicas em relação a pontos específicos, revelou também o quanto é difícil para o Brasil garantir a qualidade de vida a seus cidadãos.
Grande parte das políticas de Estado ali listada já constava do documento anterior, o PNDH-2, lançado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em 2002. De lá para cá, muitos projetos nem saíram do papel. Resultado: os direitos humanos continuam a ser violados no país, muitas vezes pelo próprio Estado.
De acordo com o relatório de 2009 da organização internacional Human Rights Watch, um dos principais problemas nessa área são as condições desumanas das prisões brasileiras, além da superlotação e a violência disseminada nesses locais. Rebeliões como a ocorrida na quinta-feira na Penitenciária de Piraquara, na Grande Curitiba e que resultou na morte de cinco detentos , são fruto da grave situação em que se encontram os presídios.
De uma forma ou de outra, praticamente todos os brasileiros têm seus direitos humanos violados no país, diz o relatório da Human Rights Watch. As áreas metropolitanas, aponta o estudo, sofrem uma epidemia de violência, causada por gangues e pelo abuso das forças policiais. "A violência policial, incluindo as execuções extrajudiciais, é um problema crônico", informa o relatório. No campo, a coação também é recorrente. "Indígenas e sem-terra enfrentam ameaças e violência como resultado de disputas de terras."
Desigualdade
Segundo o pesquisador Alexandre Ciconello, o PNDH-2 foi concebido para influenciar o Plano Plurianual de 2004 a 2007, o que acabou não ocorrendo. Ele diz que o programa foi pouco utilizado como instrumento para definir políticas públicas. Com a edição do PNDH-3, ele espera que a situação se altere. "As desigualdades persistem, assim como a violência e a criminalização dos movimentos que tentam modificar essa realidade", diz ele, que é assessor de direitos humanos do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
A desigualdade racial no Brasil ainda é muito forte, aponta Ciconello. "Dois terços dos pobres são negros. Além disso, os trabalhadores negros recebem, em média, 50% dos salários dos brancos." Outro grupo discriminado no mercado de trabalho é o das mulheres. De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), o salário médio das mulheres equivale a 74,9% do rendimento dos homens.
Diretrizes
Tanto o segundo como o terceiro PNDH trazem diretrizes para combater todos esses problemas. Mas não há, por enquanto, garantias de que o novo programa realmente altere a realidade brasileira. "Mas temos de lembrar que os direitos humanos são ideais. Temos de almejar alto porque é muito difícil conseguirmos atingir tudo o que queremos", opina a cientista política Glenda Mezarobba. "O programa elenca políticas de Estado, e não quer dizer que tudo vai ocorrer da forma que está ali. Em uma democracia, é natural que determinados segmentos se posicionem contra. Com o debate construímos uma sociedade melhor."
"O programa é o que de melhor o país fez para a área até hoje", opina a professora Nair Bicalho, coordenadora do Núcleo de Estudos para a Paz e os Direitos Humanos da Universidade de Brasília (UnB). Segundo ela, o PNDH-3 traz todas as diretrizes dos dois primeiros programas, que versaram sobre os direitos civis e políticos e os direitos econômicos, culturais e sociais, além de inovar com os pontos sobre preservação do meio ambiente no contexto do desenvolvimento econômico.
Críticas
Ruralistas ainda esperam uma alteração no programa, que institui audiências públicas como pré-condição para os julgamentos de reintegração de posse. Eles temem um aumento nas invasões. Para entidades que representam os meios de comunicação, o PNDH-3 restringe a liberdade de expressão, por prever punições para aqueles que não seguirem as diretrizes oficiais em relação aos direitos humanos.
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