A jovem Isabela Caldeira parecia não se conter de entusiasmo ao deixar um dos auditórios da UniBrasil, em Curitiba, na última quinta-feira. Com apenas 16 anos, a eleitora de primeira viagem estava feliz por ter ouvido o discurso da ex-candidata à Presidência Luciana Genro (PSol), que, em seu primeiro retorno a Curitiba depois do pleito, participou de uma palestra sobre democracia e direitos humanos.
O evento debateu as formas de preconceito e xenofobia na política, que ganharam notoriedade, principalmente, com a "bipolarização" do Brasil no segundo turno das eleições. Em entrevista à Gazeta do Povo, Luciana que não descartou voltar à disputa eleitoral de 2018 e confirmou a vontade de "brigar" pela prefeitura de Porto Alegre daqui a dois anos falou ainda sobre questões como o avanço de pensamentos reacionários.
Na semana passada, houve manifestações de pessoas que foram às ruas para pedir não só o impeachment da presidente Dilma Rousseff como também intervenção militar. Como a senhora avalia isso?
É sempre preocupante que haja pessoas dispostas a esse tipo de manifestação. Mas eu vejo que isso é um setor muito minoritário da sociedade, que não tem uma representatividade real. Mas nós temos figuras com votos, como o deputado [Jair] Bolsonaro (PP-RJ), que defendem a ditadura militar. Isso é parte da falta de uma Justiça de transição no Brasil, que realmente puna, traga à luz quem foram os torturadores, o que eles fizeram e o que foi aquele regime político. Acho que isso acaba sendo uma reação a um processo de decepção política que muitas pessoas vivem em relação ao PT. E a própria força do PSDB nesta eleição foi uma demonstração disso, que pode acabar se transformando num movimento pela direita se não houver uma esquerda que possa se sobrepor. Atos de preconceito nestas eleições, principalmente contra os nordestinos, ganharam muita força. A senhora acha que isso é apenas parte de um discurso antipetista ou pode representar algo mais grave?
Acho que existe racismo no Brasil. O racismo se expressa contra os negros, os nordestinos e a comunidade LGBT. Até um tempo atrás, era natural fazer piadas contra negros, contra nordestinos. Mas isso agora está ganhando mais repúdio. Acho que o fato de nós termos a internet acaba dando mais visibilidade para esse tipo de posicionamento, que sempre existiu. E, ao mesmo tempo, a reação contra isso é cada vez maior. Acho que não há uma "direitização" da sociedade, um reacionarismo. Há sim um setor da sociedade que é discriminatório, que é racista, e isso precisa ser combatido. Reações como essa ressaltam um país dividido?
Claro que sim. Um país dividido em vários aspectos. Nós não somos um povo único. Somos divididos em reuniões e em classes sociais. E cada classe social tem o seu interesse. E, muitas vezes, pessoas que fazem parte de uma classe social acham que os seus interesses estão contemplados com os interesses de outra classe social, que é o caso dos trabalhadores. Há muitos trabalhadores que acham que garantindo os interesses da burguesia terão seus interesses garantidos, quando, na verdade, isso não é real. Mas isso é um processo de disputa política e de construção de uma consciência mais avançada no povo, que é uma luta constante que a gente pode fazer. Como mudar esse cenário?
Denunciando e repudiando esses tipos de manifestação. Ao mesmo tempo buscando legislações punitivas, como é o caso da homofobia, que precisamos criminalizar, e educando. Acho que o grande segredo está nas crianças e nos jovens. Os adultos, que já têm uma consciência deformada, são mais difíceis de mudar. Mas nós podemos criar as crianças e os jovens num ambiente mais democrático, de respeito à diversidade, à livre orientação sexual, à cor da pele, à origem de cada um.